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Estado de Minas BBC

O surpreendente lado positivo do mau humor

� natural preferir evitar sensa��es desconfort�veis como desilus�es, preocupa��es, raiva ou tristeza, mas pesquisas psicol�gicas recentes sustentam a ideia de que elas atendem a prop�sitos �teis nas nossas vidas. Quando aprendemos a observar essa import�ncia e aceitar esses sentimentos sem julgamento, podemos ter melhor sa�de f�sica e mental.


21/01/2022 23:41 - atualizado 21/01/2022 23:41

Grumpy cat - a gatinha com cara de mau humor
Reprimir ou condenar nossas emo��es negativas pode trazer consequ�ncias s�rias para a nossa sa�de e bem-estar (foto: Getty Images)
�s vezes temos vontade de ficar nos criticando por n�o nos sentirmos alegres - mas existem raz�es para que aceitemos nossas rabugices.

 

Imagine que voc� acabou de passar por algo desagrad�vel - seu amigo esqueceu seu anivers�rio, voc� n�o foi aprovado para um novo emprego ou acabou de acordar depois do feriado e lembrou que precisa ir trabalhar. Como voc� normalmente reage a esses sentimentos?

 

Voc� pode tentar dizer a voc� mesmo que isso n�o importa e n�o se deixar� abater. Voc� pode tentar evitar pensar na m� not�cia, mas, quando ela finalmente se instala no seu dia, voc� se pergunta por que est� t�o sens�vel.

 

Essa tend�ncia � rejei��o e autopuni��o pode ser descrita como "vergonha do humor": a cren�a de que ter maus sentimentos � uma falha pessoal.

 

Olhar sempre para o lado positivo da vida poder� at� parecer sinal de for�a e coragem. Mas, se for levado ao extremo, podemos acabar nos criticando por rea��es perfeitamente razo�veis a certos eventos.

 

� natural preferir evitar sensa��es desconfort�veis como desilus�es, preocupa��es, raiva ou tristeza, mas pesquisas psicol�gicas recentes sustentam a ideia de que elas atendem a prop�sitos �teis nas nossas vidas. Quando aprendemos a observar essa import�ncia e aceitar esses sentimentos sem julgamento, podemos ter melhor sa�de f�sica e mental.

 

Deixo claro que, quando falo sobre nossa necessidade de aceitar emo��es negativas, n�o estou falando de depress�o ou ansiedade severa - ou qualquer outro dist�rbio do humor cr�nico que precise de aten��o profissional. N�o h� nada a ganhar com sofrimento prolongado e insuport�vel se voc� precisa e pode buscar tratamento m�dico e apoio � sa�de mental.

 

Estou me referindo �s nuvens tempor�rias que podem se abater sobre as nossas vidas por algumas horas ou dias. Essas emo��es tempor�rias, na verdade, n�o representam amea�a ao nosso bem-estar a longo prazo, mas muitas vezes agimos como se fosse este o caso - e � tentador tentar evit�-las.

 

Como observou a fil�sofa italiana Ilaria Gaspari em seu recente livro Vita Segreta delle Emozioni ("A Vida Secreta das Emo��es", em tradu��o livre), nossas tentativas de suprimir as emo��es podem simplesmente acrescentar camadas de "vergonha" e "medo" ao que j� sentimos, al�m de fazer-nos sentir inveja das pessoas que parecem ter vidas mais felizes. O sentimento resultante, segundo ela, � ainda "mais forte e duradouro" que o que estamos tentando evitar.

 

"Levei muito tempo para entender que ser emotivo n�o significa ser inst�vel ou desequilibrado, mas sim estar vivo, aberto e vulner�vel �s experi�ncias do mundo", afirma ela.

 

Gaspari escreveu com base na sua experi�ncia pessoal, mas diversos estudos cient�ficos confirmam que a "vergonha do humor" pode ser prejudicial para o nosso bem-estar. Para ter uma ideia dessas pesquisas, considere as quest�es a seguir. Em uma escala de 1 (nunca/muito raramente) a 7 (com muita frequ�ncia/sempre), como voc� avaliaria estas afirma��es?

  • Eu digo a mim mesmo(a) que n�o deveria me sentir como estou me sentindo.
  • Eu me critico por ter emo��es irracionais ou inadequadas.
  • Eu acho que algumas das minhas emo��es s�o ruins ou inadequadas e eu n�o deveria senti-las.

Ao questionar mil participantes, Iris Mauss, da Universidade da Calif�rnia em Berkeley, nos Estados Unidos, concluiu que, quanto mais altas as notas das pessoas nessa escala, maior era a sua probabilidade de relatar sintomas de depress�o e ansiedade. Elas tamb�m apresentavam tend�ncia a ter menor satisfa��o geral na vida e menos bem-estar psicol�gico.

 

J� as pessoas que aceitavam seus pensamentos e sensa��es sem consider�-los "ruins" ou "inadequados" costumavam ter melhor sa�de psicol�gica.


Pessoa de costas segura guarda chuva transparente em meio à chuva
A maioria das emo��es negativas vai embora como nuvens passageiras - mas isso n�o significa que elas devam ser ignoradas (foto: Getty Images)

Ver o lado bom e o ruim

Meu interesse pessoal nas consequ�ncias da "vergonha do humor" come�ou enquanto pesquisava para meu livro, The Expectation Effect ("O efeito da expectativa", em tradu��o livre).

 

Existem enormes evid�ncias de que podemos criar profecias autorrealiz�veis em muitas �reas da vida. Na medicina, por exemplo, sabemos que nossas interpreta��es de sintomas f�sicos como dores podem alterar a forma como passamos por elas e at� influenciar nossa rea��o fisiol�gica.

 

Comecei a imaginar se o mesmo era v�lido para nossas emo��es. Em vez de mudar as pr�prias emo��es, poder�amos alterar a forma como pensamos sobre elas - e assim melhorar a pr�pria experi�ncia e seus efeitos sobre a sa�de a longo prazo.

 

A desilus�o, por exemplo, pode parecer desagrad�vel - mas voc� poder� admitir que essa emo��o nos ajuda a aprender com nossos erros. E, atribuindo um significado mais positivo a essa emo��o e reconhecendo seus potenciais benef�cios - em vez de sentir que � algo que "n�o � saud�vel" -, voc� poder� mudar a atua��o do c�rebro e as rea��es do corpo a uma preocupa��o.

 

Pesquisando a literatura sobre psicologia, encontrei rapidamente um estudo do Instituto de Desenvolvimento Humano Max Planck em Berlim, na Alemanha, que tentou demonstrar exatamente isso. Os pesquisadores pediram aos participantes do estudo que avaliassem diversas emo��es, como nervosismo, raiva ou abatimento, e sua influ�ncia sobre o seu descontentamento. Eles tamb�m pediram que as pessoas falassem sobre a adequa��o, utilidade e significado dessas emo��es - tr�s dimens�es que, reunidas, captavam o "valor" atribu�do pelos participantes a cada sentimento.

 

De forma geral, os participantes que encontravam valor positivo no seu "mau" humor normalmente atingiam resultados muito melhores em avalia��es de bem-estar f�sico e mental, incluindo seu risco de doen�as, como diabete ou doen�as cardiovasculares, e at� sua resist�ncia muscular (considerada indicador geral de preparo f�sico). E, de fato, a capacidade de enxergar valor em emo��es desagrad�veis praticamente eliminou as rela��es entre a sa�de dos participantes e a quantidade real de preocupa��es experimentadas por eles ao longo de um per�odo de tr�s semanas.


Homem com roupa esportiva sentado com as maos na cabeça
N�o precisamos ficar esgotados com o mau humor (foto: Getty Images)

Combust�vel para o crescimento

Desde ent�o, encontrei muitas evid�ncias que demonstram como o reconhecimento dos potenciais benef�cios das emo��es pode influenciar poderosamente os seus efeitos.

 

A ansiedade, por exemplo. Podemos considerar que os sentimentos de ansiedade podem arruinar nossa concentra��o e reduzir nosso desempenho em tarefas dif�ceis - que somente podemos ter sucesso em um exame ou entrevista se aprendermos a relaxar. Ou podemos observar esses sentimentos como uma fonte de energia.

 

O ator brit�nico Robert Pattinson parece usar essa estrat�gia para lidar com os nervos no ambiente de filmagem - e estudos cient�ficos recentes indicam que esse tipo de atitude pode melhorar nosso desempenho em desafios de curto prazo, como prestar exames dif�ceis ou falar em p�blico. A longo prazo, ele at� reduz o risco de burnout e exaust�o.

 

Um efeito de expectativa similar aplica-se a emo��es como a raiva. Podemos acreditar que a frustra��o rapidamente esgota nosso autocontrole, mas podemos alternativamente observ�-la como uma emo��o galvanizadora que fortalece nossa capacidade de resolu��o e nos d� o poder de exigir o que merecemos. Essas formas de pensamento determinar�o nosso desempenho em diversas tarefas, como negocia��es.

 

Os cientistas ainda est�o investigando as formas como a percep��o das nossas emo��es pode influenciar a sa�de f�sica, conforme observado no estudo do Instituto Max Planck em Berlim, mas a quantidade cada vez maior de pesquisas sobre os efeitos psicol�gicos da avalia��o das emo��es j� sugere alguns mecanismos plaus�veis.

 

Quando encontramos um fator de estresse que, para n�s, � pessoalmente amea�ador, temos a tend�ncia de sofrer flutua��es exageradas de horm�nios como cortisol e inflama��es. Essas altera��es fisiol�gicas poder�o ajudar a preparar o corpo para riscos no futuro pr�ximo, mas, se forem mantidas por longos per�odos, poder�o gerar desgaste do corpo.

 

Se tivermos a sensa��o de que todo mau humor � inadequado, motivo de vergonha ou potencialmente prejudicial para n�s, isso formar� um sentido de vulnerabilidade e isolamento, que pode exacerbar e prolongar os efeitos fisiol�gicos.

 

Reavaliar nossas emo��es - para reconhecer seu valor inerente - pode remover essas camadas adicionais de estresse e at� fornecer uma sensa��o de empoderamento e autonomia. Aceitar nossos sentimentos pode equilibrar a rea��o fisiol�gica e ajudar a nos recuperarmos mais rapidamente, com menos tens�o geral sobre os nossos corpos.

 

A interpreta��o do nosso humor pode ter consequ�ncias importantes a longo prazo, segundo um fascinante estudo longitudinal que envolveu mais de 28 mil pessoas. Pediu-se aos participantes que relatassem seus n�veis de ansiedade e tens�o mental e se eles acreditavam que o estresse prejudicaria sua sa�de.

 

Aparentemente, essas expectativas moldavam o seu risco de morrer. As pessoas que sofriam de alto estresse e acreditavam que o estresse as prejudicaria apresentaram mortalidade muito mais alta ao longo do per�odo de estudo que aquelas que se sentiam estressadas, mas n�o compartilhavam das expectativas negativas dos seus efeitos.

 

Os cientistas haviam verificado uma s�rie de outros fatores de estilo de vida, como a renda, educa��o, atividade f�sica e fumo antes de chegar a essa conclus�o. � claro que o estudo n�o comprova a causalidade, de forma que sua conclus�o precisa ser analisada com um pouco de ceticismo. Mas ela certamente est� de acordo com o padr�o geral dos estudos mais curtos. Todos eles indicam que a nossa interpreta��o das emo��es � t�o importante quanto os pr�prios sentimentos.

Tons de cinza

O in�cio de um novo ano pode ser a �poca perfeita para colocar em pr�tica essa compreens�o mais sutil das emo��es.

 

No hemisf�rio norte, � mais frio e �mido e o retorno ao trabalho pode ser um choque doloroso depois de uma semana de feriados. Alguns de n�s podemos sofrer tristeza no in�cio do ano, ao mesmo tempo em que ansiamos por uma vida melhor - o que cria sentimentos de t�dio, frustra��o e tristeza.

 

Em vez de fazer julgamentos severos por esses sentimentos, voc� poder� debru�ar-se sobre esse mau humor com o autocuidado necess�rio para super�-lo. Sem lutar contra as pr�prias emo��es, voc� poder� come�ar a questionar se essas sensa��es t�m import�ncia. Talvez elas o ajudem a identificar uma mudan�a importante que voc� pode fazer na sua vida, por exemplo.

 

�s vezes passaremos por per�odos de afli��o sem nenhum lado bom - e precisaremos de todo o apoio que pudermos conseguir para passar por eles. Mas, de forma geral, o nosso humor n�o � bom nem ruim, mas sim tem muitos tons diferentes. Prestando aten��o a esses tons, podemos enfrentar as tempestades da vida com mais facilidade.

 

*David Robson � escritor de ci�ncias residente em Londres. Seu �ltimo livro, O efeito da expectativa: como o seu pensamento pode transformar a sua vida (em tradu��o livre do ingl�s) foi publicado no Reino Unido em 6 de janeiro de 2022 e, nos EUA, ser� publicado em 15 de fevereiro de 2022. Sua conta no Twitter � @d_a_robson.

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Leia a �ntegra desta reportagem (em ingl�s) no site BBC Future.


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