Cientistas buscam novos caminhos para combater a depress�o
Tratamento alternativo, baseado em psicoterapia e antidepressivos poder�o ajudar pessoas com o dist�rbio que n�o respondem � terapia tradicional
Francisco Romo-Nava avalia efeitos da estimula��o el�trica das vias de comunica��o entre corpo e c�rebro (foto: University of Cincinnati/Colleen Kelley)
A depress�o � um problema de sa�de com incid�ncia crescente nos �ltimos anos e previs�es de que as taxas seguir�o aumentando. Pode ser tratada com terapia e/ou medicamentos, mas muitos pacientes acabam n�o respondendo da melhor forma �s op��es medicamentosas – a estimativa da Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) � de que, globalmente, cerca de 20% das pessoas est�o nessa condi��o. Para auxili�-las, cientistas buscam novas abordagens. E t�m fugido do convencional nesse trabalho.
Equipes dos Estados Unidos, por exemplo, estudam o uso do g�s do riso e de estimula��o da medula espinhal. J� pesquisadores brasileiros apostam em um aplicativo que estimula a realiza��o de atividades prazerosas e pode ser indicado para pessoas com a forma leve da enfermidade.
“Uma grande porcentagem de pacientes n�o responde �s terapias antidepressivas padr�o. Acreditamos que � muito importante encontrar novos tratamentos para ajudar essas pessoas”, enfatiza ao Estado de Minas Charles R. Conway, professor do curso de psiquiatria da Universidade de Washington. Com esse objetivo, Conway e sua equipe resolveram testar o uso do �xido nitroso, conhecido popularmente como g�s do riso, em um grupo de 24 volunt�rios que enfrentavam dificuldades para tratar a depress�o. “Os indiv�duos que selecionamos falharam em uma m�dia de quatro testes com antidepressivos”, detalha o cientista.
Todos os participantes foram submetidos a tr�s tipos de sess�es. Na primeira, foram expostos a uma mistura composta por metade de g�s do riso e metade de oxig�nio. Na segunda, foram expostos a uma mistura com 25% do �xido nitroso. Por �ltimo, respiraram apenas oxig�nio (placebo). Todas as terapias duraram uma hora, com um intervalo de um m�s entre elas. Em 17 pacientes, as duas primeiras sess�es geraram melhoras nos sintomas de depress�o, sendo que os resultados mais duradouros se deram ap�s a sess�o inicial.
Segundo os autores, drogas antidepressivas padr�o afetam os receptores dos horm�nios norepinefrina e serotonina no c�rebro, mas os efeitos esperados demoram semanas para ser registrados. J� o �xido nitroso interage com um n�mero maior de diferentes receptores das c�lulas cerebrais, chamados NMDA de glutamato, o que tende a melhorar os sintomas em apenas algumas horas ap�s a exposi��o � subst�ncia. “O fato de termos visto melhorias r�pidas em muitos desses pacientes sugere que o �xido nitroso pode ajudar as pessoas com depress�o resistente realmente severa”, enfatiza Conway.
Renata Rainha, psiquiatra da Associa��o Psiqui�trica de Bras�lia, avalia que os dados s�o animadores, apesar de a abordagem ainda ser experimental. “S�o an�lises preliminares, mas j� podemos ver uma importante vantagem, que � o efeito imediato de melhora. A maioria dos antidepressivos demora semanas para funcionar, e isso � uma dificuldade que enfrentamos no tratamento e desanima os pacientes”, diz.
Segundo a m�dica, pesquisas que buscam novas op��es terap�uticas s�o muito bem-vindas. “� muito importante pensar em possibilidades efetivas para quem sofre com a depress�o refrat�ria, que s�o os pacientes que n�o respondem aos medicamentos atuais. As pesquisas podem nos ajudar a evitar que esses pacientes tenham que ser internados, o que � algo que gera bastante sofrimento”, justifica.
BACT�RIA
A toxina botul�nica, um medicamento derivado de uma bact�ria, � comumente usada para tratar rugas, enxaquecas, espasmos musculares, sudorese excessiva e incontin�ncia. Especialistas acreditam que a depress�o pode ser mais uma complica��o a entrar nessa lista. “Durante anos, os m�dicos observaram que a utiliza��o dessa toxina por raz�es cosm�ticas parece aliviar a depress�o em seus pacientes”, relata, em comunicado, Ruben Abagyan, professor de farm�cia da Universidade da Calif�rnia.
Para avaliar melhor o tema, o cientista e sua equipe analisaram dados m�dicos de cerca de 40 mil pessoas que receberam inje��es de toxina botul�nica e foram acompanhadas, por meses, antes e ap�s a aplica��o da subst�ncia. Com o uso de um algoritmo projetado para encontrar diferen�as estatisticamente significativas, os especialistas descobriram que a depress�o foi relatada com 40% a 88% menos frequ�ncia nas pessoas que receberam o produto, quando comparadas a quem n�o se submeteu ao procedimento.
A hip�tese do grupo � de que a toxina botul�nica possa ser transportada para as regi�es do sistema nervoso central envolvidas no humor e nas emo��es, um fen�meno que, enfatizam os cientistas, precisa ser melhor investigado.
Danielle H. Admoni, psiquiatra e docente na Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de S�o Paulo (Unifesp), indica alguns pontos a serem explorados. “Essa pesquisa avaliou um n�mero amplo de indiv�duos, mas n�o detalha pontos importantes, como o n�vel de depress�o de cada paciente. Outra quest�o � que os cientistas suspeitam que a melhora de determinadas enfermidades, como a incontin�ncia e a sudorese, devido ao uso da toxina, gerou melhoras de humor do paciente de forma indireta. � algo que s� saberemos com pesquisas futuras que considerem esse efeito indireto”, justifica.
CORRENTE EL�TRICA
Outra op��o que est� sendo estudada como poss�vel tratamento para a depress�o � a estimula��o el�trica da medula espinhal. A aposta � de Francisco Romo-Nava, pesquisador da Universidade de Cincinnati. O psiquiatra explica que o c�rebro e a medula espinhal s�o componentes do sistema nervoso central conectados por vias neurais. “Acreditamos que uma corrente el�trica relativamente pequena aplicada atrav�s da pele, que mal pode ser sentida pelo paciente e n�o vai machuc�-lo, vai moderar as vias neurais de comunica��o c�rebro-corpo na medula espinhal e impactar certas regi�es do c�rebro”, resume.
Romo-Nava e sua equipe selecionaram 200 participantes para testar a nova t�cnica. “Ainda � cedo e precisamos realizar muito mais pesquisas, mas esses podem ser os passos iniciais para desenvolver um melhor tratamento para certos pacientes com depress�o, evitando os efeitos colaterais dos medicamentos e melhorando a qualidade de vida geral”, diz o cientista.
(foto: PIXABAY)
Aplicativo da USP reduz sintomas pela metade
O uso de um aplicativo contribui para a redu��o de sintomas de depress�o leve em indiv�duos que tamb�m sofrem com doen�as cr�nicas, como depress�o e diabetes. Chamada Conemo, a solu��o foi criada por pesquisadores da Universidade de S�o Paulo (USP) em parceria com cientistas ingleses, americanos e peruanos. A tecnologia foi desenvolvida com base em uma t�cnica da terapia cognitivo-comportamental e induz o paciente a realizar atividades prazerosas.
Para o estudo, foram selecionados 880 brasileiros com depress�o e alguma doen�a cr�nica, um perfil escolhido pelo fato de essas enfermidades aumentarem o risco de desenvolvimento de sintomas depressivos. Metade dos analisados recebeu o tratamento de rotina (terapia e medicamentos). A outra parte incluiu o uso do aplicativo aos cuidados tradicionais. O experimento durou seis semanas.
O aplicativo continha explica��es sobre depress�o e convidava os usu�rios a realizarem atividades como ouvir m�sica e ligar para um conhecido. Ao fim do experimento, observou-se que o uso da tecnologia reduziu em 50% os sintomas depressivos.
“Analisamos dados da Pesquisa Nacional de Sa�de de 2013 e vimos que em torno de 8% dos brasileiros adultos apresentavam sintomas de depress�o que mereciam algum tipo de cuidado, mas somente um em cada cinco estava recebendo aten��o de sa�de e, principalmente, medica��o”, afirma, ao Jornal da USP, Paulo Rossi Menezes, professor de medicina preventiva da Faculdade de Medicina da USP e um dos respons�veis pela pesquisa. Os resultados foram publicados na revista especializada Jama.
“Mais comum do mundo”
A Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) prev� que, at� 2030, a depress�o ser� “a doen�a mais comum do mundo”. Um levantamento da ag�ncia das Na��es Unidas, divulgado em 2018, indica que a quantidade de casos de depress�o cresceu 18% em 10 anos. O Brasil � campe�o de casos da enfermidade, com 6% da popula��o diagnosticada com o transtorno comportamental, um total de 11,5 milh�es de pessoas, tamb�m de acordo com o �rg�o. Desses, de 10% a 30% n�o respondem aos tratamentos tradicionais.