
“E a�, j� se vacinou?” N�o sei se ocorre com voc�, mas sempre que converso com algu�m que se encaixa nos grupos eleg�veis para a vacina contra a COVID-19, essa � a primeira pergunta que me vem � mente, logo depois do “como vai?” – porque perguntar “tudo bem?” j� caiu em desuso, com mais de um ano de pandemia e toda a incerteza que recai sobre os ombros de n�s, brasileiros que n�o estamos no grupo priorit�rio.
Imobilizados entre o temor de sermos infectados e o desejo de chegarmos logo ao futuro normal, aquele que est� demorando a surgir no horizonte, � o que parece nos restar neste momento.
Pois ela, a vacina, � a mola propulsora do mundo atual. Dita quem vai sorrir e quem vai chorar. Quem vai recuperar o PIB e quem vai ficar ao relento, em busca das migalhas alheias. Aos reles mortais, permite sonhar. Sobreviver.
Para algumas pessoas digamos assim “afortunadas” h� um atalho nessa caminhada. S�o os abonados, que compram uma temporada nos Estados Unidos com direito a voltar para casa imunizados, e os atletas que ganharam o privil�gio de serem vacinados na esteira das competi��es.
� o capitalismo sambando de m�os dadas com o esporte na cara de quem n�o se enquadra em nenhuma dessas condi��es.
Desde que o mundo � mundo h� essa divis�o, entre os favorecidos e os desfavorecidos. Entre quem det�m o poder e que � ref�m do sistema. Mas a pandemia fez o desfavor de aumentar mais esse abismo e jogar para o fundo do po�o quest�es �ticas e humanit�rias.
Mais do que nunca, o planeta tem girado em torno do umbigo de muita gente. E se isso incluir uma picada de imunizante no bra�o, eles aceitam de bom grado.
Para quem est� no comando, basta definir as regras. Abaladas financeiramente por causa da pandemia (bem menos do que aquela categoria dos reles mortais), as entidades respons�veis pelos principais eventos esportivos do mundo decidiram que n�o vai ser o tal do novo coronav�rus que vai par�-las.
Se n�o tem vacina para todos, vamos ent�o vacinar quem precisa fazer a roda girar, ora bolas!
E foi assim que a Confedera��o Sul-Americana de Futebol (Conmebol) fechou um contrato de “doa��o” de 50 mil doses de vacina com o laborat�rio chin�s Sinovac para levar a imuniza��o a quem vai garantir a disputa da Copa Libertadores, da Sul-Americana e da Copa Am�rica.
O show n�o pode parar, dizem.
Ainda n�o chegou a sua vez de se vacinar? Aguarda sentado, porque antes de voc� – do motorista de �nibus que circula pela cidade, do caixa do supermercado onde voc� faz suas compras e at� do professor do seu filho – � preciso garantir a sa�de dos jogadores que est�o entrando ou entrar�o em campo por esses torneios.
P�o e circo, uma pr�tica milenar.
Mas n�o existe almo�o gr�tis, � sabido. Nesta quinta-feira (13/5), a Conmebol anunciou que a final da Libertadores'2021, marcada para 20 de novembro, ser� no Est�dio Centen�rio, em Montevid�u, com a promessa de torcida nas arquibancadas, j� que a vacina��o no pa�s est� adiantada.
O Uruguai n�o estava entre os candidatos a receber a partida (a grande aposta era a Argentina). Coincidentemente, a situa��o mudou depois que o governo uruguaio entrou em campo e intermediou a aquisi��o da vacina junto � Sinovac – que segundo o jornal argentino La Naci�n ser� um dos patrocinadores oficiais da Copa Am�rica, que come�a em 11 de junho.
Nos Jogos Ol�mpicos � semelhante. Vacinas da Pfizer e da CoronaVac, doadas pelos respectivos laborat�rios ao Comit� Ol�mpico Internacional (COI), v�o garantir os anticorpos necess�rios �s delega��es que estar�o no Jap�o em julho.
Nesta semana, os organizadores da Olimp�ada de T�quio exclu�ram a obrigatoriedade da vacina��o contra a COVID-19 aos atletas, at� porque cada pa�s vivencia uma realidade diferente em rela��o a isso. Mesmo assim, aceitaram o gesto “caridoso” dos laborat�rios.
No Jap�o, a imuniza��o de 2.500 atletas ol�mpicos e paral�mpicos e equipes de apoio est� causando uma revolta p�blica, j� que o ritmo da vacina��o est� bem lento – alcan�ou s� 3% da popula��o.
Pesquisa da Kyodo News revelou que cerca de 70% dos japoneses s�o a favor do adiamento e at� do cancelamento dos Jogos, possibilidade totalmente descartada pelas autoridades.
No Brasil, a vacina��o dos privilegiados ol�mpicos come�ou nessa quarta-feira (12/5). No grupo est�o atletas, integrantes de comiss�o t�cnica, �rbitros e outros credenciados, como jornalistas. Ser�o 1.814 pessoas no total.
Bem naquela toada de dos males o menor, como chegaram ao pa�s, doadas pelo COI, 4.050 doses da Pfizer e mais 8 mil da CoronaVac, segundo o Minist�rio da Sa�de as mais de 8 mil doses restantes ser�o inclu�das no Programa Nacional de Imuniza��o.
Mas a� fica a pergunta: desde que os laborat�rios j� se mostraram abertos a atitudes de tamanha grandeza, seria pedir demais que tais doa��es chegassem a pa�ses que est�o sendo dizimados pela doen�a? Seriam atletas e agregados realmente priorit�rios neste momento?