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Estado de Minas CONECTADAS

Inspiradas por Angela Davis e Anitta: as meninas da GEN Z e o feminismo

Jovens dos anos 2000 aprendem sobre direitos na internet e com a cultura pop, e se engajam desde cedo


10/03/2022 09:12 - atualizado 10/03/2022 20:21

Ilustração com imagem de várias mulheres
(foto: AzMina)
 
Elas est�o cada vez mais conectadas, por dentro das �ltimas ‘trends’ e com a core� em dia. Prontas para postar aquela dan�a ou dublar o novo v�deo do momento, mas tamb�m para criticar e expor qualquer machismo que virem! As meninas da gera��o Z nasceram no meio virtual e t�m a informa��o na palma das m�os. O futuro do feminismo depende dessas xovens, que, ainda bem, est�o cada vez mais engajadas e atualizadas. Mas, afinal, o que elas pensam sobre esse movimento t�o antigo?

Para construir esta reportagem, a equipe d’AzMina elaborou um question�rio, com perguntas sobre feminismo, e recebeu mais de 280 respostas de jovens nascidas entre 2002 (20 anos) e 2010 (12 anos) – per�odo que contempla a chamada “gera��o Z”. E tamb�m fomos conversar diretamente com algumas delas.

Um pouco de funk, um pouco de pol�tica


“Voc�s pensaram que eu n�o ia rebolar minha bunda hoje?”. Para a gera��o Z: a ic�nica frase da cantora Anitta � um reflexo da liberdade que as mulheres devem ter sobre seus corpos. “Ela faz com que outras mulheres se sintam fortes, poderosas, resistentes e aut�nticas”, destaca Kathleen Domingos, 17 anos, moradora de Leme, em S�o Paulo.

Mas o que cantora Anitta e a fil�sofa e ativista americana Angela Davis teriam em comum? Ambas s�o refer�ncias feministas da gera��o Z. Sim! Enquanto as mais novas enxergam na cantora pop um exemplo de supera��o e independ�ncia feminina, as jovens acima de 15 anos v�em na fil�sofa um exemplo de luta no movimento. “Ela me inspira por suas ideias libertadoras e tamb�m por ser uma mulher socialista”, revela Kailane Duarte, 18 anos, do munic�pio de Araci, na Bahia.

Feminismo e direitos humanos sem intermedi�rios 

Foram as obras de Angela Davis que levaram Tarsila Rodrigues, 18 anos, moradora de Recife, em Pernambuco, ao feminismo interseccional. “O primeiro livro que eu li foi “Mulheres, ra�a e classe”, e isso me trouxe muito entendimento sobre o movimento em si, principalmente, o feminismo negro.” Sabida ela n�?!

Quando esteve no Brasil, em 2019, Angela Davis exaltou a vereadora carioca assassinada, Marielle Franco. O nome da parlamentar tamb�m � muito citado pela Gen Z quando o assunto � refer�ncia no feminismo. “Acho super importante o fato de ela ter sido feminista, preta, m�e solo e fazer parte da comunidade LGBTQIA+”, escreveu uma das jovens que responderam ao question�rio d’AzMina. 

Al�m da vereadora, nomes como os da ex-deputada federal Manuela D’�vila, da ex-presidente Dilma Rousseff e da ativista paquistanesa Malala Yousafzai despontam entre as jovens. Se quiser ver as respostas de outras idades, � s� mudar a sele��o que fez l� no come�o! 

A cultura pop tamb�m se mostra muito forte e presente na vida dessas meninas, para al�m de Anitta. A atriz Emma Watson e as cantoras IZA, Ariana Grande, Taylor Swift e Beyonc� s�o frequentemente lembradas como inspira��o para o movimento feminista. “Libert�, �galit�, beyonc�!”

Diversidade � regra

H� que se ressaltar inclusive a maior liberdade para falar de orienta��o sexual e identidade de g�nero entre essa turma: nas respostas ao question�rio, 35% disseram ser bissexual e 5,7%, pansexual. Quase 80% indicaram a liberdade sexual como uma pauta importante no movimento. A n�o-binaridade, em rela��o � identidade de g�nero, tamb�m foi marcada por 4% das pessoas que responderam ao question�rio. Bem-vindes � era dos pronomes neutros, galera %uD83D%uDE09 E, n�o � toa, 95% acredita que a sexualidade da mulher ainda � um tabu. Bora se atualizar sociedade?

Uma jovem de 18 anos, que n�o tem identidade de g�nero definida e respondeu ser assexual na pergunta sobre orienta��o na pesquisa, escreveu assim: “Sou contra o feminismo radical que exclui pessoas trans de seus discursos. Acredito ser uma feminista de vi�s mais marxista, aliada ao feminismo negro e muito ligada ao movimento LGBTQIA ”. 

A mulherada jovem – ou boa parte dela – j� se ligou que n�o d� pra falar s� da experi�ncia da mulher branca.  “A gera��o mais jovem conta com esse ac�mulo j� de sa�da, de n�o fazer a discuss�o centrada num sujeito ‘mulheres’ que corresponde � uma faixa muito restrita das mulheres e que n�o se toca que as mulheres m�ltiplas por a� t�m necessidades distintas”, aponta Isabela Venturoza, doutoranda em antropologia social pela Universidade Estadual de Campinas.

Influenciadas pelas redes

Mas n�o s�o apenas atrizes, cantoras e figuras pol�ticas que fazem a cabe�a da gera��o Z. Olha que lindo: muitas disseram ter dentro de casa a principal refer�ncia feminista – irm�s, tias e m�es. Mas devemos dizer que, para outras, infelizmente, o lar ainda � um ambiente considerado opressor.

“Minha inf�ncia inteira foi cercada por machismo, me frustrava n�o poder fazer certas coisas por ser menina, e, por isso, j� desejei muito ter nascido menino”, desabafou Ana Carolina Coimbra, 17 anos, moradora de Macap�, no Amap�, que teve contato com o movimento feminista pelas redes sociais aos 11 anos.

Amigas, professoras, redes sociais e a literatura s�o os meios encontrados por elas para compreender o movimento feminista. As redes virtuais e de amizades tamb�m s�o onde elas dizem exercer o feminismo. O livro e filme Moxie, que traz a discuss�o do movimento para as novas gera��es, foi uma refer�ncia que aparece constantemente nas respostas ao question�rio d’AzMina. 

Se Angela Davis � uma voz feminista, o seu livro “Mulheres, ra�a e classe” est� entre os mais citados pelas meninas. A obra “Mulheres que correm com os lobos” tamb�m aparece entre as queridinhas da Gen Z feminina. “Ele me trouxe a reflex�o que todes podem despertar em si o feminino, evidenciando que ele vai al�m de uma quest�o de g�nero, como uma ess�ncia que se manifesta na natureza humana e animal”, explicou Mait� Massarioli, 18 anos, de Araraquara, S�o Paulo.

Ainda na literatura, “O feminismo � para todo mundo”, da te�rica feminista e ativista negra norte-americana bell hooks, tamb�m aparece no TOP 10 delas. J� no universo musical, a playlist dessa juventude tem de “No ch�o novinha”, de Anitta, a “Triste, Louca ou M�”, da banda Francisco, El Hombre.

Algumas coisas n�o mudam

Se a tecnologia e as refer�ncias delas podem ser completamente diferente das feministas que vieram antes, tem coisa que continua igual: a gera��o Z tamb�m teve que enfrentar, por muitas vezes, o machismo antes de se entender como feminista. Mariana Marques, 15 anos, de Campinas, S�o Paulo, recorda que sofreu ass�dio no col�gio, aos 14 anos, e teve que lidar com a falta de acolhimento por parte da diretoria. “Eu contei para o diretor, que fez o m�nimo, revertendo a situa��o e desacreditando o meu discurso.” 

Maria Clara, 15 anos, moradora de Americana, em S�o Paulo, tamb�m vivenciou o machismo por meio do ass�dio. “Fui � praia e, na volta, eu estava de vestido e passou um velho, que come�ou a falar coisas. Eu me senti super mal, inclusive acho que n�o comentei isso com ningu�m, mas me marcou”, revelou a jovem, que devia ter entre 10 e 12 anos � �poca.

Defni Dallagnol, 20 anos, de Nova Prata, Rio Grande do Sul, sabe bem o reflexo desses comportamentos. Ela lembra que seu corpo se desenvolveu muito cedo, “com 10 ou 11 anos, os caras j� buzinavam, faziam piadinhas. Como eu era muito nova, eu n�o entendia isso, mas hoje vejo o quanto isso me afetou, porque passei muito tempo com medo de andar sozinha na rua”, contou.

S�o situa��es como essas que levam jovens dessa faixa et�ria a defenderem, em pleno 2022, o simples direito de ir e vir. Entre tantos movimentos virtuais, as redes sociais se mostram para elas o lugar perfeito para serem quem realmente desejam. Mas, nas ruas da vida real, essas meninas ainda se preocupam com a roupa que v�o usar e os lugares que v�o frequentar, porque sabem do perigo que � ser mulher no Brasil.

PAUTAS FEMINISTAS 

Entre 80% e 90% das meninas que responderam ao nosso question�rio assinalaram a legaliza��o do aborto, igualdade salarial e fim dos padr�es est�ticos opressores entre as pautas de luta. Mas o combate ao ass�dio sexual e pol�ticas p�blicas pelo fim da viol�ncia contra a mulher s�o as prioridades dessa gera��o, surgindo em mais de 95% das respostas. Esse sentimento tamb�m se reflete na pesquisa “Por Ser Menina (2021)” da Plan Internacional Brasil. 

Em todas as regi�es do pa�s, 57% das entrevistadas sentem medo ao andar na rua, enquanto 94% j� presenciaram ao menos uma situa��o de viol�ncia com elas ou pessoas pr�ximas. “Queremos nos sentir pertencentes a um mundo tal qual um homem pode se sentir. Esses pap�is sociais que ainda est�o muito incrustados precisam ser combatidos”, defende a pernambucana Tarsila, de 18 anos.

O FUTURO DO FEMINISMO


O futuro do feminismo � um caminho de luta para muitas das jovens. “As pessoas n�o sabem o que �, t�m uma imagem caricata da feminista que luta para ter pelos e destruir fam�lias”, escreveu uma delas no question�rio. 

O cen�rio pol�tico atual e as fake news tamb�m dificultam o caminho do movimento. “Muitas pessoas votaram no Bolsonaro e n�o gostam de feministas”, apontou outra jovem. Para a paulista Mariana, de 15 anos, o futuro depende do entendimento sobre o feminismo. “Quando a gente tem a percep��o do que �, a gente evita reproduzir comportamentos machistas.” 

A cientista social Carine Passos, doutoranda em sociologia pol�tica, avalia que a nova gera��o tem a capacidade de perceber de maneira r�pida e din�mica as armadilhas espalhadas para manter a opress�o e o sistema de vantagens para os homens. “Uma pessoa que consegue perceber cedo a maneira como o sistema age sobre ela, tem mais chances de fazer escolhas que tendam a buscar mais equidade”, afirmou. 

Mas h� um risco. O acesso a informa��o e a promo��o de um feminismo mais horizontal, que n�o gera participa��o em movimentos institucionais, pode provocar tamb�m um certo individualismo na luta feminista, “sem que esse engajamento saia das redes e ganhe a a��o pol�tica e a constru��o de mecanismos de diminui��o de desigualdades”, pondera Carine. 

APP pra detectar ciladas

Gra�as �s Deusas, t�m meninas mostrando que o movimento sai das redes sociais e vira a��o. Na cidade de Leme, em S�o Paulo, tr�s jovens descobriram o poder da transforma��o pela pr�tica. Elas projetaram o aplicativo “Ser� que � Amor” em 2021, para promover a conscientiza��o de adolescentes e jovens sobre um relacionamento abusivo. 

A ideia foi desenvolvida na Escola Estadual Professora Maria Joaquina de Arruda, tendo � frente as estudantes Beatriz Hildebrand, Kathleen Domingos e Keyth Oliveira, al�m dos docentes Aber Galhardo e Renata Braga. O aplicativo, que ficou em segundo lugar da 9ª Mostra de Ci�ncias e Tecnologia do Instituto 3M, apresenta informa��es sobre relacionamentos t�xicos e indica canais de suporte e ajuda. 

“Eu tenho amigos que vieram falar comigo e que n�o sabiam que aquilo n�o era saud�vel, mas que reproduziam tal comportamento porque viam isso em casa”, conta Beatriz.

Que massa que essa gera��o vai ter mais maneiras para se proteger em diferentes situa��es em que o machismo e o sexismo se manifestam. “E v�o conseguir acionar uma rede de suporte e direitos que muitas de n�s em outras gera��es n�o sab�amos que existiam ou mesmo pass�vamos muito tempo nos sentindo culpadas por viol�ncias sofridas”, acrescenta a antrop�loga Isabela Venturosa.

Poree�m, n�o se iludam, amigues, a gente continua vivendo um mundo que silencia e encaixota mulheres e outros sujeitos, alerta Isabela, “mas hoje as meninas e jovens muitas vezes t�m as informa��es na m�o e, para al�m disso, j� criaram pares, j� discutem as quest�es que as afetam e t�m muito mais capacidade de fazer frente �s desigualdades e �s viol�ncias.”

�, e ligar a antena que detecta o machismo e suas consequ�ncias desde cedo tamb�m pode dar uma cansada diante da realidade em que vivemos, com essa coisa de questionar o mundo toda hora. Ent�o, descansa a militante de vez em quando! 

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