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Estado de Minas MIDIA E PODER

Jovens n�o devem 'pagar pau' para tudo o que Lula diz na aula do Podpah

Entenda o modus operandi ret�rico com que o petista encanta plateias e entrevistadores, mas como o utiliza para pregar a luta de classes e escamotear a verdade


07/12/2021 06:00 - atualizado 07/12/2021 09:23

Lula no Podpah
Lula durante entrevista ao podcast Podpah (foto: Reprodu��o Youtube)
Costumo dizer que Lula � para mim como pizza de alcachofra. Atraente e chique como ser de esquerda. Fa�o for�a de gostar, mas tem elementos que me descem mal e me impedem de pedir de novo.

J� era encantador e est� ficando melhor depois de velho, como no baile que deu na entrevista de 2h20 ao Podpah, na quinta-feira, que chegou a impressionantes 6,5 milh�es de visualiza��es em 72 horas, n�o por seus olhos azuis.

� capaz de mesmerizar o espectador com uma conversa de cozinha t�o rica de exemplos, provas de vida e ensinamentos que soa como um programa de auto-ajuda de possibilidades reais. Quando n�o � contestado, como no caso, melhor ainda.

Tem um modus operandi ret�rico infal�vel para estabelecer cumplicidade com plateias e entrevistadores, num trip� sobre conhecimento de exemplos pr�ticos, met�foras vistosas e resili�ncia.  Em geral, em sete passos:

%u25CF Nunca d� uma resposta sofisticada, que n�o possa ser entendida por pessoas com a idade intelectual de funkeiros como os donos do canal;

%u25CF canaliza a maioria das quest�es para o manique�smo das elites contra os pobres; 

%u25CF d� nome, rosto, objetos, cen�rios ou n�meros exuberantes a exemplos acachapantes de injusti�a;

%u25CF faz met�foras vistosas para emoldurar a cena;

%u25CF compara com alguma experi�ncia dura de vida sua, que demonstre sua afinidade com a desgra�a dos pobres;

%u25CF emenda um discurso de resili�ncia e;

%u25CF conclui com uma piada.


Nessa toada, gasta s� cinco segundos para explicar as causas reais do aumento de pre�os, para emendar logo que empres�rios se aproveitam porque n�o l�em a B�blia. Sergio Moro o condenou porque � um mentiroso e  o mundo � injusto porque a elite representada pela direita s� pensa em rico e em seu patrim�nio.

Faz refer�ncia a ricos de bairros chiques paulistanos, Jardim Europa e Morumbi, em oposi��o a velhos passando fome na rua. Trilh�es sendo gastos com bancos e guerras em contraste com 800 milh�es de famintos no mundo e 19 milh�es no Brasil.

Lembra que vestia galocha para atravessar a viela de barro miser�vel em que viveu, sonhava com chicletes que n�o podia comprar ou o p�o com mortadela e tuba�na que p�de pagar com seu primeiro dinheiro de engraxate.

D� a volta por cima disso tudo com exemplos de como superou o pavor de falar em p�blico e da primeira vez que enfrentou a c�pula dos maiores l�deres mundiais sem falar uma palavra al�m do portugu�s.

Depois de se colocar como cidad�o do mundo, que j� trocou figurinha com Fidel Castro, Barack Obama e Rainha Elizabeth, desce at� uma brincadeira/provoca��o com os entrevistadores ou a equipe que o acompanha, como fazem os cantores de rock com suas bandas.

Em geral sobre futebol, comida ("voc� ainda vai comer a sua mortadela")  e, mais recentemente, namoro, aproveitando a presen�a da namorada Janja. 

— Esse est�dio de voc�s � um muquifo como o do Stuquinha — refere-se ao fot�grafo Ricardo Stuckert, que o acompanha desde a Presid�ncia.

Na soma, encadeando tudo, coloca-se com alta efici�ncia no lugar das v�timas e se mostra como exemplo de que � poss�vel enfrentar as adversidades, poderosos inclusive, e sair da mis�ria. Mais do que isso, como Cristo, tem ele mesmo como vencer para que todos sejam salvos. 

A piada � para que se lembrem de quanto � bacana, um cara que, apesar de tudo o que passou, ri da pr�pria desgra�a. N�o tem remorso e � grato aos que o apoiaram, at� quando preso. 

Como o her�i de fic��o que foi ao fundo do po�o, de onde saiu para enfrentar os vil�es e voltar para casa realizado.

— Estou preparado, estou com energia de 30 anos e tes�o de 20.

No artigo que publiquei em fevereiro de 2016, quando ele tentava levantar a moral do partido em meio ao baque da Lava Jato, tamb�m no fundo do po�o como ele,  mostrei o quanto seu fasc�nio advinha do quanto se encaixava nesse her�i de cinema.


Minhas restri��es, a n�vel de alcachofra, est�o em que:

1. Insiste na luta de classes com que ajudou a dividir o pa�s, apelando quando preciso a simplifica��es grosseiras como a de que a direita governa para os ricos. N�o que acredite em outra forma de produzir desenvolvimento, riqueza, impostos e emprego, para reduzir a mis�ria de forma estrutural, a meu ver de forma mais competente do que a esquerda.

2. Finge que n�o faz parte da elite que condena, com a qual governou e pretende governar. Nem que tenha cometido como governante os erros que acusa nos outros. A certa altura, ao dizer que Bolsonaro acabara com o seu Bolsa Fam�lia, pontifica que � comum pol�ticos tentarem desqualificar o que seus antecessores fizeram. Sem se dar conta de que foi o que mais fez em rela��o a Fernando Henrique Cardoso, a quem acusava de caudat�rio de todas as desgra�as do pa�s desde 1500. Deixou famosa a express�o "Nunca antes na hist�ria deste pa�s", mantra de uma ideia fixa de que nada prestava antes de sua posse.

3. Escamoteia as respostas que precisam ser dadas sobre seus erros, a ponto de poder dizer, como tem feito no in�cio de cada entrevista, que n�o h� pergunta proibida. At� porque se utiliza de todos os seus recursos ret�ricos para desqualificar as descobertas da Lava Jato. De que se diz inocente e de processos anulados, apesar do caminh�o de provas admitidas em tr�s inst�ncias e de que os processos continuam em andamento.

Uma pizza Lula mais diger�vel passaria pela honestidade — ou o uso da humildade que esbanja na sua pros�dia de encantador de serpentes — para desmontar esse edif�cio ret�rico de dissimula��o. Essa pizza de alcachofra.

Explicar as diferen�as reais entre suas ideias e as dos advers�rios, incorporar com generosidade a contribui��o � sociedade de atores que n�o fazem parte da sua bandeja e dar um m�nimo de explica��o sobre as acusa��es que lhe pesam, pelo menos em respeito ao j� sabido pela plateia. 

Serviria enormemente melhor, uma pitada de tempero al�m da alcachofra, � aula que pretendeu dar ao p�blico jovem do canal. Que analistas adultos oportunistas chamaram indevidamente de "uma aula de pol�tica" ou "uma aula de economia". Com simplifica��es t�o grosseiras, claro que n�o �.

Mas a� n�o seria o Lula padr�o. Dependeria de um racioc�nio mais sofisticado de que � capaz, mas que n�o lhe interessa. Na medida em que desequilibra o manique�smo que � base de todas as reviravoltas emocionais da jornada do her�i com que construiu sua performance ret�rica.

Cabe aos jovens saber separar os temperos, ouvir outros pol�ticos de ideias contr�rias, pesquisar e considerar a hip�tese de pedir uma pizza mais completa, aquelas t�picas "da casa", que tem de tudo, para todos os gostos.

N�o devem, como disse Mitico, o gordinho comil�o da dupla dona do canal, "pagar pau" para ele. Pagar pelo empenho de ter ido � entrevista e se esfor�ar para dar uma aula, sim, mas n�o comprar de face tudo o que ele diz. Na boa, t� ligado?

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