
O governo, o Congresso, o Judici�rio, � frente o STF, todos querem se mostrar aplicados em melhorar a economia, o bem-estar das pessoas, a qualidade das decis�es, mas n�o passa semana nos �ltimos anos sem que Bras�lia nos mergulhe em confus�es e pol�micas. Como diz um amigo, as institui��es est�o funcionando, s� que funcionam mal, encadeando instabilidade pol�tica, inseguran�a jur�dica e raquitismo econ�mico.
As �ltimas not�cias s�o de amargar. Uma confirma a m�xima segundo a qual at� o passado no Brasil � incerto. Deu-se com a reviravolta do voto do ministro Gilmar Mendes, do STF, sobre o imposto sindical, que caiu com a reforma trabalhista em 2017. Em 2018, o STF declarou como constitucional o fim do imposto obrigat�rio no curso de 20 a��es que tinham Gilmar como relator. Um sindicato recorreu com embargos de declara��o. Nesta a��o, o ministro Lu�s Roberto Barroso pediu vista e apresentou no �ltimo dia 14 seu voto concordando com a tese. E... E o ministro Gilmar o acompanhou, mudando sua decis�o de 2018.
Barroso diz em seu voto que o cen�rio mudou e a reforma trabalhista “promoveu uma importante altera��o na forma de custeio das atividades dos sindicatos”. O julgamento continua, amea�ando a jurisprud�ncia trabalhista consolidada. N�o cabe alegar inconstitucionalidade, at� onde se entende, porque o cen�rio mudou. Seria esquisito o STF formar maioria para engrossar a j� caudalosa inseguran�a jur�dica.
Noutro evento, este pol�tico, o governo se viu obrigado a aceitar a abertura de CPMI no Congresso proposta pela oposi��o para averiguar as responsabilidades pelo vandalismo da extrema-direita nas invas�es de pr�dios oficiais em 8 de janeiro. Com as provas abundantes feitas pelos pr�prios delinquentes com seus celulares, certo � que, se tiver compet�ncia, o governo poder� complicar a situa��o dos parlamentares que incentivaram os golpistas e de parte da oficialidade do Ex�rcito.
O �nus para todos � que a CPMI vai emba�ar a tramita��o de medidas essenciais para revigorar a economia e reduzir a depend�ncia dos mais pobres das pol�ticas sociais, como a j� tardia reforma tribut�ria. O que fazer: esperar passivamente ou oferecer ao Congresso e ao governo ajuda para desatar os n�s? Um grupo de l�deres empresariais de v�rios setores entende que o caminho � ajudar a pol�tica, numa din�mica com potencial para superar a polariza��o ideol�gica e ideias de antanho.
Resist�ncia � inova��o
Para alguns, falta compreens�o sobre as transforma��es que acontecem em ritmo intenso no mundo, e que se arrastam no Brasil como carro com motor 1.0 subindo uma ladeira �ngreme – ou h�brido, que � a forma de ganhar tempo de ind�stria sem bala ou sem know-how para abra�ar o que suas matrizes j� adotaram, a propuls�o com bateria el�trica. De algum jeito, nossa hist�ria � marcada por uma tenaz resist�ncia � inova��o.
Acumulamos d�cadas de pol�tica macroecon�mica destinada a p�r canga nas contas fiscais, visando a uma infla��o moderada e a uma taxa de juro decente, que entronizariam expectativas promissoras, confian�a e progresso.
O resultado tem sido o contr�rio, levando n�o � revis�o do m�todo, mas aos governantes a dobrar a aposta, pauperizando o setor privado, sobretudo a manufatura. At� os anos 1970, ela era mais sofisticada e maior que a da China. E assim seguimos, encolhendo, pois as pessoas passam e as ideias ficam, perseguindo ajustes ficais por press�o de ideologia em desuso no mundo para cercear a autonomia da pol�tica.
Nesse embate entre a tecnocracia que se v� infal�vel e a democracia eleitoral, em que o voto demite o pol�tico e o fracasso n�o sanciona o tecnocrata com emprego est�vel, al�m da porta girat�ria aberta � elite deles, o espancado � a sociedade, seja por tomar partido desconhecendo o que est� por tr�s, seja por ser prejudicada na veia.
Vamos aos fatos. Na lista dos BRICS, Brasil tem economia estagnada desde 2000, quando representava 1,9% do PIB global, contra 3,5% da China, 1,4% da �ndia, 0,8% da R�ssia e 0,4% da �frica do Sul, segundo dados do World Economic Outlook de abril do FMI. Em 2023, voltamos ao ponto em que partimos, com 1,97% do PIB mundial, a China voou para 18,4%, �ndia foi a 3,5%, R�ssia a 2% (gra�as ao petr�leo e g�s) e a �frica do Sul continuou com os mesmos 0,4%. O que inferir?
Mais emprego que Bolsa?
A dedu��o � que o acr�nimo BRICS deve sua fama de grupo din�mico no mundo s� � China, com �ndia atr�s. Ambos explicam a fatia do PIB do bloco em rela��o ao PIB mundial ter saltado de 11% em 2006, quando a ideia do clube de emergentes promissores foi criada, para 26,3%.
Hoje, forte candidata a pot�ncia econ�mica � a Indon�sia, democracia que fracassou duas vezes com pol�tica industrial e voltou a adot�-la, fazendo uso de tecnologia da informa��o e de suas reservas de n�quel, insumo estrat�gico �s novas energias, barganhando facilidades tarif�rias por f�bricas de baterias e ve�culos el�tricos. Ind�strias da China, EUA, Coreia do Sul e Jap�o toparam ou est�o negociando.
Em 2010, �ltimo ano do Lula 2, nosso Produto Interno Bruto representava 3,3% do PIB do mundo. Se os erros de estrat�gia do governo Dilma fossem corrigidos e n�o repudiados, � poss�vel que este ano volt�ssemos � fra��o perdida. O gap � de US$ 1,4 trilh�o. Convertidos em obras, tecnologia aplicada e manufatura moderna, e adicionados � competitividade dos min�rios e do agro, � prov�vel que hoje o Bolsa Fam�lia fosse menos demandado. E a vigil�ncia fiscal seria limitada ao bom uso do dinheiro p�blico.
Sem escolhas bin�rias
Fundamental para a economia superar os impasses pol�ticos e Lula ter sua reden��o � se livrar da escolha bin�ria entre o laissez-faire e o planejamento, como defende a singapuriana radicada nos EUA Yuen Yuen Ang, chefa do departamento de Economia Pol�tica da Universidade Johns Hopkins e autora de “Como a China escapou da armadilha da Pobreza”.
Ela sugere aos EUA o que come�ou timidamente com Trump e segue mais desinibido com Joe Biden: um “jogo de soma positiva” entre os setores p�blico e privado, com o que chama de “descentraliza��o coordenada” e “improvisa��o dirigida”. A China se transformou com tais conceitos, e n�o bem com dire��o central f�rrea, como sup�e a cr�tica neoliberal.
O fato � que ou enfrentamos a realidade de que estamos tempo demais insistindo com pol�ticas de estabiliza��o econ�mica indiferentes �s suas sequelas para o emprego e a manufatura avan�ada ou as crises v�o ampliar-se em frequ�ncia e intensidade, j� que n�o ser� s� o agro que vai criar empregos e renda capazes de atender as demandas sociais.
Falta ao pa�s um projeto de longo prazo sintonizado com as mudan�as globais sem volta, como as energias renov�veis, os ve�culos el�tricos puros, processos, produtos e servi�os conectados por semicondutores e operados por softwares inteligentes. Mas n�o faltam gente preparada e iniciativas embrion�rias, como o sistema de pagamentos instant�neos do Banco Central, o Pix, que � mais que uma facilidade financeira. �, se devidamente considerado, a plataforma para a economia conectada e inteligente, estendida aos bancos de dados interativos de CPF e CNPJ, o que viabiliza at� um sistema tribut�rio sem margem para sonega��o.
A formula��o da economia digital � o que nos concilia com o futuro no presente e nos d� o ingresso na geopol�tica em geral para al�m da justa prioridade ambiental. Sem uma PPP da pol�tica com a sociedade, visando parcerias de criatividade e inova��o, isso n�o vai acontecer.