
Imagina, desde sempre, seu organismo produzir ossos a cada queda ou impacto do seu corpo e formar uma esp�cie de um “segundo esqueleto”? Parece realidade distante? N�o �. Apesar de ser considerada como uma doen�a rara, que afeta uma a cada um milh�o de pessoas, essa � a realidade de centenas de pessoas no Brasil.
Essa malforma��o nos p�s – os ‘ded�es’ dos p�s s�o menores e virados para dentro ou inexistentes –, atinge cerca de 98% das pessoas que tem FOP. O reconhecimento disso � muito importante, porque a partir da constata��o da exist�ncia dessa m� forma��o pode-se buscar por uma altera��o gen�tica.
� o que explica Patr�cia Delai, dermatologista, especialista em Fibrodisplasia Ossificante Progressiva e membro do Conselho Cl�nico Internacional de FOP. Segundo ela, com o reconhecimento da malforma��o dos dedos dos p�s, a doen�a, desconhecida por m�dicos, profissionais de sa�de e popula��o em geral, pode ser identificada mais rapidamente, ainda na sala de parto.
“Depois de perceber a malforma��o, pode-se fazer o teste gen�tico para saber se de fato ir� haver a forma��o de novos ossos. E por que isso � t�o importante? Porque o paciente com FOP n�o pode passar por cirurgias ou bi�psias, n�o pode tomar inje��es intramusculares e nem sofrer quedas, pois tudo isso origina na forma��o de novos ossos. Qualquer batida ou trauma no m�sculo pode levar a uma explosiva forma��o de novos ossos.”
“A partir deste diagn�stico, ent�o, pode-se evitar cirurgias, bi�psias e procedimentos inadequados e, tamb�m, pode-se providenciar vacinas por via subcut�nea. Evita-se tamb�m que esse paciente e sua fam�lia fa�am uma peregrina��o em busca de respostas, o que � muito importante, porque a falta de um diagn�stico � um pesadelo que muitas fam�lias sofrem e que, honestamente, eu n�o desejo nem para o pior inimigo”, completa.
Para al�m do quesito malforma��o, por que a doen�a pode ser identificada ainda na sala de parto? Ao longo da vida uma pessoa n�o pode desenvolver a doen�a? N�o. O que acontece � que, conforme Patr�cia Delai, a patologia acomete o organismo humano em raz�o de uma muta��o gen�tica, ou seja, ainda na forma��o do feto.
“� um defeitozinho bem pequeno no gene que causa todo esse problema. Uma rela��o gen�tica que chamamos de autoss�mica dominante, que � transmitida de pais para filhos. Por exemplo, se pessoas com FOP se casarem e tiverem filhos, h� uma chance de 50% do filho tamb�m nascer com a patologia. Agora, se os pais n�o tiverem a doen�a, a chance � de uma em um milh�o. E ela n�o tem cura.”

“O que temos � o manejo dos sintomas, porque quando esses ossos se formam, formam calombos, que chamamos de surtos, que s�o dolorosos e podem permanecer por semanas e at� meses, e que ao regredir deixa no lugar incha�os. Eles podem ocorrer de forma espont�nea ou em resposta a uma queda, trauma, batida ou cirurgia. E � importante dizer que a doen�a evolui em um padr�o temporal e espacial definidos: de cima para baixo e de dentro para fora, pegando por �ltimo a mand�bula e dificultando a alimenta��o e a fala.”
A forma��o desses ossos, aos poucos, atravessam as articula��es, fazendo com que os movimentos se tornem imposs�veis, deixando o corpo im�vel. E um problema � que a, como diz o pr�prio nome, a Fibrodisplasia Ossificante Progressiva � progressiva, independentemente da idade, sexo ou ra�a.
“� como se o corpo virasse uma pe�a inteiri�a e, de repente, voc� n�o pudesse mais sentar, apenas ficar deitada, por exemplo, ou vice versa. Durante os surtos, os pacientes v�o viver de analg�sicos, mas eles d�o um exemplo para todas as outras doen�as: � poss�vel conviver com a dor e com as limita��es, s� � preciso uma atitude positiva”, aponta a m�dica.
UM CICLO
Jessica Beltramin Lira, de 29 anos, sofre da doen�a, e s� descobriu aos 9. Sua vida mudou, mas ela conta que se trata de um ciclo, assim como a pr�pria patologia. “O primeiro passo foi me adaptar para ter facilidade com as mudan�as, entender os medos e pensar de forma racional. Tenho o h�bito de colocar o presente sempre em primeiro lugar. A doen�a tem um ciclo que pode ser natural ou acelerado, sou dependente sempre de algu�m para me ajudar em quase tudo que fa�o.”
Hoje, mesmo com as limita��es e sendo dependente, J�ssica Lira trabalha como auxiliar de cobran�as. “Tenho em minha volta pessoas incr�veis dispostas a viver comigo uma grande aventura e conhecimento. Isso ajuda muito, apesar de todo desconforto. Sempre me senti forte emocionalmente, vivo sempre mais aberta para as emo��es do que para os medos, acredito que n�o tenha nada a ver com a for�a f�sica, mas sim com a resist�ncia. Tenho minha fam�lia como base de vida, minha religi�o onde acredito no elemento do desenvolvimento humano e amigos dispostos a compartilhar experi�ncias”, diz.
EM VOGA
A Associa��o Brasileira de Fibrodisplasia Ossificante Progressiva est� engajada para que seja aprovado o Projeto de Lei 5.090/20, do deputado Marcelo Aro (PP-MG), que prev� a “obrigatoriedade de exame cl�nico destinado a identificar a FOP em rec�m-nascidos, na triagem neonatal da rede p�blica e privada de sa�de, com cobertura do Sistema �nico de Sa�de (SUS)”. Al�m disso, a FOP Brasil espera garantir a inclus�o de um curso de educa��o m�dica continuada sobre FOP no curr�culo m�dico.
“� extremamente importante, porque h� um desconhecimento m�dico, com pessoas se submetendo a quimioterapias com diagn�stico de c�ncer, sendo que n�o �. Isso piora o quadro do paciente com FOP. Al�m disso, � uma medida sem custos e ben�fica, j� que, para al�m dos que sofrem com a doen�as, todos se beneficiam, pois � por meio das doen�as raras que se tem respostas para doen�as comuns”, afirma Patr�cia Delai, uma das respons�veis por apresentar a causa ao deputado Marcelo Aro.
“Eu fui procurado por duas m�dicas, a Fil�, refer�ncia no atendimento pedi�trico em Belo Horizonte, e a Patr�cia Delai, de S�o Paulo, especialista no cuidado de pacientes com FOP. Elas partilharam comigo o drama vivido por muitas fam�lias e me pediram ajuda com o assunto. Eu estudei muito e estive com diversos pacientes. � uma realidade muito dura que essas pessoas vivem. O fato � que sem tratamento at� o momento, a melhor forma de conter o avan�o da FOP � identific�-la o quanto antes, para proteger o paciente de les�es que possam resultar na forma��o de mais ossos”, diz o deputado Marcelo Aro.
"� um projeto que garantir� muito mais qualidade de vida aos pacientes. E o melhor � que n�o ter� custos nenhum para o Estado."
Deputado Marcelo Aro (PP-MG)
Justamente por isso, ele afirma que o diagn�stico precoce � determinante e, portanto, apresentou o PL 5.090/20, que ajuda no diagn�stico da doen�a. “Na maioria esmagadora dos casos, a FOP pode ser pr�-identificada a partir de um simples exame cl�nico neonatal, que reconhece uma deformidade muito t�pica nos ded�es dos p�s dos rec�m-nascidos. Mas isso n�o est� nos protocolos de sa�de. O projeto inclui a observa��o dessa caracter�stica e a inser��o dessa informa��o na triagem feita pelos m�dicos e pode mudar completamente o destino dessas pessoas com FOP.”
“� um projeto que garantir� muito mais qualidade de vida aos pacientes. E o melhor � que n�o ter� custos nenhum para o Estado”, diz.
Atualmente, o projeto tramita em car�ter conclusivo nas comiss�es e passar� nas Comiss�es de Seguridade Social e Fam�lia e Constitui��o e Justi�a e de Cidadania. Quando aprovado, ele seguir� para ser votado no Senado.
“J� foi designado o relator na CSSF, o deputado Lucas Redecker, um parceiro na causa. J� conversei com ele para garantir a apresenta��o r�pida do relat�rio, o que dever� ser feito nos pr�ximos dias. Estou muito otimista, porque temos o apoio da Frente Parlamentar Mista em Aten��o Integral �s Pessoas com Doen�as Raras, composta por 228 deputados e 16 senadores, que tenho o orgulho de presidir. J� conquistamos tamb�m o apoio do governo, por meio da primeira-dama Michelle Bolsonaro. Esse apoio ser� fundamental para a san��o do projeto quando aprovado no Congresso Nacional.”
*Estagi�ria sob a supervis�o da editora Teresa Caram