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Estado de Minas M�SICA

'Viver � melhor que sonhar' reconstitui o ex�lio de Belchior

Os jornalistas Chris Fuscaldo e Marcelo Bortoloti investigam por que o cantor e compositor se afastou da fam�lia, dos amigos e da carreira


12/01/2021 04:00 - atualizado 12/01/2021 08:49

O artista mineiro Fernando Pacheco e o retrato de Belchior pintado por ele (foto: Nina Pacheco/acervo )
O artista mineiro Fernando Pacheco e o retrato de Belchior pintado por ele (foto: Nina Pacheco/acervo )

"Ele estava com uma certa press�o e sem muita perspectiva profissional. Mas n�o imaginava que o que era uma coisa pequena iria se tornar algo enorme. Quanto mais tempo ele dava para ver o que ia fazer, ficava mais dif�cil voltar"

Chris Fuscaldo, jornalista


"Ano passado eu morri/ Mas este ano eu n�o morro.” Sampleado pelo rapper Emicida em AmarElo, faixa-t�tulo do �lbum lan�ado em 2019 e “hino” da virada 2020/2021, o refr�o da m�sica Sujeito de sorte define bem a saga de seu autor, o cearense Belchior. Tr�s anos depois de sua morte, o cantor e compositor est� mais presente do que nunca – seja nos fones de ouvidos dos jovens, nas prateleiras das livrarias e nas lembran�as de seus amigos mineiros.

Em 18 de janeiro, come�a a pr�-venda de Viver � melhor que sonhar – Os �ltimos caminhos de Belchior (Sonora Editora), dos jornalistas Chris Fuscaldo e Marcelo Bortoloti, por meio da plataformaBenfeitoria. O livro chega tr�s anos depois de Belchior – Apenas um rapaz latino-americano (Todavia), biografia assinada pelo rep�rter Jotab� Medeiros.

Fuscaldo e Bortoloti buscaram entender por que Belchior se afastou de amigos, familiares e da carreira a partir de 2007, mergulhando em um ex�lio volunt�rio por cerca de uma d�cada, “mist�rio” que deixou os f�s e o pa�s intrigados.

Depois de se envolver em situa��es familiares que culminaram no fim de seu casamento e de cometer erros estrat�gicos na condu��o da carreira, o m�sico deixou seu carro importado no estacionamento do aeroporto de Congonhas, em S�o Paulo, pegou um avi�o e tornou-se um n�made que passou por cidades do Brasil e do Uruguai.

Os autores de Viver � melhor que sonhar... percorrem os locais dessa peregrina��o. Chris Fuscaldi leu reportagem de Bortoloti, publicada em 2013 na revista �poca, sobre a nova vida do artista, morando de favor na casa de f�s no Rio Grande do Sul e procurado pela pol�cia pelo n�o pagamento de pens�o aliment�cia. A dupla decidiu se unir para encontrar o cantor.

Os planos mudaram quando veio a not�cia da morte de Belchior, em abril de 2017, devido ao rompimento da aorta. Os dois entrevistaram pessoas que abrigaram o cantor e Edna Assun��o de Araujo, conhecida como Edna Prometheu. Antes do ex�lio, ela havia se tornado companheira e empres�ria dele.

Os autores conclu�ram que o processo de desconex�o do artista com a fam�lia e a profiss�o foi gradual. Entrevistaram �ngela Henman, casada com ele por mais de 30 anos, e os filhos do casal, Camila e Mikael. “Era um grande pai e marido, m�sico com suas aus�ncias normais. Era mulherengo, mas �ngela tamb�m n�o ficava procurando saber disso”, afirma Fuscaldo.

A ruptura ocorreu quando Belchior contou � fam�lia que tinha duas filhas, de mulheres diferentes, fora do casamento. Em setembro de 2007, o div�rcio foi formalizado com a divis�o dos bens e o pagamento de pens�o aliment�cia a �ngela.

Em seu ex�lio, acompanhado de Edna, Belchior passou por v�rias cidades, deixando d�vidas em hot�is de S�o Paulo e Rio antes de ir para o Uruguai. Para Chris Fuscaldo, o que tinha a possibilidade de ser uma fase de recolhimento tornou-se permanente quando ele viu expostas sua intimidade e as d�vidas que contra�ra.

Viver � melhor que sonhar... traz momentos dram�ticos vividos pelo casal. Quando n�o quitou a pens�o devida a �ngela, o cantor teve as contas banc�rias bloqueadas por decis�o judicial. Sem dinheiro para pagar o hotel, ele e Edna passaram a noite debaixo da Ponte Internacional da Conc�rdia, liga��o entre Brasil e Uruguai.
Edna n�o foi localizada pelos autores, mas Fuscaldo a isenta de ser a vil� da hist�ria. “� cruel dizer que tudo foi arquitetado por ela, porque Belchior teve muitas oportunidades de voltar, de gente que lhe estendeu a m�o, mas ele n�o quis”, diz a jornalista.
Nanquim assinado por Belchior, presente para Fernando Pacheco(foto: Belchior/reprodução)
Nanquim assinado por Belchior, presente para Fernando Pacheco (foto: Belchior/reprodu��o)

"Form�vamos uma dupla bem-humorada, eu ria muito quando ele dizia ter voz de jegue"

Gilvan de Oliveira, m�sico


MINAS  

Antes de seu ex�lio, Belchior fez muitos amigos em BH. O produtor Jackson Martins o conheceu em 2000, quando o cearense participou do programa Arruma��o, de Saulo Laranjeira. “Como ele veio sozinho, chamei o guitarrista Alfredo Piula para acompanh�-lo. Conversamos no camarim e ele me convidou para empresari�-lo. Eu j� trabalhava com Paulinho Pedra Azul, Tunai, Z� Geraldo, Tadeu Franco e o pr�prio Saulo. Fizemos v�rias apresenta��es no estilo voz e viol�o com ele e Piula.”

Belchior se animou com a ideia de turn� solo proposta por Martins, mas alegou que n�o tocava viol�o h� tempos. “Foi embora, mas me ligou dali a dois anos dizendo que estava pronto. Passou aquele tempo todo ensaiando, preparando o show de voz e viol�o”, relembra o produtor.

Martins marcou dois shows no Minascentro. “Lotou, tivemos de fazer sess�es extras. A partir dali, marquei shows pelo interior mineiro. Todos foram sucesso de bilheteria. Belchior foi um pai para mim”, conta Jackson.

O empres�rio sugeriu ao cantor trabalhar com violonistas convidados – Sergio Zurawski e o mineiro Gilvan de Oliveira. F� do cearense, Gilvan conhecia bem o repert�rio dele. Os dois gravaram o disco Um concerto a palo seco, lan�ado pela gravadora mineira Bemol em 1999.
“Produzi o �ltimo show dele, em 2007, na cidade capixaba de Colatina. Ele me pediu para n�o marcar mais datas, pois queria sair de cena e se dedicar � tradu��o de A divina com�dia, de Dante. Chamava esse retiro de �cio criativo”, revela Jackson Martins.

Gilvan de Oliveira acompanhou Belchior de 1994 at� o in�cio de 2005. “Chegamos a fazer mais de 200 shows, um trabalho que me deixou muito feliz. Era uma pessoa culta. Durante as viagens, fal�vamos sobre literatura, m�sica, filosofia, gastronomia e cinema. Ele viajava sempre com uma mala de livros”, conta o violonista. “O que me chamava a aten��o � que ele atendia todos os f�s. Tinha uma paci�ncia que n�o vi em nenhum artista. Autografava para todos.”

Gilvan explica que o t�tulo do disco dos dois, Um concerto a palo seco, remete ao canto a capella. “Gravamos somente m�sicas dele. Form�vamos uma dupla bem-humorada, eu ria muito quando ele dizia ter voz de jegue.”

PINTURA

O pintor mineiro Fernando Pacheco destaca que Belchior adorava artes pl�sticas. “Ele desenhava muito. Quando descobriu o meu trabalho, 'pirou' e fez quest�o de me conhecer. Foi � minha casa e separou algumas pequenas pinturas. Pediu-me para acompanh�-lo ao hotel. Chegando l�, apareceu com um saco de pano na m�o e me entregou, explicando que era o pagamento.”

Quando Pacheco e a mulher, Nina, abriram o saco, perceberam que l� dentro havia dinheiro. “Era a bilheteria de um show que ele havia acabado de fazer. Nina at� chorou de emo��o. Naquele dia, come�ou a nossa amizade com o Bel”, conta o pintor.

Belchior convidou Pacheco para ir a S�o Paulo, para ajud�-lo a selecionar quadros para sua exposi��o no foyer do Teatro Brasileiro de Com�dia (TBC). “Separei desenhos, retratos de m�sicos e poetas. Outros eram naturezas-mortas e ilustra��es de A divina com�dia. A exposi��o foi um sucesso.”

Quando vinha a BH, Belchior visitava o casal. “Ele pegava o viol�o e come�ava a cantar, com aquele vozeir�o. Logo os vizinhos iam aparecendo para ouvi-lo.”

Outro amigo, o produtor e m�sico carioca Vin�cius S�, se lembra do carinho de Belchior. Os dois se conheceram em 1995, no Rio de Janeiro, onde o cantor fazia turn�. “Disse a ele que queria gravar um disco daquele show. Fizemos o CD Um concerto b�rbaro e fui tocar com ele no ano seguinte. Participei da segunda temporada do Belchior nos EUA. Foram 23 shows em 35 dias.”

Na �ltima apresenta��o em Nova York, v�spera de Natal, veio uma tempestade de neve. “Resultado: na casa s� tinha um casal e um b�bado, al�m de cozinheiros, gar�ons e seguran�as. Fizemos o show mesmo assim”, relembra Vin�cius S�. (Com Estad�o Conte�do)
O violonista Gilvan de Oliveira acompanhou Belchior de 1994 a 2005(foto: Arquivo pessoal )
O violonista Gilvan de Oliveira acompanhou Belchior de 1994 a 2005 (foto: Arquivo pessoal )

"Ele pegava o viol�o e come�ava a cantar, com aquele vozeir�o. Logo os vizinhos iam aparecendo para ouvi-lo"

Fernando Pacheco, pintor



Um cara � frente de seu tempo

“Conheci Belchior em 2002, quando ele se apresentou na extinta Tr�s Lobos. Minha banda, Route66, abriu o show dele. Conversamos sobre diversos assuntos. Ele gostou demais e at� nos convidou para gravar um CD na gravadora dele, a Camerati, o que n�o chegamos a fazer. Dei-lhe um disco, ele gostou do repert�rio e ficou lendo a ficha t�cnica por v�rios minutos.

Passados uns quatro meses, Belchior retornou � cidade. Nos encontramos na Savassi, ele me chamou pelo nome, perguntou sobre o jornal, a banda e os filhos. Disse que o nosso CD era um de seus �lbuns de cabeceira. Perguntei-lhe o que havia achado do disco. Para meu espanto, citou v�rias faixas – na ordem, inclusive –, fato que me deixou emocionado.

Al�m de admir�-lo como grande artista, sua intelig�ncia, educa��o e mem�ria chamaram a minha aten��o. Posteriormente, fiz algumas entrevistas com ele, foram �timas conversas. Era um 
cara � frente de seu tempo.”  

VIVER � MELHOR QUE SONHAR
Os �ltimos caminhos de Belchior
De Chris Fuscaldo e Marcelo Bortoloti
Sonora Editora
Pr�-venda a partir de segunda-feira (18/1), por meio da Benfeitoria (https://benfei.to/belchior)


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