
meio da escrita que ela se mostrou mais vulner�vel, como revelam as cartas trocadas com o mineiro Fernando Sabino (1923-2004) entre 1946 e 1969. A amizade dos dois, registrada no livro Cartas perto do cora��o (Record, 2001), revela uma longa e profunda liga��o entre dois importantes escritores brasileiros.
Ainda assim, foi por DEDICAT�RIA
O primeiro contato de Fernando Sabino com Clarice Lispector ocorreu em 1944. Na ocasi�o, ele recebeu o primeiro livro dela, Perto do cora��o selvagem (1943), com dedicat�ria da autora. Entusiasmado, publicou uma resenha. Sabino tinha 20 anos, morava em Belo Horizonte e n�o conhecia Clarice pessoalmente.� �poca, ela morava em N�poles, na It�lia. Quando retornou ao Brasil, foi apresentada ao escritor mineiro por interm�dio de Rubem Braga (1913-1990). A partir da�, se estabeleceu uma amizade intensa que resistiu at� mesmo � dist�ncia. As cartas dela foram enviadas de Berna, na Su��a, e Washington, nos Estados Unidos, onde morou junto do marido diplomata, Maury Gurgel Valente. As de Fernando sa�ram do Rio de Janeiro e de Nova York.
Quando se conheceram, os dois eram autores iniciantes. Clarice tinha 23 anos e havia acabado de lan�ar seu romance de estreia. J� Fernando Sabino havia publicado em 1941, aos 17 anos, o primeiro livro, a colet�nea de contos Os grilos n�o cantam mais.
Nas cartas, Clarice revela uma s�rie de frustra��es por estar longe de casa, o que a leva a sentir falta da bagun�a e da efervesc�ncia do Rio de Janeiro.
“Berna � linda e calma, a vida cara e a gente feia; com a falta de carne, com o peixe, queijo, leite, gente neutra, termino mesmo dando um grito. Falta um dem�nio na cidade. N�o trabalho mais, Fernando. Passo os dias procurando enganar a minha ang�stia e procurando n�o fazer honrar a mim mesma”, desabafa Clarice ao amigo. Em outro trecho, revela: “A solid�o que sempre precisei me �, ao mesmo tempo, insuport�vel.”
No entanto, um dos principais motivos da afli��o da escritora era o sil�ncio em torno de seu segundo romance, O lustre (1946), qualificado por Oswald de Andrade (1890-1954) como “aterrorizante”. Para Fernando Sabino, amigo afetuoso, solid�rio e pragm�tico, o referido “sil�ncio” era “exagerado”.
As cartas estabelecem um di�logo livre. Clarice fala, por exemplo, da visita que fez �s pir�mides do Egito, reclamando do comportamento dos turistas: “O problema � sentir alguma coisa que n�o esteja prevista em um guia”, escreve ela.
A mudan�a para Washington foi positiva para a escritora, pois a cidade oferecia op��es culturais e contava com uma comunidade significativa de brasileiros. Apesar disso, a percep��o � bastante semelhante � que ela tinha sobre Berna: “� bonita segundo as v�rias leis da beleza que n�o s�o as minhas. Falta bagun�a aqui, e n�o compreendo cidade sem esta certa confus�o. Mas enfim, a cidade n�o � minha”.

EVOLU��O
A produ��o epistolar revela uma linha de evolu��o. No primeiro momento, dominam inquieta��es e ang�stias vagas. Mas, no decorrer da troca de correspond�ncias, cresce a preocupa��o dos dois escritores em rela��o �s suas pr�prias obras. As cartas revelam, portanto, uma amizade forjada na palavra.Prova disso � a presen�a do mineiro na vida de Clarice Lispector, o que n�o se limitou � troca de cartas. Fernando Sabino foi editor do romance A paix�o segundo G.H., obra-prima de Clarice publicada em 1968.
DE: CLARICE
PARA: FERNANDO
“Falta um dem�nio na cidade. N�o trabalho mais, Fernando. Passo os dias procurando enganar a minhaang�stia”
“Falta bagun�a aqui, e n�o compreendo cidade sem esta certa confus�o. Mas enfim, a cidade n�o � minha”

CARTAS PERTO DO CORA��O
• De Fernando Sabino e Clarice Lispector
• Record
• 208 p�ginas
• Pre�o m�dio: R$ 60