Combina��o promissora de drogas contra a COVID-19
Cientistas seguem mobilizados na busca por uma terapia com alta efic�cia contra o v�rus. Entre as estrat�gias est�o coquet�is com medicamentos diferentes
Cerca de 30% da popula��o mundial recebeu, ao menos, uma dose das vacinas para o Sars-CoV-2 e, nesse cen�rio, o n�mero global de casos e �bitos decorrentes continuam altos. Em 30 de agosto – dado consolidado mais recente da Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) – morreram, no mundo, 67.475 pessoas e outras 4.502.702 testaram positivo para o coronav�rus.
Sem tratamento espec�fico nem cura para a COVID-19, cientistas continuam buscando drogas capazes de evitar que a infec��o progrida. Apesar de avan�os nesse sentido, um medicamento com alta efic�cia para a doen�a ainda n�o foi encontrado.
� poss�vel, inclusive, que o tratamento seja composto por uma combina��o de drogas. At� agora, os estudos com seres humanos mostram que, enquanto algumas funcionam no in�cio da doen�a, ao menos tr�s – o corticoide dexametasona e os anticorpos monoclonais com a��o anti-inflamat�ria tocilizumabe e sarilumabe – s�o capazes de evitar �bitos em pacientes graves.
“Algumas das estrat�gias antivirais mais efetivas s�o coquet�is, nos quais os pacientes recebem v�rias drogas diferentes que combatem a infec��o, como aquelas usadas para tratar HIV”, conta Thomas Rogers, professor do Departamento de Imunologia e Microbiologia do Instituto de pesquisas Scripps, na Calif�rnia.
Desde o in�cio da pandemia, cientistas apostam no reposicionamento de drogas como estrat�gia para combater a COVID-19. Trata-se de investigar, entre f�rmacos j� existentes, aqueles com potencial para tratar uma doen�a para a qual n�o foram desenvolvidos inicialmente.
Intelig�ncia artificial e aprendizado de m�quina permitem identificar milhares de compostos promissores que, por�m, precisam ser testados em c�lulas, animais e, depois, no homem, para ter a efic�cia e a seguran�a comprovadas. Apenas a minoria passa no teste, mas foi assim que se identificaram os rem�dios utilizados atualmente no combate � COVID-19.
A OMS, os Estados Unidos e o Reino Unido lideram os principais projetos de reposicionamento de drogas que, quando identificadas, s�o testadas em multicentros de v�rios pa�ses, incluindo no Brasil. O maior deles � o brit�nico Recovery, com 12 mil pacientes, encabe�ado pela Universidade de Oxford.
Foi gra�as a esse projeto, do qual participam mais de 42 mil profissionais em todo o mundo, que se comprovou a efic�cia da dexametasona, um corticoide de baixo custo e amplo acesso, para pacientes graves.
Tamb�m foi o Recovery que descobriu, recentemente, que a combina��o de dois anticorpos monoclonais – casirivimabe e imdevimabe – reduzem �bitos de pacientes que n�o conseguem montar a pr�pria resposta imunol�gica. At� agora, s� havia indica��o de uso dessa classe de medicamentos para a doen�a leve.
“A pandemia da COVID-19 ainda tem um longo caminho a percorrer e, embora a doen�a continue a ceifar vidas, continuaremos nossa busca para encontrar novos tratamentos eficazes que sejam acess�veis a todos”, comenta Peter Horby, do Departamento Nuffield de Medicina da Universidade de Oxford e vice-presidente do Recovery. Ele conta que, atualmente, o projeto est� investigando tr�s medicamentos e um protocolo de tratamento.
No fim de julho, come�aram os primeiros testes do empaglifozin, uma droga de baixo custo utilizada para diabetes 2 que pode reduzir a inflama��o, melhorar a fun��o cardiovascular e aumentar o transporte de sangue e oxig�nio do paciente com covid. Os testes ser�o feitos em 185 hospitais do Reino Unido, do Nepal e da Indon�sia, com 41 mil pessoas.
Al�m dessa droga, o Recovery avalia a efic�cia de baricitinibe (imunomodulador usado no tratamento de artrite reumatoide), dimethyl fumarate (tamb�m imunomodulador, mas para psor�ase e esclerose m�ltipla) e o uso de corticosteroides em dose normal versus alta dosagem.
Em testes, drogas com bons resultados para casos leves nem sempre ajudam pacientes que enfrentam quadros graves da doen�a
(foto: Carla Bernhardt/AFP)
ALVO DIF�CIL
Atualmente, as apostas da ci�ncia e da medicina est�o em tr�s tipos de medicamentos: os corticosteroides, que lutam contra a hiperinflama��o caracter�stica da doen�a grave, os anticorpos monoclonais, tamb�m anti-inflamat�rios, e os antivirais. Esses �ltimos ainda n�o mostraram muitos benef�cios em estudos.
O remdesivir, �nico medicamento aprovado em definitivo – e n�o em car�ter emergencial – para tratar a covid leve pela ag�ncia regulat�ria norte-americana Food and Drug Administration (FDA), se saiu bem nos primeiros testes, mas decepcionou nos seguintes.
V�rus n�o t�m c�lulas, o que dificulta a descoberta de um alvo para atac�-los. Uma estrat�gia que vem sendo estudada �, em vez de se focar no micro-organismo, tentar impedir que seus receptores nas c�lulas do hospedeiro abram as portas para que eles entrem. Por�m ainda n�o h� medicamentos prontos, com esse conceito.
Al�m das estrat�gias medicamentosas, outras abordagens t�m sido estudadas desde o in�cio da pandemia. Uma delas � o uso de soro convalescente. A ideia � que o plasma de pessoas que tiveram a doen�a pode refor�ar o sistema imunol�gico de pacientes porque tem anticorpos neutralizantes naturais.
Por�m, os estudos n�o t�m demonstrado resultados promissores. Cientistas canadenses publicaram as descobertas de um dos maiores ensaios cl�nicos sobre a t�cnica, com 930 volunt�rios de Canad�, Estados Unidos e Brasil.
Os pesquisadores descobriram que o soro convalescente n�o foi capaz de evitar o progresso da doen�a e a intuba��o dos pacientes graves. Dependendo do perfil de anticorpos do doador, ele poderia at� piorar o estado cl�nico.
Mas Phillip B�lgin, um dos principais investigadores e pesquisador da Funda��o Ste. Justine, diz que o resultado n�o � definitivo. “As informa��es obtidas no nosso estudo podem ser analisadas com os resultados de v�rios estudos semelhantes em andamento no mundo para fornecer informa��es e percep��es mais robustas que guiar�o a pr�tica cl�nica e a pol�tica de sa�de globalmente”, diz.
No Brasil, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e o Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (Idor) est�o avaliando a efic�cia da t�cnica. De acordo com a assessoria de imprensa do Idor, ainda n�o h� dados consolidados.
Duas perguntas para...
C�sar Omar Carranza Tamayo
Membro do Comit� T�cnico de Medicina Tropical da Sociedade Brasileira de Infectologia, professor da Universidade Cat�lica de Bras�lia e infectologista do Hospital Anchieta.
Embora n�o exista cura para a COVID-19, o que h� de mais avan�ado no tratamento?
Atualmente, s�o os anticorpos monoclonais, mol�culas desenvolvidas em laborat�rio. Existem os utilizados para preven��o das formas graves da doen�a, h� v�rios licenciados em outros pa�ses e na Anvisa para uso emergencial. Eles t�m como fun��o se unir aos receptores da prote�na spike do coronav�rus. Com isso, se evita que o v�rus ingresse nas c�lulas, diminuindo o risco de a pessoa evoluir de um caso leve para um grave. Lembrando que esses anticorpos devem ser utilizados no in�cio da infec��o. Se o paciente j� est� num quadro mais grave, n�o tem indica��o. Outro anticorpo � o tocilizumabe, que, apesar de ter resultados conflitantes – ou seja, estudos que mostram benef�cios e outros que n�o mostram tantos –, pode ser utilizado para pacientes graves. Mas, infelizmente, os estudos mostram que n�o h� nada capaz nem de prevenir a infec��o nem de matar o v�rus.
Muitas pessoas continuam comprando hidroxicloroquina e ivermectina acreditando que ficar�o protegidas do Sars-CoV-2. Quais os principais malef�cios dessas drogas em caso de uso sem indica��o?
Infelizmente, ainda h� pessoas que usam hidroxicloroquina e ivermectina como supostas terapias preventivas do coronav�rus. Assim como o antibi�tico azitromicina e a colchicina, v�rios estudos foram descontinuados porque j� est� bem definido que n�o h� efic�cia na preven��o da doen�a. E v�rias dessas drogas t�m efeitos adversos. A hidroxicloroquina pode causar arritmias card�acas, problemas oftalmol�gicos. A ivermectina tem um potencial de toxicidade porque, para esse suposto uso preventivo contra covid, s�o utilizadas doses maiores que as recomendadas. H� paciente que pode ter rea��es hep�ticas. J� temos presenciado alguns graus de hepatite associados � ivermectina que diminu�ram ap�s a cessa��o do uso do f�rmaco. A melhor ferramenta preventiva que temos dispon�vel � a vacina, lembrando que ela basicamente evita contrair a covid e que se desenvolva um quadro grave. Infelizmente, a vacina n�o evita a pessoa de se infectar, mas o que est� sendo demonstrado em pa�ses com cobertura vacinal elevada � que, apesar de o n�mero de casos de covid aumentar, os vacinados n�o s�o os que evoluem para as formas mais graves.