
O contingente de trabalhadores com carteira assinada � cada vez menor. De outro lado, a quantidade de cadastros de pessoas jur�dicas (CNPJs) � cada vez maior. S�o duas informa��es distintas que, quando reunidas em um mesmo contexto, permitem uma s�rie de interpreta��es. Uma delas foi escancarada durante a pandemia da COVID-19: para alguns, empreender � uma oportunidade; para muitos, necessidade.
Enquanto empresas demitem para economizar e criam comit�s internos de inova��o, pessoas sem renda para sobreviver s�o obrigadas a ser criativas sozinhas. O novo neg�cio precisa dar certo antes do vencimento do pr�ximo boleto, antes ainda da pr�xima refei��o. � uma mostra da desigualdade social sustentando o lado mais perverso do capitalismo.
Uma realidade j� sofrida por tantos e que est� sendo intensificada n�o pode ser considerada um “novo normal”. A taxa de desocupa��o no Brasil passou de 11,2% para 12,6% no trimestre terminado em abril, atingindo 12,8 milh�es de desempregados. Com isso, s�o 898 mil pessoas a mais � procura de trabalho em meio � pandemia, de acordo com a �ltima Pesquisa Nacional por Amostra de Domic�lios Cont�nua (Pnad), divulgada em 28 de maio.
A analista da pesquisa Adriana Beringuy destacou que o emprego com carteira assinada no setor privado no pa�s teve queda recorde. “A gente chega a abril com o menor contingente de pessoas com carteira assinada, que � de 32,2 milh�es”, afirmou. Ela tamb�m apontou que a massa de rendimento real teve a maior retra��o da s�rie hist�rica. “� uma queda de 3,3%, o que significa que em um trimestre a retra��o foi de R$ 7,3 bilh�es.”
MAIS RECORDES
O Brasil teve uma abertura recorde de empresas no primeiro trimestre de 2020: 847 mil. Foram fechadas 292,4 mil, o que resultou, ao fim de mar�o, em 18,287 milh�es de empresas ativas no pa�s. Os dados fazem parte de levantamento lan�ado pelo governo federal, chamado Mapa de Empresas.
O estudo mostra ainda que as atividades econ�micas mais exploradas no primeiro trimestre do ano foram cabeleireiro, manicure e pedicure (45,4 mil empresas abertas; 815,7 mil ativas no total); com�rcio varejista de artigos do vestu�rio e acess�rios (42,9 mil abertas; 1,1 milh�o ativas); promo��o de vendas (36,1 mil abertas; 358,5 mil ativas); obras de alvenaria (29,9 mil abertas; 473,4 mil ativas); e fornecimento de alimentos preparados preponderantemente para consumo domiciliar (23,4 mil abertas; 264,6 mil ativas).
OUTRA MARCA HIST�RICA
O Brasil deve atingir neste ano o maior patamar de empreendedores iniciais dos �ltimos 20 anos, com aproximadamente 25% da popula��o adulta envolvida na abertura de um neg�cio ou com um neg�cio de at� 3,5 anos de atividade, segundo a pesquisa Global Entrepreneuship Monitor (GEM), realizada com o apoio do Sebrae. “Esse n�mero, segundo nossa proje��o, ser� puxado pelas mulheres, pelas pessoas negras, em geral, os grupos que mais costumam ser afetados pelo crescimento do desemprego”, afirmou o presidente do Sebrae, Carlos Melles.
Quase 90% dos empreendedores iniciais brasileiros concordam, total ou parcialmente, que a escassez de emprego constitui uma das raz�es para desenvolver a iniciativa empreendedora com a qual est�o envolvidos. Em compara��o aos outros 54 pa�ses que participaram da pesquisa, o Brasil est� entre os 10 que mais consideram a escassez de emprego como fator motivador para empreender, junto de �frica do Sul e �ndia.
RA�AS E G�NEROS
A Pnad, referente a 2019, apontou ainda a perman�ncia das discrep�ncias entre o rendimento m�dio mensal real em rela��o ao trabalho das pessoas brancas (R$ 2.999, 29,9% superiores � m�dia nacional), pardas (R$ 1.719, 25,5% inferiores) e pretas (R$ 1.673, 27,5% inferiores). O rendimento dessa �ltima parcela � quase um ter�o a menos do que o da m�dia nacional.
J� o rendimento m�dio dos trabalhadores com ensino superior completo (R$ 5.108) era, aproximadamente, tr�s vezes maior que o daqueles com somente o ensino m�dio completo (R$ 1.788) e cerca de seis vezes o daqueles sem instru��o (R$ 918).
As interpreta��es em rela��o �s v�rias pesquisas podem ser muitas, mas peca quem diz que a COVID-19 n�o discrimina. As diferentes an�lises trazem uma constata��o: h� grupos mais desprotegidos e vulner�veis. Comprar de algu�m que passou a vender m�scaras de tecido, comida caseira ou pijama de flanela, e receber o produto das m�os de um motoqueiro, n�o � s� uma oportunidade para voc�, � atender a necessidade do outro.

“A pandemia chegou de um dia para o outro afetando emocional, social e economicamente, exigindo uma redescoberta desesperada por comportamentos, servi�os e produtos que fa�am sentido e sobrevivam a isso tudo.”
Barbara Olivier
diretora-executiva de inova��o e tecnologia na Afferolab.