
Desde beb�, a estudante paulista Beatriz Fernandes da Silva, hoje com 20 anos, precisa tomar cuidado para n�o cair e se machucar.
Quando ainda estava na barriga da m�e, os m�dicos perceberam algo diferente durante o ultrassom e alertaram que a crian�a poderia nascer com algum tipo de osteopenia ou at� nanismo.
Passado um m�s do seu nascimento, sua m�e foi troc�-la e com um simples movimento quebrou seu bra�o. Na �poca, seus pais correram para o hospital e chegaram at� ser questionados se a beb� estava sofrendo maus-tratos.
"O m�dico me perguntou e eu disse que n�o. Veio outro, olharam para ela e viram que o branco do olho dela era azul. Foi ent�o que descobriram a doen�a que ela tinha", relembra Shirlei Fernandes Serra, m�e de Beatriz.
Os m�dicos deram um diagn�stico de osteog�nese imperfeita, conhecida popularmente como "doen�a dos ossos de vidro". De origem gen�tica, a condi��o leva � fragilidade dos ossos, tendo como principais consequ�ncias fraturas e deformidades. Por causa disso, a estudante tem apenas 1,22 de altura e cal�a 32.
Tentando ser uma crian�a normal
Mesmo tendo algumas limita��es, Beatriz tentava levar uma vida normal como qualquer crian�a. "Eu era arteira. Me machucava muito, andava de skate e era uma crian�a doida", brinca a estudante.
Sua m�e conta que tinha cuidados, mas nada ao extremo. "Nunca privei ela e criei em uma redoma. At� andar de skate, andava. Ela pegou uma habilidade incr�vel no skate".

Ao longo de seu desenvolvimento vivenciou diversas dores e fraturas durante simples a��es do dia a dia. Ela conta que j� quebrou o dedo matando uma formiga, por exemplo. Outra vez caiu sentada e quebrou a perna em forma de S e o cotovelo ao tentar dar uma cambalhota. Nesta �ltima, precisou colocar um pino no membro.
Mas sua pior experi�ncia foi na escola, aos 12 anos de idade. Durante uma brincadeira no col�gio, um menino tentou beijar seu p�, virou e pegou sua perna esquerda. Ao fazer isso, ele quebrou o membro e, com o susto, Beatriz tamb�m fraturou o lado direito.
"Nessa �poca eu tinha uma haste na canela e quebrou t�o feio que entortou e precisou ser retirada. Na �poca, eu tinha tr�s hastes e agora tenho duas", relembra. Depois do acidente, ela precisou correr para o hospital e realizar uma cirurgia de urg�ncia.
O ocorrido rendeu traumas � estudante que abandonou a escola por quatro anos, comprometendo seus estudos. "Dava ansiedade de ir at� o col�gio. Fiquei quatros anos sem ir por causa disso. Eu chorava de todos os jeitos", conta � BBC News Brasil.
Por causa da pausa, ela mantinha uma rotina de cuidados em casa e demorou a querer voltar ao ambiente escolar. "Eu n�o gostava de estudar em casa, pois me lembrava do ocorrido. Eu n�o sabia escrever em letra de m�o com 14 anos de idade", lamenta.
Quando decidiu retornar aos estudos, precisou iniciar no ensino fundamental, mesmo sendo adolescente. Hoje, ela ainda cursa o segundo ano do ensino m�dio, no per�odo noturno.
Tratamento dif�cil e desgastante
Durante a inf�ncia, a paulista era acompanhada por profissionais do SUS (Sistema �nico de Sa�de) e fazia o tratamento com um rem�dio chamado pamidronato de s�dio, respons�vel por regular a quantidade de c�lcio no organismo. Ela precisava ir � Santa Casa, em S�o Paulo, a cada tr�s meses e usar a medica��o por cinco dias.
Ao longo da terapia, era submetida a retiradas de sangue e picadas frequentes na cabe�a. Segundo a estudante, o acompanhamento era muito doloroso e dif�cil. Por ser algo bem invasivo, a paulista conta que teve uma rea��o muito forte e faz oito anos que ela e sua m�e optaram por n�o seguir tratando dessa forma. "Minha m�e ficou com medo e resolveu parar. Mas hoje me sinto normal. Quando tenho alguma fratura mais grave, vou para o hospital", diz.
Al�m desse acompanhamento, ela tamb�m fazia procedimentos cir�rgicos quando tinha alguma fratura muito grave. "Ao todo, tenho dez cirurgias e minha m�e conta que j� sofri umas 100 fraturas", diz a estudante.
Quando come�ou a ficar mais velha, por volta dos 14 anos de idade, a quebra de ossos come�ou a diminuir e elaganhou mais qualidade de vida, conta a m�e da estudante. Atualmente, ela segue tendo apenas cuidados b�sicos como n�o andar em ch�o molhado e outros ambientes escorregadios para evitar quedas e fraturas severas.

Mesmo com uma estatura baixa, Beatriz conta que se vira bem em casa e "tira de letra" as tarefas dom�sticas. Contudo, quando precisa ir � escola e se locomover pelas ruas, sua maior dificuldade � a acessibilidade.
"Encontro o elevador quebrado e os motoristas n�o me ajudam a subir no �nibus. Uma vez um n�o parou e eu tive que fazer um boletim de ocorr�ncia. � um direito meu", opina. Para ajudar na caminhada, ela usa uma cadeira de rodas, j� que fica um pouco cansada e sente muitas dores nos p�s quando percorre grandes dist�ncias sem o uso do aparelho.
Ela afirma que at� hoje algumas pessoas e amigos se surpreendem com o fato de ela ser uma jovem normal. "Hoje em dia o capacitismo � bem forte, principalmente em rol�. Eu sou exemplo de supera��o. Algumas pessoas me parabenizam at� porque bebo".
Fen�meno nas redes sociais
Beatriz p�de falar ainda mais da "doen�a dos ossos de vidro" ao compartilhar v�deos na rede social Tik Tok. Com um engajamento surpreendente, a jovem teve um retorno positivo em poucos dias.
As postagens sobre a condi��o viralizaram rapidamente e hoje somente um v�deo j� conta com 1,1 milh�o de visualiza��es. Seus seguidores chegam a pouco mais de 100 mil seguidores.
Ela conta que n�o imaginava uma repercuss�o t�o positiva. A estudante brinca que tamb�m n�o esperava umas perguntas t�o curiosas. "Tinham d�vidas de como eu estalava o pesco�o e chegaram a perguntar se meus ossos eram de vidro mesmo", brinca.

A estudante n�o trabalha 100% com produ��o de conte�do, mas j� empreende na internet. Beatriz abriu uma loja online de roupas masculinas e tamb�m vende camisetas de times. Quando terminar o ensino m�dio, pretende seguir na �rea de audiovisual.
O que � osteog�nese imperfeita?
� uma doen�a de origem gen�tica, que ocorre por causa de um defeito nos genes respons�veis pela produ��o do col�geno tipo 1, provocando altera��es principalmente na forma��o dos ossos, dentina dos dentes, esclera nos olhos e dos ligamentos.
Assim como ocorreu com Beatriz, a crian�a j� pode nascer com a condi��o. Por�m, em alguns casos, o aparecimento pode surgir mais tarde, no per�odo perinatal.
"Pode apresentar fraturas no decorrer do primeiro ano de vida ou apenas ap�s o primeiro ano, o que caracteriza a menor ou maior gravidade da doen�a", destaca Daniel Ferreira Fernandes, m�dico ortopedista e professor do curso de Medicina da Pontif�cia Universidade Cat�lica do Paran� (PUCPR).
A condi��o pode ser dividida em 4 graus, sendo o mais grave o tipo 2, onde a crian�a pode sofrer les�es at� dentro do �tero da m�e. "Essa � forma letal e o beb� morre logo depois do parto ou algumas semanas depois", explica Adenor Israel de Oliveira, ortopedista do Hospital INC (Instituto de Neurologia e Cardiologia de Curitiba).

J� nos n�veis 3 e 4 ocorrem tra�os cl�ssicos de nanismo, como face triangular e baixa estatura. "O grau 3 � a segunda forma mais grave porque causa bastante encurvamento de membro e estes diminuem a resist�ncia mec�nica da pessoa. Geralmente s�o pessoas que precisam de tratamento pelo resto da vida", refor�a Oliveira, que tamb�m � membro da SBOP (Sociedade Brasileira de Ortopedia Pedi�trica).
Os ossos sempre v�o quebrar?
As fraturas podem ocorrer normalmente ap�s traumas considerados leves e podem gerar pouco inc�modo. No entanto, a dor cr�nica pode ocorrer pelas deformidades �sseas, que s�o sequelas dos ossos quebrados.
"Existem formas mais leves e tamb�m mais graves de apresenta��o da osteog�nese imperfeita. Quanto mais grave, maior a ocorr�ncia de fraturas e mais cedo a doen�a se manifesta", diz o ortopedista da PUCPR.
Na puberdade, por causa das altera��es hormonais, o risco de fraturas diminui. Mas reaparece nas mulheres ap�s a menopausa e nos homens depois dos 60 anos de idade.
Sintomas
O sintoma mais comum s�o dores cr�nicas, decorrentes das deformidades e fraturas �sseas. As carater�sticas principais da doen�a s�o a fragilidade �ssea, m� forma��o dent�ria, esclera dos olhos azulada e a frouxid�o generalizada dos ligamentos.
Na coluna vertebral, a altera��o na forma das v�rtebras leva a deformidades da regi�o da coluna tor�cica, como cifose (corcunda) e escoliose (coluna torta), que s�o agravadas pela osteoporose e fraturas nas v�rtebras. Segundo Fernandes, a perda da audi��o tamb�m pode ocorrer e atinge 50% dos indiv�duos.
Qual o tratamento da "doen�a dos ossos de vidro"?
O tratamento � multidisciplinar e envolve uma s�rie de profissionais especializados. O objetivo principal � obter o m�ximo poss�vel de fun��o dos membros, dando ao indiv�duo maior qualidade de vida e independ�ncia nas atividades di�rias.
O uso de medicamentos espec�ficos, que agem contra a osteoporose e inibem a reabsor��o �ssea, tamb�m fazem parte da terapia.
Como parte dos cuidados, h� ainda a preven��o de fraturas, est�mulo ao ortostatismo (ficar em p�), andar e fortalecimento muscular.
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