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Estado de Minas CONSUMO DESENFREADO

Os seres humanos s�o capazes de destruir toda a vida na Terra?

Tend�ncia humana aparentemente insaci�vel de consumir est� mudando nosso planeta e a vida nele %u2014ser� que somos capazes de alterar nosso comportamento?


01/07/2021 07:18 - atualizado 01/07/2021 11:06

A massa de coisas feitas pelo homem é maior do que a de todos os seres vivos do planeta %u2014 será que nosso consumo desenfreado pode destruir a vida na Terra?(foto: JOSUA MARUNDUH/GETTY IMAGES)
A massa de coisas feitas pelo homem � maior do que a de todos os seres vivos do planeta %u2014 ser� que nosso consumo desenfreado pode destruir a vida na Terra? (foto: JOSUA MARUNDUH/GETTY IMAGES)


Entre os v�rios riscos de cat�strofes globais conhecidos pelos seres humanos, alguns aparecem mais na m�dia do que outros. Impactos de asteroides, erup��es de supervulc�es e as mudan�as clim�ticas j� protagonizaram filmes de Hollywood.

E cada um deles teve um impacto devastador na vida do nosso planeta no passado.

No entanto, uma nova amea�a global capaz de destruir a vida na Terra — desconhecida para muitas pessoas — est� se formando nas sombras da nossa vida cotidiana.

Ela � movida pelo imenso desejo humano de consumo material. E, paradoxalmente, uma consequ�ncia da pr�pria vida humana.

Basta olhar em volta — voc� est� inseparavelmente cercado por objetos materiais —, sejam eles necess�rios em sua vida ou n�o.

Para cada objeto que usamos, existe uma crescente rede de a��es globais que est� lentamente destruindo a sa�de emocional humana, esgotando os recursos da Terra e degradando os habitats do nosso planeta.

Se n�o for controlado, existe o risco de o consumo humano acabar transformando a Terra em um mundo inabit�vel? Ser� que devemos parar antes que seja tarde demais?

Uma equipe de pesquisadores do Instituto de Ci�ncias Weizmann, em Israel, publicou recentemente um estudo que comparou a massa produzida pelo homem — tamb�m conhecida como massa antropog�nica — com toda a massa viva, ou biomassa, do planeta.

Pela primeira vez na hist�ria da humanidade, o primeiro ou ultrapassou o segundo ou est� perto de ultrapassar nos pr�ximos anos.

O estudo estima que, em m�dia, cada pessoa no planeta produz agora mais massa antropog�nica do que seu peso corporal por semana.

"A descoberta de que a massa antropog�nica — coisas feitas pelo homem — agora pesa tanto quanto todas as coisas vivas, e o fato de que continua a se acumular rapidamente, oferece outra perspectiva clara de como a humanidade � agora um ator importante na forma��o da face do planeta", diz o professor Ron Milo, do Instituto de Ci�ncias Weizmann.

"A vida na Terra � afetada de forma quantitativa importante pelas a��es dos humanos."

Esta revela��o n�o � surpresa para muitos que consideram que os humanos j� deram in�cio a uma nova �poca geol�gica chamada Antropoceno — a era dos humanos, termo popularizado pelo qu�mico ganhador do Pr�mio Nobel Paul Crutzen.

Embora o in�cio exato desta era seja discut�vel, n�o h� como negar que os humanos se tornaram uma for�a dominante neste planeta, alterando todas as outras formas de vida por meio de suas a��es.

A escala e o tamanho da massa antropog�nica s�o alarmantes.

Veja o caso do pl�stico — o surgimento da era dos pl�sticos modernos ocorreu apenas em 1907, mas hoje produzimos 300 milh�es de toneladas de pl�stico todos os anos.

Al�m disso, a percep��o de que, depois da �gua, o concreto � a subst�ncia mais usada na Terra est� al�m da compreens�o.

O gigantesco processo de geoengenharia iniciado pelos humanos teve um aumento acelerado quando materiais como concreto e agregados se tornaram amplamente dispon�veis.

Estes dois materiais constituem um dos principais componentes do crescimento da massa antropog�nica.

At� mesmo as relativamente recentes aventuras humanas de explora��o espacial, que come�aram h� cerca de 60 anos, est�o desencadeando um problema desastroso de lixo espacial.

Paralelamente a isso, observamos o derretimento das calotas polares, o degelo do permafrost e o aumento das temperaturas no planeta.

Mas por que isso aconteceu? Os humanos s�o geneticamente inclinados a ser materialistas ao ponto de causar sua pr�pria destrui��o? O ac�mulo de massa antropog�nica � apenas uma medida da taxa de aniquila��o dos humanos? Ou a natureza vai preparar os humanos para lidar com esse problema?

Todas essas quest�es s�o altamente incertas.

Embora haja evid�ncias de que o materialismo � aprendido e influenciado pela cultura, alguns argumentam que a sele��o natural pode ter predisposto nossa esp�cie ao desejo de acumular coisas.

Nossos pertences podem nos oferecer uma sensa��o de seguran�a e status que, sem d�vida, desempenhou um papel mais relevante no in�cio da hist�ria humana.

De alguma forma, criar coisas novas se tornou uma palavra divina na psique humana coletiva. Est� desagradavelmente presente em todos os nossos empreendimentos, desde hist�rias antigas at� laborat�rios de pesquisa e desenvolvimento modernos.

"No princ�pio, Deus criou o c�u e a Terra..." diz a hist�ria do G�nesis na B�blia.

Os humanos foram condicionados a acreditar que criar algo novo � um prop�sito significativo de vida — e a �nica maneira de promover suas ambi��es. No entanto, esquecemos de colocar um limite de uso.

Os limites da ci�ncia nunca foram t�o evidentes ao tentar resolver esse enigma.

Depender apenas de solu��es tecnol�gicas verdes � equivocado porque o foco ainda � baseado em coisas novas e mais uso — e n�o em mudar o estilo de vida ou modelos de neg�cios que originaram esse problema em primeiro lugar.

Mesmo que a gente consiga substituir todos os ve�culos movidos a combust�veis f�sseis por equivalentes el�tricos, por exemplo, as cidades j� est�o com dificuldade de tirar espa�o dos carros nas ruas, e os ve�culos el�tricos t�m seu pr�prio impacto nos recursos mundiais devido aos materiais necess�rios para fabric�-los.

"O ac�mulo de massa antropog�nica tamb�m est� relacionado ao desenvolvimento urbano, junto com suas implica��es ambientais associadas, j� testemunhadas em todo o mundo", diz Emily Elhacham, uma das autoras do estudo do Instituto de Ci�ncias Weizmann.

"Espero que a conscientiza��o promova uma mudan�a de comportamento que permita encontrar um ponto de equil�brio melhor. Cada passo nessa dire��o ter� um efeito positivo."

Veja a pegada de carbono de nossos gadgets, da internet e dos sistemas de suporte. Ela � respons�vel por cerca de 3,7% das emiss�es globais de gases do efeito estufa — e a previs�o � de que este percentual dobre at� 2025.

� poss�vel reduzir as emiss�es com um e-mail a menos ou evitar um compartilhamento desnecess�rio de fotos nas redes sociais — pode parecer uma redu��o insignificante por parte de um indiv�duo, mas podemos somar bilh�es dessas pequenas a��es.

As grandes empresas de tecnologia afirmam que est�o se tornando verdes ou definindo metas para a neutralidade de carbono, mas raramente incentivam as pessoas a gastar menos tempo nas redes sociais ou a comprar menos produtos.

Em vez disso, os modelos de publicidade e marketing transmitem mensagens poderosas que refor�am o lema: criar e consumir mais.

Esse materialismo selvagem irracional tamb�m est� profundamente enraizado nas tradi��es e nos s�mbolos culturais. Nos Estados Unidos, o Dia de A��o de Gra�as � seguido por outra celebra��o, a Black Friday.

Durante este ritual, longas filas de consumidores se formam nos shoppings, muitas vezes h� quem saia machucado ou pisoteado — mas as pessoas est�o convencidas de que � um esfor�o que vale a pena.

Na era do Antropoceno, os humanos podem se sentir no direito de depositar esperan�a na tecnologia para consertar qualquer problema, de modo que possam continuar a fazer o que est�o fazendo.

Diante do ac�mulo de pl�stico no meio ambiente, por exemplo, um surto de inova��o resultou em copos de caf� biodegrad�veis, sacolas ecol�gicas e canudos reutiliz�veis.

Mas embora seja verdade que um modelo de crescimento sustent�vel que inclui nosso meio ambiente tenha um potencial muito maior para perseverar, precisamos de uma abordagem diferente para a sustentabilidade que trate do nosso consumismo desenfreado.

A covid-19 nos lembrou como a civiliza��o humana � fr�gil e despreparada quando se trata de casos como uma pandemia.

Tamb�m nos ensinou que o comportamento humano pode ser modificado com pequenas a��es, como usar m�scara para mitigar a intensidade das trag�dias globais.

A abordagem passiva da prolifera��o da massa antropog�nica n�o se deve apenas � falta de conhecimento sobre seu impacto, mas, em geral, tamb�m tem a ver com a tend�ncia humana de rejeitar fatos que n�o se enquadram em sua vis�o de mundo.

O ser humano est� naturalmente disposto a desconsiderar as quest�es que n�o desafiam seu cotidiano ou que diluem sua conveni�ncia.

Al�m disso, podem encontrar consolo no pensamento de que a natureza pode capacitar os organismos para sobreviver, n�o importa o que fa�amos.

� verdade que a evolu��o lenta e gradual, ao estilo Darwiniano, por meio da sele��o natural � muitas vezes surpreende em certos ambientes extremamente polu�dos.

Em 2016, uma equipe de cientistas no Jap�o encontrou uma cepa de bact�ria em uma unidade de reciclagem de garrafas capaz de decompor e metabolizar pl�stico.

Por outro lado, esta descoberta mostra as maneiras sutis e poderosas pelas quais as a��es humanas est�o mudando a vida neste planeta.

A adapta��o dos organismos em resposta aos poluentes � um fen�meno complexo.

"No longo prazo, um aumento sustentado da massa antropog�nica levaria � perda de habitats por meio de deslocamento f�sico e altera��o de habitats, como contamina��o por poluentes resultantes da produ��o e descarte de massa antropog�nica", diz Alessandra Loria, bi�loga da Universidade McGill, no Canad�, autora principal deste estudo.

A pesquisa indica que os efeitos negativos induzidos pela polui��o geralmente pioram ao longo de v�rias gera��es, embora o mecanismo de enfrentamento varie em diferentes esp�cies.

O r�pido esgotamento dos recursos naturais e da biodiversidade n�o � uma corrida evolutiva normal � qual a natureza est� acostumada.

Embora algumas esp�cies possam certamente se adaptar �s mudan�as que ocorrem em nosso meio ambiente, os humanos n�o s�o mais uma mera esp�cie que segue a evolu��o de Darwin, mas uma for�a muito maior que veio para conduzir a evolu��o neste planeta.

Estudos mostram que, para a maioria das esp�cies, n�o se espera que a adapta��o evolutiva seja suficientemente r�pida para amortecer os efeitos das mudan�as ambientais causadas pela atividade humana. E nossa pr�pria esp�cie n�o ser� uma exce��o.

Embora n�o esteja provado que iremos nos destruir, h� indica��es claras de que ignoramos os efeitos por nossa pr�pria conta e risco.

Por exemplo, algumas das extin��es em massa na hist�ria da Terra est�o relacionadas � acidifica��o dos oceanos. Os oceanos absorvem cerca de 30% do di�xido de carbono liberado na atmosfera, o que por sua vez aumenta sua acidez.

Os oceanos podem estar se acidificando mais r�pido hoje do que nos �ltimos 300 milh�es de anos, sobretudo em decorr�ncia das atividades humanas.

"A vida humana ser� afetada negativamente por causa da perda de v�rios benef�cios e servi�os ecossist�micos fornecidos pela diversidade biol�gica", diz Loria.

"Por exemplo, a polui��o da �gua pode afetar os servi�os de abastecimento, como de �gua e alimentos, causando uma redu��o na diversidade alimentar e/ou na sua qualidade e seguran�a. A degrada��o generalizada dos ecossistemas amea�a as condi��es de vida na Terra, em particular a sobreviv�ncia a longo prazo da nossa pr�pria esp�cie."

Nosso impacto no planeta � muito mais profundo do que as pegadas de carbono ou o aquecimento global.

Ele aponta para um futuro em que os efeitos da massa antropog�nica v�o assumir — se � que j� n�o assumiram — a identidade da Terra e sua vida. Diante disso, os pr�prios humanos podem sair perdendo na corrida evolutiva.

Eliminar materiais como concreto ou pl�stico, ou substitu�-los por alternativas n�o resolver� o problema fundamental das atitudes humanas e nosso apetite sem precedentes por mais.

� exatamente aqui que o materialismo pode se transformar facilmente em um conhecido desconhecido fator de risco para uma cat�strofe global.

A infinidade de maneiras pelas quais ele pode transformar este planeta em um mundo mundano � algo que nossa civiliza��o nunca vivenciou antes.

Na aus�ncia de um escudo evolutivo totalmente seguro, poder�amos depender de nossa intelig�ncia para sobreviver.

No entanto, como afirma Abraham Loeb, professor de ci�ncias da Universidade de Harvard, nos EUA, e astr�nomo em busca de civiliza��es c�smicas mortas, "a marca da intelig�ncia � a capacidade de promover um futuro melhor".

"Se continuarmos a nos comportar dessa forma, podemos n�o sobreviver por muito tempo", diz ele.

"Por outro lado, nossas a��es podem ser uma fonte de orgulho para nossos descendentes se eles sustentarem uma civiliza��o inteligente o suficiente para perdurar por muitos s�culos."

A hist�ria de Bhasmasura na mitologia hindu oferece um paralelo sombrio do impacto do materialismo.

Devoto do deus Shiva, ele obt�m uma b�n��o de Shiva, que concede a ele o poder de transformar qualquer um em cinzas com um simples toque na cabe�a.

Logo ap�s ganhar esta habilidade m�gica, ele tenta test�-la no pr�prio Shiva. Shiva consegue escapar, reza a lenda.

Mas os humanos podem n�o ter sorte o suficiente para fugir de suas pr�prias a��es.

A menos que a gente adote uma vis�o diferente enraizada na redu��o do consumo, as chamas do nosso pr�prio materialismo podem consumir a n�s mesmos e ao nosso planeta.

* Santhosh Mathew � professor de f�sica e astronomia do Regis College, em Boston, e autor de dois livros cient�ficos.

Leia a vers�o original desta reportagem (em ingl�s) no site BBC Future.

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