Pombos: a surpreendente intelig�ncia dos her�is de guerra tratados como praga urbana

Se voc� perguntar a algu�m por que determinado animal � seu favorito, a pessoa provavelmente vai falar sobre as coisas incr�veis que a criatura � capaz de fazer, mencionar suas caracter�sticas ou apar�ncia interessante.

Pouca gente citaria, no entanto, o pombo como seu animal favorito.

Muitos consideram estas aves como pragas, e n�o como vida selvagem.

O total desd�m das pessoas em rela��o aos pombos parte meu cora��o. Se voc� sentar em um parque na hora do almo�o, em qualquer lugar do mundo, � quase certo que testemunhar� pessoas crucificando os pombos.

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Vejo gente batendo os p�s no ch�o e dando chutes enquanto as aves passam entre suas pernas para pegar as migalhas que sobraram.

Mas pouca gente se pergunta por que h� pombos debaixo do banco onde est�o sentadas.

N�s trouxemos os pombos para nossas cidades, e ainda assim muitos de n�s os desprezam. Mas nem sempre foi assim: temos um longo e pr�spero relacionamento com o pobre pombo.

Os pombos urbanos s�o descendentes de pombos selvagens. N�s os domesticamos s�culos atr�s, para servir de alimento e por conta de sua capacidade de navega��o. Eles prosperam em nossas cidades porque nossos pr�dios altos e parapeitos de janela reproduzem seu habitat natural: cavernas e fal�sias. Nossos res�duos fornecem alimentos abundantes.

As pessoas ficam entusiasmadas com os pombos-correio, mas n�o h� muita diferen�a entre pombos-correio e pombos urbanos. Depende apenas se moram no pombal de algu�m como uma ave em cativeiro ou na pra�a da cidade.

Quem voc� est� chamando de desmiolado?

A capacidade de orienta��o dos pombos � lend�ria. Ainda estamos aprendendo sobre como estas aves s�o incr�veis. Elas s�o capazes de fazer contas matem�ticas b�sicas, no mesmo n�vel que os macacos, e podem distinguir palavras reais de palavras inventadas.

Os pombos-correio podem encontrar seu caminho usando o olfato, pontos de refer�ncia, o campo magn�tico da Terra e os infrassons (ondas sonoras com uma frequ�ncia baixa demais para ser captada pelo ouvido humano).

Tamb�m podem seguir uns aos outros e s�o capazes de aprender as rotas uns dos outros. Os pombos urbanos geralmente formam casais para a vida toda — e s�o pais muito atenciosos. Os adultos produzem um leite de papo, com o qual gentilmente alimentam seus filhotes.

Nosso fasc�nio por sua capacidade de orienta��o continua at� hoje — h� dezenas de milhares de corridas de pombos ao redor do mundo todos os anos. Os vencedores s�o vendidos por mais de £ 1 milh�o.

Problemas de imagem

Temos muito desd�m pelos pombos que vivem entre n�s em vilas e cidades. Mas n�o faz muito tempo, �ramos fascinados por essas criaturas.

Em meados do s�culo 19, os seres humanos apreciavam os pombos por sua boa apar�ncia. Durante este per�odo, surgiram muitas ra�as novas, incluindo o rabo-de-leque, jacobino, tumbler e barb.

Suas caracter�sticas exageradas atra�ram a aten��o de Charles Darwin. Ele era um aficionado por pombos e usou esse exemplo dram�tico de diversidade dentro de uma esp�cie para transmitir suas ideias sobre a sele��o natural em A Origem das Esp�cies.

� um pouco como se tiv�ssemos visto tantos pombos urbanos que j� n�o conseguimos apreciar suas penas de arco-�ris no pesco�o e corpos fofos e rechonchudos. Essas caracter�sticas seriam valorizadas em uma esp�cie rara.

Aves guerreiras

Os pombos urbanos s�o verdadeiros sobreviventes. Tendo passado muitas horas observando pombos no St James Park, em Londres, j� os vi cobertos de �leo, leite e v�mito humano. J� observei pombos sem uma pata, sem as duas patas e presos em peda�os de lixo. No entanto, eles seguem em frente.

Os pombos carecem da simpatia habitual em rela��o aos animais em perigo. Muitas pessoas me disseram que, longe de inspirar simpatia, as cicatrizes de batalha dos pombos s� aumentam sua antipatia: os p�ssaros parecem "desleixados".

Acredita-se que os pombos urbanos sejam propensos a perder as patas porque o cabelo humano e as redes se emaranham ao redor deles, cortando o fornecimento de sangue. Eles tamb�m podem ficar com os p�s presos em chicletes. Nosso lixo prejudica os pombos — e os tratamos com desprezo por sua apar�ncia.

Os pombos s�o alguns dos animais mais condecorados da hist�ria. Nada menos que 32 pombos ganharam a prestigiada Medalha Dickin, equivalente no mundo animal � Cruz Vit�ria (a mais alta condecora��o que o governo brit�nico concede aos seus militares por enfrentar o inimigo).

Os pombos-correio foram usados %u200B%u200Bintensivamente durante a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, para entregar mensagens vitais entre os batalh�es e voar com c�meras para miss�es de reconhecimento.

Talvez o pombo de guerra mais famoso seja Cher Ami, que em 1918 recebeu a medalha francesa Croix de Guerre, por entregar mensagens de um batalh�o cercado sob fogo pesado.

Cher Ami tinha sido baleado no peito, estava cego de um olho, e sua perna direita estava pendurada apenas por um tend�o no momento em que entregou suas mensagens.

Para muita gente, os pombos s�o alguns dos �nicos representantes da vida selvagem com os quais interagem regularmente. Estas aves interessantes vivem bem � nossa porta.

Da pr�xima vez que estiver ao ar livre, dedique aos pombos 30 segundos do seu tempo. Observe-os. Testemunhe suas intrincadas intera��es sociais e os momentos de ternura entre os casais enquanto limpam as penas um do outro e trazem material de nidifica��o como presentes.

No entanto, se voc� realmente n�o os quer por perto durante o almo�o, o melhor conselho �: n�o deixe cair restos de comida no ch�o.

*Steve Portugal � professor de biologia e fisiologia animal na Royal Holloway University of London, no Reino Unido.

Este artigo foi publicado originalmente no site de not�cias acad�micas The Conversation e republicado aqui sob uma licen�a Creative Commons. Leia aqui a vers�o original (em ingl�s).

- Este texto foi publicado originalmente em https://www.bbc.com/portuguese/geral-62715322

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