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Estado de Minas CONFLITOS DE TERRA E ATAQUES BOLSONARISTAS

A viol�ncia pol�tica de g�nero no Centro-Oeste

Presidenci�veis s�o atacadas nas redes sociais. Candidatas ao legislativo tamb�m sofrem com machismo e racismo nas ruas


06/10/2022 11:19 - atualizado 06/10/2022 12:09

Depoimento de Eliana Xunakalo
(foto: AzMina)

Aten��o: A reportagem abaixo mostra trechos expl�citos de conte�do mis�gino e racista. Optamos por n�o censur�-los, porque achamos importante exemplificar como o debate � violento na internet, como a viol�ncia pol�tica contra mulheres se espalha pelas redes e � sexista em suas formas, como podemos identific�-la e quais termos s�o frequentemente direcionados �s candidatas ofendidas.

Pela primeira vez desde a redemocratiza��o do pa�s, a regi�o Centro-Oeste teve dois nomes na disputa � presid�ncia da Rep�blica. Mais do que isso, foram mulheres: Simone Tebet (MDB-MS) e Soraya Thronicke (Uni�o Brasil-MS). E, se a proje��o nacional as fez enfrentar uma s�rie de ataques nas redes sociais desde o in�cio da campanha, do outro lado, candidaturas a cargos regionais, principalmente de grupos minorizados, se depararam com agress�es diretas nas ruas e at� amea�as de morte. A viol�ncia pol�tica de g�nero no Centro-Oeste, regi�o do agroneg�cio, n�o tem vi�s ideol�gico �nico: atinge candidatas de esquerda, centro e direita, estende-se �s eleitoras, influenciada pelo que dizem o presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus apoiadores.

Segundo dados do MonitorA 2022, projeto da Revista AzMina em parceria com InternetLab e N�cleo Jornalismo, Tebet e Thronicke respondem por 90% de todas as intera��es registradas em quatro semanas de monitoramento, grande parte com mensagens ofensivas. O projeto acompanhou 32 candidatas na regi�o. Al�m da reprodu��o de discursos de Bolsonaro e seus apoiadores, a despersonaliza��o � uma caracter�stica frequente nas mensagens, que tentam associar as duas candidatas.

Em muitos momentos, Simone e Soraya viram uma �nica personagem – ora de prop�sito, ora porque sendo confundidas. Os ataques na internet tamb�m atrelam as presidenci�veis sul-mato-grossenses � figura de uma dupla sertaneja. Essa estrat�gia ofensiva n�o se repete quando falamos dos candidatos do sexo masculino. Mesmo os aliados s�o tratados de forma individual.

�DIO BOLSONARISTA

Reprodução de posts com ataques à deputada
(foto: AzMina)
 
Em 2018, 66,5% do eleitorado do Centro-Oeste votou em Jair Bolsonaro – a segunda regi�o com melhor desempenho do ent�o candidato. No primeiro turno de 2022, essa tend�ncia se repetiu, sendo o atual presidente l�der em votos na regi�o. Em Mato Grosso, o Nort�o, regi�o que re�ne v�rios munic�pios ligados ao agroneg�cio no estado, � um conhecido reduto bolsonarista.

Em Sinop, a 500 km de Cuiab�, 77,38% dos moradores elegeram o presidente nas �ltimas elei��es. � a cidade onde vive a Professora Graciele (PT), vereadora e candidata n�o eleita a deputada estadual. Mulher negra, ela foi alvo de ataques frequentes nas redes sociais por seu posicionamento ideol�gico e defesa dos direitos de mulheres, e acusada de “vitimismo” quando a imprensa regional denunciou as agress�es sofridas. 

Em 18 meses de mandato como vereadora, Graciele j� registrou tr�s boletins de ocorr�ncia. A viol�ncia pol�tica de g�nero n�o � exclusividade no per�odo eleitoral: em 2021, ela foi alvo de ataques ap�s expor se posicionar contra Bolsonaro por meio de outdoors na cidade, caso que teve repercuss�o nacional.

Para Gabrielle Alves, cientista pol�tica e pesquisadora na Plataforma CIP�, a viol�ncia � mais intensa contra grupos minorit�rios, como negras e ind�genas. Segundo ela, h� v�rios tipos de viol�ncia pol�tica de g�nero e os componentes de sexualidade, classe, etnia, ra�a e territ�rio, aparecem quando essas mulheres sofrem ofensas. O ambiente mais comum para esses epis�dios � a internet, onde h� sensa��o de impunidade, explica.

Eliane Xunakalo (PT-MT), candidata a deputada estadual n�o eleita no estado, � representante do povo Kur� Bakairi, bacharel em Direito e integra o movimento nacional por mais representatividade ind�gena na pol�tica, liderado pela Associa��o de Povos Ind�genas do Brasil (Apib). Ela tamb�m viu a viol�ncia extrapolar as redes sociais durante a sua candidatura. “As pessoas veem o adesivo do partido e j� questionam diretamente para qu� uma �ndia quer estar na elei��o. Me chamam de  ‘�ndia do PT’. E tenho certeza que s� fazem isso comigo por eu ser mulher”, conta. 
 
Foto montagem
(foto: AzMina)
 

Segundo ela, no estado que nunca foi governado por uma mulher, machismo e bolsonarismo se unem. “A gente v� as estat�sticas de viol�ncia contra mulheres por aqui. Quem comete ato de viol�ncia pol�tica comigo s�o brancos, que vem do sul e se acham donos dessa terra. A gente precisa lembrar para essas pessoas que eles n�o mandam aqui. N�s somos a maioria e precisamos votar por aqui. Os vulner�veis se sentem pequenos perto dos colonizadores, mas n�s n�o  somos pequenos, somos muito”, diz. 

As liga��es entre o agroneg�cio e o bolsonarismo tamb�m aumentam a tens�o na regi�o para as minorias. O setor � l�der em conflitos nas terras ind�genas. Grande parte dos assassinatos recentes de ind�genas no Centro-Oeste envolveu disputas por territ�rios cercados pelo agro. Um caso emblem�tico � o das 17 mortes de Guarani Kaiow� em Amambai (MS) registradas nos �ltimos 20 anos, conforme dados do Conselho Indigenista Mission�rio (CIMI).

As candidatas ind�genas tamb�m acabam como alvos. Eliane Xunakalo (PT-MT) foi diretora da Federa��o dos Povos Ind�genas de Mato Grosso (Fepoimt),  que encabe�a a luta pelos territ�rios ind�genas no estado. L�, a segunda maior popula��o ind�gena do pa�s vive em grandes �reas demarcadas, como a Terra Ind�gena do Xingu, a Terra Ind�gena Cinta Larga e o mosaico de territ�rios do povo Xavante. 

Ela afirma que a grande maioria da viol�ncia cometida contra ela veio de pessoas de regi�es do agroneg�cio. No extremo norte do estado, onde a fronteira avan�a contra a floresta, a situa��o piora. “Em Confresa (1200 km da capital) tive que tirar os adesivos do partido do carro. Muitas pessoas falaram que eu corria risco de morte ali se falasse do Lula.“  A cidade foi palco de um dos casos mais brutais das elei��es de 2022. Durante o feriado de 7 de setembro, Rafael Silva de Oliveira (24) assassinou Benedito Cardoso dos Santos (42) depois de uma discuss�o pol�tica. O inqu�rito policial apontou que  Rafael, apoiador de Jair Bolsonaro, assassinou Benedito, que apoiava Lula, com facadas e uma machadada.

Mesmo quando est�o em partidos de direita, as mulheres que participam da vida pol�tica na confirmam a tens�o. Rosana Martinelli (PL-MT) foi a primeira prefeita da hist�ria de Sinop, maior produtora de gr�os do pa�s, a 700 km da capital mato-grossense. Ela � suplente de Wellington Fagundes, rec�m eleito para o Senado Federal pelo partido de Jair Bolsonaro (PL), e conta que durante a sua gest�o na prefeitura, precisou se posicionar v�rias vezes contra a viol�ncia pol�tica de g�nero. As pr�ticas de manterrupting e o mansplaining  – quando � questionado e tirado o direito de fala de uma mulher – eram cotidianas. 

“Ainda precisamos provar que somos capazes e sermos respeitadas. E pra mulher tudo passa por uma dupla dificuldade. Al�m do embate pol�tico, que � desgastante, n�s temos muitas fun��es como mulher e m�e e, em muitos casos, esposa. O teu trabalho quando voc� volta tem outro pacote te esperando. Para n�s a ren�ncia e a cobran�a na vida pol�tica s�o muito maiores”, afirma Martinelli, ressaltando a falta de apoio.

CANDIDATURA LARANJA
Infográfico com ataques à presidenciáveis
(foto: AzMina)

A falta de apoio citada por Rosana pode ser uma das causas de 20 estados brasileiros, incluindo Mato Grosso, nunca terem sido governados por mulheres. Em toda a regi�o Centro-Oeste, apenas o Distrito Federal foi governado por uma mulher: Maria de Lourdes Abadia, vice de Joaquim Roriz, governou o Distrito Federal de mar�o de 2006 a janeiro de 2007.

A falta de acesso aos instrumentos que possibilitam a efetiva elei��o de uma candidata mulher, como os recursos financeiros, tamb�m s�o uma forma  de viol�ncia. � o que se concretiza com o uso de mulheres em candidaturas laranjas. A pr�tica � configurada por chapas que usam mulheres apenas para cobrir a cota de 30% exigida pela lei, mas sem verba e apoio pol�tico real. Uma das principais caracter�sticas das candidaturas femininas “laranjas” � a vota��o zero nas urnas – ou seja, n�o receberam nem o pr�prio voto. Segundo o Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso, no pleito de 2016, onde existem decis�es julgadas, houve 266 candidatos com registro deferido e vota��o zero. Desse total, apenas 17 s�o do sexo masculino, contra 249 do sexo feminino. 

A pr�tica levou � primeira cassa��o de uma chapa inteira pelo uso de mulheres como laranjas em Diamantino, a 181 quil�metros da capital, outra cidade do agroneg�cio. A justi�a cassou os diplomas da chapa “Todos por Diamantino II”,  encabe�ada pelo vereador Edson da Silva (PSD), com mais de 16 suplentes. A decis�o un�nime, proferida em 15 de setembro de 2022, foi classificada pelo TRE-MT como  “hist�rica e com grande potencial pedag�gico”. 

“A mulher n�o pode ser usada, ainda mais para preencher a cota (partid�ria). Aqui em Mato Grosso j� tem mulheres aptas para administrarem o estado. O que falta � oportunidade”, diz Rosana.

O MonitorA � um observat�rio de viol�ncia pol�tica online contra candidatas(os) a cargos eletivos. O projeto � uma parceria entre a AzMina, o InternetLab e o N�cleo Jornalismo. 

O MonitorA conta ainda com a parceria de ve�culos regionais que produzem reportagens sobre viol�ncia pol�tica com o recorte de seus territ�rios. Esta mat�ria, sobre o cen�rio da regi�o Centro Oeste, foi produzida pela Equipe A Lente. Participam do MonitorA ainda Ag�ncia Tatu (AL), data_labe (RJ), Portal Catarinas (SC) e Abar� Jornalismo (AM).

Essa iniciativa � financiada por  Luminate e Reset.

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