
Bem que se tentou p�r em pr�tica uma reorganiza��o da economia brasileira na linha liberal-radical sob o impacto de v�rias reformas ditas estruturantes. No centro de tudo estava fazer todo o poss�vel para reduzir gastos ou gerar receitas com vendas de ativos, com vistas a pagar parcelas crescentes da d�vida p�blica, e por a� reduzir a elevada despesa com juros, que exigia igualmente elevados super�vits prim�rios para evitar que a d�vida p�blica subisse demasiadamente. Por tr�s das cortinas, havia tamb�m um forte vi�s espec�fico ante investimento p�blico, ante funcion�rio p�blico e pr� investidor privado estrangeiro nas concess�es de infraestrutura. A mesma receita valeria, embora de forma n�o muito expl�cita, como orienta��o b�sica para as pol�ticas de refinanciamento de d�vidas e de concess�o de novo endividamento aos governos de estados e munic�pios.
Em adi��o, por conta do teto de gastos, herdado de Temer, dava para prever que, em 2021, os investimentos das administra��es diretas praticamente zerariam. Quanto ao mais, tudo o que se vinha fazendo virou uma esp�cie de heran�a maldita.
A pandemia do COVID-19 jogou, contudo, todo esse experimento por terra e exp�s v�rios problemas que n�o vinham sendo tratados adequadamente, como a profunda crise financeira estadual e municipal – a que tenho dedicado v�rios de meus artigos – e impasses complicados no setor de concess�es de infraestrutura.
Nesse cen�rio, o governo federal deveria dedicar especial aten��o aos investimentos em infraestrutura, e aos privados em particular. S� assim teremos importantes ganhos de produtividade para o pa�s, na luta para sairmos da grave crise que assolou o mundo.
Um importante avan�o ocorreu recentemente, com a publica��o, pela AGU, de parecer concluindo que as concession�rias ter�o direito a reequil�brio econ�mico-financeiro dos contratos em decorr�ncia da COVID-19. A interpreta��o, corret�ssima do meu ponto de vista, � que a forte queda de demanda que vem sendo observada nos servi�os concedidos – mais de 30% nas rodovias e em torno de 90% nos aeroportos – deve ser atribu�da a fatos de for�a maior e que, portanto, fogem � responsabilidade da concession�ria.
� lament�vel que a AGU n�o interprete da mesma forma os impactos da crise de 2015/16, que, at� ent�o, provocara a maior queda do PIB de nossa hist�ria. L�, como c�, a forte queda da demanda era imprevis�vel, estava fora do controle das concession�rias e reduziu fortemente suas receitas. O reequil�brio seria n�o somente justo, como permitiria recompor o caixa das empresas e, assim, viabilizar novos investimentos.
� igualmente lament�vel que o governo federal venha ignorando a possibilidade de as atuais concess�es investirem em obras novas, n�o previstas nos contratos originais. S�o obras importantes, como duplica��es de pistas, constru��o de vias marginais ou altera��es de tra�ados n�o previstas nos contratos originais, mas que v�m se tornando cada vez mais necess�rias para acomodar o maior fluxo de ve�culos (a queda recente � tempor�ria, e o fluxo dever� se restabelecer, ainda que n�o integralmente, ap�s a pandemia). A necessidade dessas obras j� havia sido identificada em 2015, com investimentos de R$ 15 bilh�es em 9 projetos, mas h� forte resist�ncia, no TCU e no Executivo, para realizar aditivos contratuais. As concession�rias se responsabilizariam pelos investimentos e o reequil�brio poderia ser feito via prorroga��o do prazo de concess�o, de forma a n�o onerar os usu�rios nem o governo.
O Ministro de Infraestrutura argumenta que � melhor esperar vencerem os contratos, pois assim seria poss�vel obter tarifas mais baixas. Mas h� dois problemas com esse racioc�nio. O primeiro � o tempo. Mesmo no caso da Dutra, da Rio/Juiz de Fora e da Rio/Teres�polis, cujos contratos est�o em vias de vencer, as novas obras n�o come�ariam antes de 2024 ou 2025. Isso se o governo conseguir assinar o novo contrato j� no in�cio do ano que vem, o que provavelmente n�o ocorrer� diante das in�meras etapas que ainda faltam ser cumpridas para realizar a licita��o.
Em segundo lugar, o Ministro parece estar excessivamente confiante nos resultados dos futuros leil�es, mais especificamente, na participa��o de players internacionais. Ignora que o capital externo j� controla ou det�m participa��o relevante em todas as atuais concession�rias; que a atual pandemia est� deprimindo os lucros em geral, o que reduz a capacidade de investimento de potenciais concorrentes; e que o risco-pa�s aumentou consideravelmente este ano, n�o s� em fun��o da COVID-19, mas da pr�pria atua��o err�tica do governo. Seria muito bom se viesse capital externo novo, mas n�o se pode apostar fichas nele.
Na atual conjuntura, contar com novos participantes nas concess�es � contar com o ovo antes da galinha. Enquanto isso, o pa�s fica sem os investimentos de que tanto necessita e a sa�da da crise se torna mais improv�vel...
