H� mais de 450 anos, no ver�o de 1564, a pandemia da peste bub�nica atingiu a Europa. Naquela �poca, assim como n�s, os moradores precisaram manter o distanciamento social e ficar em casa para evitar a propaga��o da doen�a.
Alguns anos depois, em 1606, a peste bub�nica chegou a Londres. Shakespeare foi uma das pessoas que ficaram “quarentenada” e este processo mudou tanto sua personalidade quanto sua arte.
Conforme o artigo “Shakespeare in lockdown: did he write King Lear in plague quarantine?” (Shakespeare em lockdown: ele escreveu ‘Rei Lear’ durante a quarentena da praga?, em tradu��o do ingl�s), publicado pelo jornalista Andrew Dickson no The Guardian, os teatros foram os primeiros neg�cios a fechar as portas durante a pandemia.
Todos os envolvidos na arte, como os atores e o pr�prio Shakespeare, precisaram parar as atividades logo no in�cio da “peste”. O artigo explica que na �poca havia a cren�a de que toda a desgra�a veio ao mundo como um castigo por causa “dos pecados, que eram praticados por grupos de teatro”.
Ali�s, Dickson cita que um pregador criou uma frase para explicar a “puni��o divina”: “a causa das pestes � o pecado, e a causa do pecado as pe�as".
Assim, os teatros ficaram fechados por cerca de 78 meses, entre 1603 e 1613. Neste tempo, como estava em casa e sem trabalho presencial, Shakespeare investiu o tempo escrevendo pe�as de teatro.
As obras do autor deste per�odo s�o consideradas, pelos estudiosos de Shakespeare, sua “era mais madura”, visto que n�o h� a presen�a do divino e o universo das pe�as � um cosmos sem deuses ou interfer�ncias m�gicas. Para o jornalista Andrew Dickson, as epidemias que ocorreram durante a vida de Shakespeare foram respons�veis pelos seus melhores trabalhos: Rei Lear, Romeu e Julieta, Hamlet, Macbeth e Ant�nio e Cle�patra.
A pe�a Rei Lear foi escrita durante a pandemia da peste bub�nica e se tornou uma das suas obras mais marcantes. O enredo �, essencialmente, um drama familiar e difere bastante de outras hist�rias do autor, como Sonhos de Uma Noite de Ver�o, que foi escrita antes.
A trag�dia narra a hist�ria do idoso rei da Bretanha, que decide dividir o reino entre suas tr�s filhas: Goneril, Regan e a sua favorita, Cord�lia. Para calcular a partilha, pede �s filhas que expressem a gratid�o e o amor que sentem por ele.
Enquanto Goneril e Regan dizem que amam o pai mais que qualquer coisa no mundo, Cord�lia afirma que o ama “como corresponde a uma filha, nada mais, nada menos”. Irritado com essa resposta, Lear a deserda e a expulsa do reino.
A partir deste ponto, “Rei Lear” relata a viol�ncia e a crueldade humana de forma expl�cita, com cenas que podem ser desconfort�veis de ler. Apesar de hoje ser aclamada pela brutalidade do enredo, a pe�a foi revisada para um p�blico que n�o gostava do seu “final terr�vel”, durante a restaura��o dos Stuarts para a monarquia inglesa, por volta de 1660.
Al�m da aclama��o de cr�tica, a pe�a inspirou v�rias outras artes, inclusive filmes, como Terras Perdidas, que tem Jessica Lange, atriz da s�rie American Horror Story, como uma das protagonistas.
* Estagi�ria sob supervis�o da subeditora Ellen Cristie.