Em seu livro de estreia, Clarissa Menicucci re�ne 12 contos sobre personagens que se sentem desencaixados no mundo (foto: Newton Ulh�a/Divulga��o)
Personagens desencaixados, que refletem uma condi��o da pr�pria autora, que, por sua vez, encontra na cria��o desses personagens uma forma de organizar e dar sentido � vida. Assim pode ser definido, em poucas palavras, o rec�m-lan�ado livro “Contos de fuga”, que marca a estreia de Clarissa Menicucci na literatura.
A obra, cuja escrita foi impulsionada pela pandemia e pelas experi�ncias que ela proporcionou nos �ltimos dois anos, re�ne 12 narrativas curtas, distintas entre si, mas com este elemento em comum: os personagens fora de esquadro.
Clarissa diz que a escrita sempre a acompanhou, desde a adolesc�ncia, quando j� compunha poemas e contos. Jornalista que trabalha com produ��o de conte�do, ela conta que os textos sempre estiveram presentes em sua vida profissional e pessoal, mas nunca de uma forma organizada, que pudesse, por exemplo, gerar um livro.
“Sempre tive que trabalhar muito, virei m�e, tenho dois filhos, e 2020 foi um ano completamente at�pico. Eu vinha trabalhando na �rea cultural, que sofreu muito, e fui demitida, me vi dentro de casa com duas crian�as pequenas em meio a essa distopia que � a atual realidade brasileira, essa coisa pesada, dif�cil de digerir”, diz.
Ela destaca que, em meio a tantas adversidades, foi gra�as � literatura que conseguiu organizar a vida pessoal. “Eu me entreguei � literatura de uma forma ampla, li muito, alfabetizei minha filha e escrevi loucamente”, conta. Durante um ano, ela tamb�m participou de um curso de escrita criativa, onde se produziam e se compartilhavam textos.
ANTOLOGIA
Clarissa j� tinha publicado um conto em uma antologia, intitulada “Conta gotas”, organizada pelo escritor paulista Tiago Novais e lan�ada em 2020, e diz que esse seu primeiro livro individual � fruto da “coragem” que teve para se colocar como escritora. Ela explica que o t�tulo alude precisamente a uma tentativa de escape de um cen�rio conjuntural t�o adverso.
“Vem de uma necessidade que tive de sobrevoar um pouco a realidade do Brasil e falar de outras coisas. Gosto de pensar na fuga como possibilidade de encontro tamb�m. Quando a gente foge de algo com que n�o consegue criar v�nculo de identifica��o, a gente est� buscando se encontrar com alguma outra coisa. Essa realidade agressiva do Brasil de hoje, sem sentimentos humanos b�sicos, eu quis sobrevoar isso e me encontrar em outros sentimentos e outras possibilidades. A escrita tem esse papel para mim”, diz ela.
Sobre a caracter�stica comum aos personagens de seus textos, ela diz: “Sempre achei que as pessoas que se sentem encaixadas no mundo ou s�o loucas ou s� desinteressantes. O desencaixe � inerente ao ser humano. Tenho desconfian�a de quem est� plenamente encaixado, n�o tem ang�stias. Eu tenho, e a escrita � uma tentativa de elaborar isso. Meus personagens refletem essa condi��o, esse desencaixe num mundo que n�o � confort�vel para quem pensa muito”, diz.
Segundo a autora, as fontes de inspira��o para cada um dos 12 contos se equilibram entre a observa��o e a reflex�o, se relacionam tanto a fatores externos quanto a inquieta��es internas. Ela aponta que alguns contos s�o relatos �ntimos de situa��es que viveu, ao passo que outros giram em torno de personagens constru�dos a partir de pessoas reais. As institui��es p�blicas, como a que trabalhou, s�o, conforme ressalta, �timos ambientes para a cria��o de hist�rias, porque s�o um mundo de personagens poss�veis.
“Tem um conto no livro, ‘A tabela perfeita’, que fala sobre esse burocrata-padr�o das institui��es p�blicas, que fica t�o preso �s normas e padr�es que acaba se deslocando do sentido humano e social que justifica a exist�ncia da institui��o p�blica. Ele vira uma tabela de or�amentos, se preocupa mais com isso do que com a realidade”, aponta. “E v�rios dos contos trazem um ponto de vista mais feminino mesmo, porque o mundo j� tem pontos de vista masculinos demais.”
Agora que se lan�ou no universo da literatura, Clarissa diz que tomou gosto e pretende seguir adiante. Ela j� tem engatilhado um livro infantil, intitulado “Meu primo gigante”, para ser lan�ado no primeiro semestre do pr�ximo ano, pela Crivo Editorial. “A maternidade � um neg�cio muito forte na minha vida, e acho que a gente se aproximou mais dos filhos nesse per�odo de pandemia. Acabo misturando minha vida com minhas hist�rias”, afirma.
Sobre o enredo de sua pr�xima obra, ela conta que, quando engravidou do segundo filho, a mais velha ficou com muito ci�me e criou um amigo imagin�rio, que era um gigante. “Ela parou de falar com a gente e ficava s� conversando com esse amigo imagin�rio gigante durante toda a minha gravidez. E ela era tratada por ele como uma bebezinha, porque queria manter esse posto. Escrevi ‘Meu primo gigante’ a partir disso, com toda a fantasia de um livro infantil”, diz, destacando que as ilustra��es s�o de Newton Pimentel de Ulh�a.
