
O construtivismo � um m�todo de elabora��o do conhecimento por indiv�duos livres. Nas rela��es internacionais foi usado por Alexander Wendt para apontar a necessidade de se prestar aten��o para o fato de que 500 armas nucleares em posse dos brit�nicos amea�avam menos os EUA do que 5 em posse da Coreia do Norte.
E que a forma mais correta de se compreender tal situa��o � observar a constru��o de “amizade” e entendimentos m�tuos entre EUA e Reino Unido, enquanto essas duas constru��es inexistem entre Coreia do Norte e EUA.
Tais entendimentos compartilhados variam ao longo do tempo. E est�o por tr�s da principal not�cia da geopol�tica global recente que � a quest�o dos submarinos australianos. O imbr�glio fez a Fran�a se sentir passada para tr�s – “uma facada nas costas”, nas palavras do chanceler franc�s – por um acordo negociado entre EUA e Reino Unido com a Austr�lia.
A Fran�a construiu uma rela��o de confian�a com a Austr�lia para modernizar a frota de submarinos do pa�s oce�nico. O projeto renderia US$ 66 bilh�es � Fran�a e dotaria a Austr�lia de 12 Shortfin Barracuda. Ainda que em maior escala e com melhor tecnologia embutida, a l�gica do projeto era parecida com a parceria mais humilde que a Fran�a mant�m com o Brasil em Itagua�.
Tudo ia bem, mas por conta da inventada rivalidade dos EUA com a China o pre�o foi ficando pesado para a Austr�lia. Assim, Washington decide viabilizar um salto no programa de submarinos australiano provendo a tecnologia de propuls�o nuclear.
A participa��o do Reino Unido, em detrimento da Fran�a, marca uma identidade espec�fica dessas rela��es de amizade. Subterr�nea e com maior alcance territorial do que a OTAN, a parceria “Cinco Olhos” � o arranjo de compartilhamento de intelig�ncia entre quatro ex-col�nias de povoamento brit�nicas – entre elas a Austr�lia e Nova Zel�ndia – mais o pr�prio Reino Unido.
Liderada pelos EUA, a parceria vem da Segunda Guerra, mas passou a um novo patamar de relev�ncia estrat�gica no mundo digital e na nuvem. Boa parte dessa nuvem � viabilizada por cabos submarinos.
A estrat�gia dos EUA com a Austr�lia faz sentido. A Austr�lia tem mais costa do que os EUA, e os mares do Sudeste Asi�tico, ao seu Norte, s�o uma das �reas mais estrat�gicas do globo.
Essa regi�o equatorial de florestas exuberantes tenta forjar sua governan�a em torna da ASEAN (Associa��o de Na��es do Sudeste Asi�tico), sediada na Indon�sia, pa�s cuja for�a brilha nessa parceria regional montada em torno do diamante da constru��o humana que � a cidade-estado Singapura e o esp�rito de n�o-alinhamento de Bandung. Seus 10 pa�ses-membros contam com uma popula��o total de 650 milh�es de pessoas numa �rea entre �ndia e China.
Ao Sul, a Austr�lia tem acesso privilegiado � Ant�rtida. Com submarinos nucleares, projetar� presen�a por todo o �ndico e o Pac�fico Sul. Como � parte do arranjo “Cinco Olhos”, dot�-la de meios efetivos para vigiar os mares ao seu redor faz mais sentido do que os EUA tentarem fazer tudo a partir de seus territ�rios.
O que � dif�cil explicar, sem prestar aten��o a subjetividades complicadas, � essa quest�o de passar a Fran�a para tr�s. Porque a Austr�lia poderia ter submarinos nucleares em parceria com a Fran�a. Faltou honrar a amizade mais antiga.
Partes importantes da independ�ncia dos EUA e de sua posterior expans�o foram forjadas em Paris. A Fran�a foi a primeira aliada da independ�ncia. Tamb�m ajudaram a assegurar a forma��o dos EUA contra for�as inglesas, a Espanha e a Holanda.
O pr�prio acordo de paz entre Inglaterra e EUA que selou a independ�ncia americana foi assinado na Rua Jacob, n�mero 56, em Paris – cidade onde moraram figuras-chave da cria��o dos EUA como Benjamin Franklin, Thomas Jefferson e John Adams. At� o desenho da nova capital, Washington, foi feito por um franc�s: Pierre Charles L’Enfant, que lutou na revolu��o.
Como aponta James Kurth, professor em�rito do pequeno e prestigioso Swarthmore College, na grande Filad�lfia, a Fran�a � a principal – se n�o a �nica – for�a aliada a contestar com veem�ncia e a��es algumas estrat�gias unilaterais do “imp�rio � moda americana”. � �bvio que fazem por seus interesses.
Sejam eles gaullistas, materialistas, existencialistas ou o escambau. Mas t�m uma fun��o �nica no sistema internacional. Novos bobos da corte talvez, mas t�m sua fun��o.
A quest�o dos submarinos para a Austr�lia, mostra que existem diferen�as qualitativas na amizade entre o grupo dos cinco angl�filos e os demais.
O clube-do-bolinha-ingl�s-nuclear dos cinco revela uma identifica��o muito restrita em um mundo muito grande – especialmente problem�tica para os EUA que se beneficia enormemente da diversidade que para ele atrai e a partir da qual projeta simpatia.