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Estado de Minas EM TODAS AS �REAS

Veja alian�a entre neoliberalismo e conservadorismo no governo Bolsonaro

Ataques aos direitos das mulheres v�m de diversos minist�rios, da presid�ncia e do Congresso


19/08/2021 06:00 - atualizado 19/08/2021 09:16

(foto: AzMina/Reprodução)
(foto: AzMina/Reprodu��o)

“Vamos unir o povo, valorizar a fam�lia, respeitar as religi�es e nossa tradi��o judaico-crist� . Combater a ideologia de g�nero , conservando nossos valores”, foi uma das primeiras falas do presidente Jair Bolsonaro, ao assumir a presid�ncia, em seu discurso de posse.
 
Dois anos e meio depois, as pr�ticas adotadas pelo governo, em todas suas esferas, mostram que ele falava s�rio sobre a valoriza��o da fam�lia e o conservadorismo de valores : foram ao menos 19 a��es do executivo , entre portarias, cartilhas, leis, decretos e outros; 63 propostas do Congresso que partiram da sua base de apoio; e milh�es de reais n�o usados no or�amento que caminharam neste sentido – o de valorizar e tamb�m responsabilizar a fam�lia por direitos b�sicos que s�o obriga��o do Estado. 

A Revista AzMina levantou toda a a��o do governo relacionada a temas de valoriza��o da fam�lia, g�nero, direitos sexuais e reprodutivos, temas LGBTQIA%2b e educa��o domiciliar. Foram analisados decretos, portarias, medidas provis�rias, cartilhas e campanhas governamentais, direcionamento or�ament�rio, execu��o or�ament�ria e propostas legislativas.
 
As pautas aparecem em a��es da Presid�ncia, do Minist�rio da Mulher, Fam�lia e Direitos Humanos, do Minist�rio da Sa�de, Minist�rio da Educa��o, Minist�rio de Rela��es Exteriores e do Congresso.  
 
Enquanto no executivo predominam as pautas de prote��o � vida desde a concep��o e valoriza��o da fam�lia, com cinco a��es cada; no legislativo os temas mais abordados s�o em rela��o a criminaliza��o total do aborto (29 projetos de Lei) e redu��o de direitos LGBTQIA (12). 

As a��es deixam claro que a valoriza��o da fam�lia e o ataque aos direitos das mulheres s�o elementos centrais do fazer pol�tico desse governo, e o perfil das a��es indicam uma conex�o direta com a pol�tica econ�mica neoliberal, que prega a menor participa��o poss�vel do Estado na economia. “Esta pauta conservadora � fundamental para que as mulheres fa�am um trabalho gratuito que � estruturante para a economia capitalista”, explica a cientista pol�tica Clarisse Goulart Paradis, professora do Instituto de Humanidades e Letras da Universidade da Integra��o Internacional da Lusofonia Afro-brasileira (UNILAB/Bahia).

N�o � toa, a antiga Secretaria de Pol�ticas para Mulhere s perdeu seu status ministerial e foi criado o Minist�rio da Mulher, Fam�lia e Direitos Humanos, vinculando diretamente os temas relacionados aos direitos da mulher � fam�lia. Nos programas or�ament�rios, deixou de existir o Programa 2016, chamado “ Pol�ticas para as Mulheres: Promo��o da Igualdade e Enfrentamento a Viol�ncia ” e em seu lugar veio o “ Programa 5034 – Prote��o � vida, fortalecimento da fam�lia, promo��o e defesa dos direitos humanos para todos ”.
 
Al�m disso, o governo deixou de usar um ter�o do or�amento autorizado para pol�ticas voltadas para mulheres, tanto na �rea de combate � viol�ncia, quanto em pol�ticas de sa�de. Ao mesmo tempo em que no Congresso todo um vocabul�rio conservador tem se tornado frequente em tentativas de reduzir os direitos das mulheres.
 

O QUE � O NEOCONSERVADORISMO E O QUE ELE TEM A VER COM O LIBERALISMO ECON�MICO

O levantamento mostra que o governo est� colocando em a��o aquilo que j� deixava claro no seu discurso, em uma forma de governar que tem sido definida por especialistas de diversas formas, e um dos termos usados � o neoconservadorismo – uma alian�a entre o conservadorismo e o neoliberalismo.
 
Na pr�tica, a ideia � refor�ar o lugar da fam�lia (e principalmente da mulher) como entidade respons�vel por obriga��es que antes seriam de responsabilidade do governo, como o cuidado das crian�as e idosos. Quer um exemplo? Se antes o governo era o respons�vel por garantir a educa��o das crian�as, com servi�os de creche e escolas, agora o objetivo � liberar a educa��o domiciliar, assim isso passa a ser responsabilidade da fam�lia e um gasto e preocupa��o a menos para ele. 

No livro  “ G�nero, neoconservadorismo e democracia: disputas e retrocessos na Am�rica Latina ”,  Fl�via Biroli, Maria das Dores Campos e Juan Marco Vaggione explicam que o termo � “utilizado para lan�ar luz sobre os tipos de coaliz�es pol�ticas estabelecidas entre diferentes atores – religiosos e n�o religiosos – visando manter a ordem patriarcal e o sistema capitalista”. 

Eles partem de uma l�gica de que a liberdade sexual e a emancipa��o da mulher teriam levado a um cen�rio de irresponsabilidade masculina  e vulnerabilidade feminina, levando ao discurso da defesa da fam�lia. N�o � toa o governo vem falando tanto de “paternidade respons�vel”: a ideia � voltar a enxergar o homem como chefe e provedor de fam�lia, respons�vel pelas decis�es da casa, inclusive a de ter ou n�o filhos. 
 
“Pensar a pauta conservadora separada das quest�es materiais � um erro. N�s n�o podemos pensar uma pauta s� dos costumes se tivesse desatrelada das disputas materiais. Classe, ra�a e g�nero cortam nossas condi��es de vida”, defende Clarisse Goulart Paradis. � neste cen�rio que se torna importante analisar as pautas morais no atual governo sob a luz de sua pol�tica econ�mica. 

Clarisse explica que nesse contexto neoconservador, as pessoas s�o muito mais respons�veis pelos riscos e pela reprodu��o da vida, ou seja, pelos trabalhos invis�veis e n�o remunerados de gerar e criar novas pessoas. “� essencial para o governo colar a mulher � fam�lia, � maternidade, para aproveitar do trabalho gratuito que � fundamental e chamado de amor”. 

Como dissemos, um exemplo pr�tico disso no atual governo � como a l�gica de privatiza��o e aus�ncia do Estado reflete na quest�o da educa��o das crian�as. Enquanto o Congresso tenta passar a legisla��o para a educa��o domiciliar, o Minist�rio da Educa��o n�o usou nada dos recursos dispon�veis para estruturar as escolas para a volta da educa��o presencial, conforme revelou o jornal O Globo, mas publicou uma cartilha para orientar a educa��o domiciliar.
 
Para o governo, � essencial que as fam�lias – e majoritariamente as mulheres – passem a se responsabilizar por essa atividade. Em textos de projetos de lei, parlamentares defendem que “a educa��o dada pelos pais � um direito natural garantido aos genitores”, e que a “Lei Natural” antecede os direitos humanos. Em outra a��o, ao divulgar o programa Aux�lio Brasil, o governo passa a incluir um aux�lio-creche – que pode ser pago a institui��es particulares – ao mesmo tempo em que retira recursos destinados �s prefeituras para educa��o das crian�as, como mostrou a Folha de S. Paulo. 

ENTRE O DISCURSO E A��O: G�NERO E FAM�LIA  

Na an�lise das a��es do governo tamb�m � percept�vel que h� muito discurso para embasar a constru��o da pr�tica. N�o se trata apenas das falas dos representantes do Estado, mas tamb�m de medidas como a mudan�a de pastas e programas or�ament�rios, e a inclus�o ou retirada de termos em projetos de lei.
 
H� ainda a Estrat�gia Federal de Desenvolvimento para o Brasil no per�odo de 2020 a 2031, que diz que o governo vai “promover o direito � vida, desde a concep��o at� a morte natural, observando os direitos do nascituro, por meio de pol�ticas de paternidade respons�vel, planejamento familiar e aten��o �s gestantes”. Al�m das rec�m-anunciadas cria��es dos dias do nascituro e da paternidade respons�vel. 

No Congresso, s�o muitos os projetos de lei que tratam de vedar o reconhecimento de identidade de g�nero de pessoas trans ou de proibir o uso de termos como g�nero ou orienta��o sexual em escolas. 

Ao mesmo tempo em que se refor�a a ideia de fam�lia como n�cleo central da sociedade, h� um trabalho de terror sobre os riscos, principalmente para crian�as, em rela��o � pedofilia e �s quest�es de g�nero, numa narrativa de crise centralizada na fam�lia – a crian�a em casa, com a fam�lia, tem menos chance de ser exposta a esses “riscos”. 
 
“Esse discurso da ideologia de g�nero se torna uma pauta fundamental justamente para deixar mais palat�vel para a sociedade as pautas neoliberais t�o impopulares, que no fundo s�o retiradas de direitos. Se pegar a agenda nua e crua do neoliberalismo, quem vai apoiar isso?”, explica Clarisse.

Tamb�m � not�vel uma mudan�a de foco das quest�es da mulher para a fam�lia. Assim como no or�amento as pol�ticas para mulheres viraram Prote��o � vida, fortalecimento da fam�lia, promo��o e defesa dos direitos humanos para todos, no combate � viol�ncia dom�stica o foco saiu do fator de g�nero da viol�ncia e foi para a quest�o familiar, como pode ser visto nesta campanha do Minist�rio. A v�tima da viol�ncia n�o � mais a mulher, mas a fam�lia, a crian�a, o idoso, e a agress�o, portanto, deixa de ter como motivador o machismo estrutural.  
 

ABORTO PARA TODOS OS LADOS 

O tema do aborto e sa�de sexual e reprodutiva est� diretamente atrelado �s pautas neoconservadoras e por isso aparece em a��es do Congresso, do Minist�rio da Sa�de, do Minist�rio da Mulher, Fam�lia e Direitos Humanos, do Minist�rio das Rela��es Exteriores e da Presid�ncia. Em todos os casos, o foco � restringir o direito � interrup��o da gesta��o at� nos casos em que ela � permitida no Brasil (estupro, risco � vida da mulher ou anencefalia do feto). 

O Congresso lidera o volume, com 29 PLs sobre o assunto, mas sem conseguir a aprova��o de nenhum. E vem seguido do Minist�rio da Sa�de, que publicou duas portarias em 2020 dificultando o acesso ao aborto legal, divulgou uma nota contr�ria � realiza��o do aborto legal por telemedicina e revogou resolu��o do Conselho Nacional de Sa�de que garantia o direito ao aborto legal. 

Do presidente, v�m a tentativa de cria��o do Dia Nacional do Nascituro e tamb�m a estrat�gia federal, que defende o direito � vida desde a concep��o. Por fim, o Minist�rio da Mulher, Fam�lia e Direitos Humanos, junto ao Minist�rio das Rela��es Exteriores, assinou a Declara��o de Consenso de Genebra, um acordo internacional de posicionamento contra o aborto. 

Apesar dos retrocessos concretos e riscos, � importante ter em mente tamb�m os avan�os. No livro  “G�nero, neoconservadorismo e democracia: disputas e retrocessos na Am�rica Latina”,  Fl�via Biroli, Maria das Dores Campos e Juan Marco Vaggione explicam que o conservadorismo � uma resposta a mudan�as provocadas por grupos considerados minorit�rios – uma tentativo de conservar os modos anteriores. 

E para Clarisse Goulart Paradi s, n�o podemos esquecer como o movimento de mulheres tem se mantido como uma das principais resist�ncias aos retrocessos: “N�o quer dizer que o imagin�rio feminista esteja acuado, muito pelo contr�rio. As mulheres t�m sido fundamentais pra que esse governo tenha rejei��o. O feminismo est� num momento de muito engajamento e luta pol�tica. E quando esse governo sair, vamos estar preparadas para pensar pol�ticas que sejam mais avan�adas do que o que j� tivemos”. 
 
Veja a lista aqui das a��es do executivo identificadas pela reportagem 
 

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