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Estado de Minas NOME SOCIAL

'Me chame pelo meu nome, respeite meus pronomes'

Respeitar nosso nome � respeitar nossa exist�ncia. A pessoa travesti ou transexual tem o direito de indicar por qual nome � socialmente reconhecida


20/08/2021 06:00 - atualizado 19/08/2021 13:54

Arthur Bugre iniciou o processo para o nome social em 2020, quando teve início a pandemia de COVID-19(foto: Arquivo pessoal)
Arthur Bugre iniciou o processo para o nome social em 2020, quando teve in�cio a pandemia de COVID-19 (foto: Arquivo pessoal)

 
Como voc� se chama? Em algum momento da sua vida seu nome j� foi desrespeitado, negado? No final de 2019, fiz a primeira movimenta��o para utilizar o meu nome social nos documentos funcionais e registros internos e externos nos meus empregos. Os l�deres mais pr�ximos e colegas de trabalho me apoiaram na mesma hora.
 
Foi muito bom receber esse apoio verbal e com atitudes! Mas um dos integrantes da alta lideran�a barrou, alegando que era desnecess�ria a retifica��o. Mas por motivos pessoais, naquele per�odo, n�o foi poss�vel dar in�cio ao passo a passo da retifica��o no cart�rio. Quando eu pude come�ar a mudan�a, a pandemia de COVID-19 foi anunciada pela Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) e os cart�rios interromperam muitas atividades. 
 

'O decreto n� 8.727, de 28 de abril de 2016, garante o direito ao uso do nome social e reconhecimento da identidade de g�nero de pessoas travestis e transexuais no �mbito da administra��o p�blica federal direta, aut�rquica e fundacional. Ou seja, a pessoa travesti ou transexual tem o direito de indicar por qual nome � socialmente reconhecida. E isso n�o foi respeitado por essa alta lideran�a.'

 
Continuei com a minha luta e busquei a orienta��o de um Defensor P�blico. Afinal, era meu nome que estava sendo desrespeitado. Apenas em julho de 2020 que a empresa em que eu trabalho me liberou. E toda essa espera foi muito desgastante, ainda mais porque sabia que n�o estava pedindo um favor.

O decreto nº 8.727, de 28 de abril de 2016, garante o direito ao uso do nome social e reconhecimento da identidade de g�nero de pessoas travestis e transexuais no �mbito da administra��o p�blica federal direta, aut�rquica e fundacional. Ou seja, a pessoa travesti ou transexual tem o direito de indicar por qual nome � socialmente reconhecida. E isso n�o foi respeitado por essa alta lideran�a. 
 
Muitas pessoas trans passam por isso e n�o s� no ambiente de trabalho. Quando seus nomes s�o anunciados no consult�rio m�dico, durante a chamada nas escolas e universidades, esse constrangimento se repete. Mas, de uma maneira geral, � bom apontar alguns avan�os nesse quesito no Brasil.
 

'Mas a experi�ncia que relatei demonstra que, mesmo diante de decretos e da decis�o do STF, muitas vezes nossos nomes s�o desrespeitados sem cerim�nia.'

 
 
Antes mesmo da decis�o do Supremo Tribual Federal em 2018, que permitiu que transexuais e transg�neros possam alterar seu nome no registro civil sem a necessidade de realiza��o de cirurgia de redesigna��o de sexo, o nome social passou a ser adotado e respeitado por algumas entidades em documentos, correspond�ncias, acessos e crach�s. Foi o caso da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), dos Conselhos Federal e Regionais de Psicologia, de algumas universidades e �rg�os p�blicos, al�m da Administra��o P�blica Federal. 
 
Mas a experi�ncia que relatei demonstra que, mesmo diante de decretos e da decis�o do STF, muitas vezes nossos nomes s�o desrespeitados sem cerim�nia. 
 
E muitas pessoas n�o percebem a gravidade disso. Segundo o Artigo 16 do C�digo Civil, toda pessoa tem direito ao nome. Mas, quando se trata de pessoas trans, isso vale mesmo? N�o � poss�vel mensurar as dores e gatilhos que surgem do desrespeito e pouco caso o nome social. Quando isso acontece, al�m das dores internas que a falta de identifica��o com o nome  j� gera na pessoa trans, ela ainda precisa brigar para institui��es privadas e p�blicas  respeitarem seus nomes. 
 
E, infelizmente, a nega��o desse direito b�sico tamb�m est� no nosso dia a dia. Mesmo com meu nome j� retificado no cart�rio, ainda � muito frequente parentes, colegas de trabalho, vizinhos e conhecidos insistirem em me chamar pelo nome falecido ou pronomes que n�o s�o os meus, mesmo explicando de diferentes formas que isso n�o � correto. 
 
Talvez voc� pode pensar: “Mas voc� precisa ter paci�ncia, as pessoas v�o demorar mesmo para se adaptar". Ent�o, vamos l�: At� entendo que aqueles que j� convivem comigo h� d�cadas tenham mais  dificuldade. Mas isso n�o pode ser justificativa para n�o mudar.
 

'S� para voc� ter ideia, at� pessoas que j� me conheceram como Arthur Bugre, ainda insistem em desrespeitar meus pronomes. Sou um homem trans e nunca me identifiquei com o nome antigo. Como posso passar toda minha vida sendo chamado por algo que s� me causava dor, ang�stia e total falta de identifica��o? Agora me diz: existe justificativa para isso continuar, mesmo sabendo que isso prejudica nossa sa�de mental? Quando o nome social de uma pessoa trans � negado ou desrespeitado, tamb�m � uma forma de desumaniza��o.'

 
 
Em alguns momentos j� escutei frases como “Te conheci assim, ent�o  vou continuar te chamando assim, j� decidi, n�o vou mudar”. Grande erro! Essa decis�o n�o � sua!  J� ouviu falar em direitos da personalidade? De forma resumida, s�o aqueles direitos que preservam a individualidade de cada pessoa e s�o classificados pela doutrina em tr�s grupos: direito � integridade f�sica, � integridade ps�quica e � integridade moral. Ter um nome e esses pronomes respeitados fazem parte desses direitos da personalidade. 
 
S� para voc� ter ideia, at� pessoas que j� me conheceram como Arthur Bugre, ainda insistem em desrespeitar meus pronomes. Sou um homem trans e nunca me identifiquei com o nome antigo. Como posso passar toda minha vida sendo chamado por algo que s� me causava dor, ang�stia e total falta de identifica��o? Agora me diz: existe justificativa para isso continuar, mesmo sabendo que isso prejudica nossa sa�de mental? Quando o nome social de uma pessoa trans � negado ou desrespeitado, tamb�m � uma forma de desumaniza��o. 
 
Deixo aqui algumas dicas de como respeitar o nome social e pronomes de pessoas trans no dia a dia: Se voc� ainda n�o sabe como uma pessoa deseja ser chamada, fa�a as seguintes perguntas de forma gentil e direta: “Qual � o seu nome/como deseja que te chame? E quais s�o seus pronomes?”. 
 
Se durante uma conversa voc� errar, n�o precisa pedir um milh�o de desculpas. Apenas se desculpe uma vez. Em seguida, fa�a a corre��o para o nome ou pronome correto e preste mais aten��o para n�o errar de novo e siga a conversa. N�o fique justificando porque voc� errou, isso s� aumenta nosso constrangimento.
 
Falando em justificativas, j� escutei muito a seguinte frase: “tenha paci�ncia, eu errei, mas estou no processo de desconstru��o, isso n�o � f�cil para mim”. Certo, concordo que deixar preconceitos, mudar de atitude e comportamento n�o s�o tarefas f�ceis, mas s�o necess�rias! Imagine s�, se pra voc� � dif�cil fazer o exerc�cio da empatia e se esfor�ar para n�o errar mais, imagina para n�s, minorias que enfrentamos diferentes barb�ries diariamente. Nem mesmo um direito t�o b�sico de ter nome e os pronomes s�o respeitados e ainda precisamos escutar ano ap�s ano que voc� est� "se desconstruindo ainda”? Quando voc� vai demonstrar mais empatia na pr�tica? S� em 2090? 

Essa dica � muito, muito importante: “Arthur, qual era seu nome antigo?”.
N�O FA�A ESSA PERGUNTA! Como j� falei, para muitas pessoas trans o nome falecido j� gerou muito desconforto, dor, constrangimento e traumas. N�o vou ressuscitar algo que j� gerou tanto peso na minha vida para satisfazer sua curiosidade. 
 
Meu nome � Arthur Bugre. Meus pronomes s�o Ele, Dele. Me chame pelo meu nome, respeite meus pronomes. 

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