Quarentena abst�mia
Jota Dangelo,
Dramaturgo, rec�m-eleito para
a Academia Mineira de Letras
Estou falando de controv�rsias. Porque as h�. De maneira alguma estou me metendo onde n�o fui chamado. Simplesmente, n�o pude deixar de participar deste debate. N�o estou nem de um lado nem do outro, pode crer. Mas confesso que alguma d�vida ainda me assalta. N�o entro no assunto em profundidade, n�o me explico, nem relato raz�es da d�vida, mas sou obrigado a reafirmar que n�o estou t�o certo do contr�rio.
O caso, como se sabe, est� na moda, � mat�ria jornal�stica obrigat�ria, plant�o de notici�rio, vira e mexe de TV, cr�nica de cronistas famosos, entrevistas alarmistas, problemas, problemas. E o debate foi, como n�o podia deixar de ser, virtual. Na base do WhatsApp, quatro amigos agarrados aos celulares e trocando argumentos. Era eu sozinho, tentando defender a lei e os outros tr�s impressionantemente convencidos da falta de argumentos jur�dicos para que a resolu��o decretada pelo prefeito fosse cumprida sem contesta��o.

Acostumado ao conv�vio di�rio, e noturno, com os tr�s, n�o posso negar minha fragilidade de argumenta��o defensiva, num embate em que a maioria absoluta, de tr�s, estava perfeitamente entrosada em suas opini�es, numa frente contestat�ria sem frestas, sem deslizes, sem o m�nimo impasse ou qualquer poss�vel inconsist�ncia.
O primeiro a levantar a quest�o foi o Peninha, velho companheiro de palco, obtendo, em seguida, os calorosos aplausos e solidariedade fan�tica de Z� Maria Amorim, ator e t�cnico teatral, e de Pedro Paulo Cava, dono do Teatro da Cidade, onde se enclausurou de maneira monast�rica nos come�os de mar�o. O argumento do Peninha era simples, sem v�rgulas nem exclama��es: “Bar pertence � serie de equipamentos essenciais que a lei de restri��o da conviv�ncia social nesta pandemia calhorda tinha que, obrigatoriamente, deixar funcionar”.
Pedro Paulo concordava, aplaudia e reafirmava: “Bar � territ�rio livre, como dizia o poeta Paulinho Assun��o! Ali todos os problemas s�o resolvidos em quest�o de horas, com solu��es definitivas que, obviamente, s� dar�o certo se os pol�ticos legislativos, executivos e judici�rios delas souberem e as colocarem em pr�tica”. E Z� Maria completava, com entusiasmo: “E com uma vantagem. No bar, tudo � permitido, tudo pode ser comentado, tudo pode ser inclusive inventado, principalmente porque ningu�m, depois que saiu do boteco, confessa o que l� dentro aconteceu”.
Como se v�, a quest�o era uma s�: na quarentena, bar tinha que ser considerado local de funcionamento essencial. Tentei, com os argumentos que podia, faz�-los deixar de defender posi��o suspeita como a que abra�avam. Mas, confesso, eu argumentava, mas estava com a mem�ria na mesa do bar, onde sent�vamos os tr�s no fim dos nossos expedientes de trabalho. N�o consegui demov�-los. E acho que nem queria...
