
Para um presidente eleito pela parcela majoritariamente pobre da popula��o, sem a qual ningu�m se elege nem prefeito de vila, mas que nunca se dirigiu a tal eleitorado, j� foi um avan�o. Bolsonaro apoia uma pol�tica econ�mica que se diz liberal, mas que de fato � austera com os programas sociais, pr�diga com o seu eleitor de raiz nas For�as Armadas e nas pol�cias e m�ope com o potencial da �nica grande economia do mundo estagnada h� mais de 30 anos.
Seu ministro da Economia � ainda mais insens�vel quanto � pobreza que deprime de modo infame o potencial de nosso mercado de consumo.
N�o surpreende, por isso, sua preocupa��o com o lockdown, j� que n�o se v� como parte da equa��o. Se h� mais de 40 milh�es vivendo como informal, aut�nomo ou microempres�rio individual, � �bvio que a quarentena levar� a uma explos�o social, se n�o houver apoio federal.
Ele e sua equipe econ�mica demoraram a sacar que cabe ao governo prover todo o dinheiro que garanta a sobreviv�ncia dos carentes e a solv�ncia das empresas, seus empregados e dos governos regionais ao longo do per�odo de atividades suspensas de forma excepcional.
Nada � normal frente � amea�a de uma peste ainda sem cura, mas n�o a anormalidade que Bolsonaro cogita. Felizmente, o Congresso avocou a prote��o dos pobres, sobretudo a C�mara; o STF vem suspendendo a d�vida de estados com a Uni�o; e governadores e prefeitos, frente � omiss�o federal, assumiram a vanguarda das medidas sanit�rias.
Em torno destes limites institucionais e barreiras sanit�rias que Bolsonaro quer implodir � que se propaga o v�rus oriundo da China e disseminado pelo mundo, come�ando pela Europa, onde seu efeito tem sido devastador para as popula��es europeias bem cuidadas quanto � prote��o de pol�ticas de bem-estar e sa�de, al�m de muito bem alimentadas.
Se l� est� assim, por que o estrago seria menor aqui, se a mis�ria predomina e � invis�vel aos governantes e � minoria bem nutrida?
Fed rompe com ortodoxia
A infesta��o prospera agora nos EUA de Donald Trump, cuja postura inicial foi d�bia em rela��o � amea�a da pandemia, j� que concorre � reelei��o em novembro, influenciando a postura de Bolsonaro, que o admira. Trump acabou se curvando ao clamor popular, alarmado com a letalidade do v�rus, e n�o se inibiu em negociar com o Congresso um aumento de gastos de U$ 2 trilh�es, maior do que o produto interno bruto (PIB) do Brasil. Esta parte Bolsonaro n�o compreendeu.
At� o Fed anunciou fundos ilimitados �s empresas e bancos locais e para irrigar os fluxos de divisas de pa�ses como o Brasil. E mais: mandou �s favas a ortodoxia monet�ria, seguida ao p� da letra por boa parte dos economistas brasileiros. O dinheiro chegar� sem a media��o banc�ria �s empresas, por meio de sociedades de prop�sito espec�fico. Os empr�stimos ser�o por quatro meses prorrog�veis, se preciso, com um forte atrativo: sem juro se a empresa n�o demitir.
Mas como? – ofendem-se os puristas, para os quais os EUA s�o um pa�s rico e podem cometer excentricidades. Sorry, babies: tamb�m podemos.
Ou gasta ou corta imposto
Com atraso, o BC come�a a anunciar empr�stimos a pequenas e m�dias empresas para garantir a folha de sal�rios, cobrando 3,75% ao ano (taxa Selic) por dois meses, com seis de car�ncia e 36 para pagar.
Com negocia��o do presidente da C�mara, Rodrigo Maia, o Congresso aprovou uma bolsa de R$ 600 aos trabalhadores informais, que seria de irris�rios R$ 200 na proposta do governo, embora a renda m�dia dessa faixa seja da ordem de R$ 1,3 mil. Por que a m�o de vaca?
Porque todo o arcabou�o macroecon�mico foi constru�do depois de 2014 para segurar o gasto p�blico, mas sem reformar privil�gios e sinecuras, levando o Estado a inadimplir com a infraestrutura e a rede de prote��o social. � como a repress�o financeira em curso no pa�s, para desestimular o consumo como se houvesse hiperinfla��o, o que explica os juros no espa�o e os altos lucros dos bancos.
O fato, como diz Andr� Lara Resende, recebendo cr�ticas de economistas que agora em bloco reconhecem que ele tem raz�o, � que o Estado injeta dinheiro quando gasta e o retira cobrando imposto. Ent�o, n�o seria mais f�cil, em vez da burocracia para levar ajuda aos informais e �s empresas paradas pelo lockdown, suspender um ou mais impostos, como os encargos sobre a folha? “Cortar imposto � o mesmo que o governo gastar”, explica Andr�.
A civiliza��o corre risco
O problema que o pa�s enfrenta � de pouca “intelligentsia” e muita m� f�, causas centen�rias de nosso enorme atraso econ�mico e social – com uma causa levando � outra e ambas embargando o progresso. A quarentena � qual os governos em geral recorrem a contragosto � tamb�m sequela de pol�ticas pensadas do prato para a boca, como a sa�de dos pa�ses ricos: boa ou razo�vel, em tempos normais, p�ssima em eventos imprevis�veis cada vez mais comuns (terremoto, tsunami, furac�o, queimada, seca, inunda��o, epidemia etc.). Ela n�o � parte do tratamento, � um meio de tentar atrasar a propaga��o do v�rus e evitar o colapso da rede hospitalar, especialmente grave quando n�o h� vacinas nem medica��es comprovadamente eficazes. Que fazer?
Agir como se estiv�ssemos em guerra e planejar a sa�da organizada da quarentena, respeitando a �tica e o bom senso. Sugerir que idosos s�o trastes dispens�veis n�o honra ningu�m, apenas demonstra que a civiliza��o corre risco no pa�s. N�o se pragueja em programas de TV contra quem respeita a lei nem se incitam radicais a fazer agita��o na rua. � errado. � leviano. � mau.
