
O ator Gabriel Leone, de 28 anos, sempre viu nas artes a forma��o de identidade cultural e, por extens�o, um fator transformador da sociedade. Por�m, foi no auge da pandemia que, entre momentos inst�veis, com muito tempo e de m�os atadas para o trabalho, ele ampliou essa percep��o.
“A m�sica segurou muito minha onda. Sou m�sico, estudo e pesquiso m�sica h� muito tempo. At� mesmo o fato de compor segurou as pontas”, revela.
“Bras�lia � personagem muito recorrente na vida da Legi�o Urbana”, observa o fan�tico pela banda de Renato Russo. Nesta entrevista, Leone revela como ocorreu o seu “mergulho” na cidade, que n�o deixa de ser personagem do longa estrelado por ele e Alice Braga.
Voltando � m�sica – mote do filme –, Gabriel j� interpretou Roberto Carlos (no longa “Minha fama de mau”, de Lui Farias) e Cazuza (numa pe�a na escola). Tamb�m usou seus dotes musicais nas pe�as “Aladin”, “Gota d'�gua” e “Os miser�veis”.
“Formei banda com amigos, estudei canto, sou autodidata ao viol�o e piano. Ali�s, o meu nome � Gabriel por causa de uma m�sica do Beto Guedes”, revela.
"Ficou clara a import�ncia da cultura e da arte para a gente. A possibilidade de algu�m ficar inst�vel emocional, psicol�gica e financeiramente, ao longo da pandemia, � gigantesca"
Gabriel Leone. ator
Como voc� incorporou o Eduardo na tela?
A caracteriza��o foi fundamental para mim: eu vinha de “Onde nascem os fortes”, s�rie que tinha hist�ria passada no sert�o, e meu personagem pediu um preparo f�sico com outra realidade. Um m�s depois, estava na Bras�lia dos anos 1980, fazendo um menino de 16 anos. O cabelo que uso no filme � mega hair. E tinha o aparelho nos dentes. Colocamos espinhas na cara. Usamos fotos minhas aos 16 anos para chegar � ideia do Eduardo. Com o filme, tive flashes de mim mais novo.
Qual � o seu olhar sobre Bras�lia?
Durante muito tempo, n�o tinha olhar pol�tico em cima de Bras�lia. Veio a intera��o das coisas e a consci�ncia pol�tica. O pol�tico � t�o presente no nosso dia a dia que � dif�cil dissociar. Acho bonito o Ren�, sendo de Bras�lia, ter escolhido fazer o filme “Eduardo e M�nica” na cidade com o intuito de mudar a vis�o de que Bras�lia s� se resume � pol�tica. Quantas m�sicas da MPB n�o citam o c�u de Bras�lia?! � uma cidade muito interessante de ser filmada, tem uma luz muito interessante. Filmamos na Chapada dos Veadeiros, que tamb�m � linda! Al�m de tudo, Bras�lia � o cen�rio da vida deles e da obra da Legi�o Urbana. Bras�lia � personagem muito recorrente na vida da Legi�o Urbana. Esse mergulho na cidade foi muito importante.
Qual � a “saudade no ver�o” do Gabriel Leone?
Da Alice Braga. Foi um processo de muita generosidade, de muita entrega, de muita parceria. Nisso, me bate muita saudade. A m�sica � bem centrada na rela��o dos dois. Em cena e fora de cena, tivemos um conv�vio di�rio intenso – criamos arte juntos. Sinto muitas saudades, at� porque ela mora nos Estados Unidos.
Voc� cr� ter voz ativa junto ao p�blico?
Sou muito discreto. Atores experientes me deram toques importantes, desde muito cedo, sobre como lidar com a exposi��o natural que vem do trabalho. Objetos de arte trazem milh�es de interpreta��es poss�veis e rea��es diferentes. Acho importante deixar sempre minha vida pessoal para mim. Ela diz respeito a mim e �s pessoas que fazem parte dela: minha namorada, minha fam�lia, etc. Quanto � nossa voz como fator de transforma��o, o trabalho em si traz esse componente. Nisso h� a carga pol�tica absurda. Figuras p�blicas, �s vezes, com as redes sociais, atingem pessoas com reflex�o e di�logo, tudo distanciado do teor de justi�amento e de tribunal presente nas redes, e com os quais n�o compactuo.
Onde voc� buscou a inoc�ncia e a pureza do Eduardo?
Quando filmei, estava com 25 anos. O personagem tem 16. Al�m do desafio, a composi��o trouxe um dos momentos mais divertidos da minha vida. Foi a investiga��o de trazer � tona no meu corpo as minhas mem�rias de energia. Tivemos tempo de prepara��o at� mesmo em Bras�lia. A bicicleta do personagem ficou comigo, ent�o ficava circulando com ela. Vivi um pouco da experi�ncia do jovem dos anos 80 (o filme se passa em 1986), sem internet e celular. O contraponto com a Alice (Braga) foi muito fundamental para mim. Constru�mos lados aparentemente opostos, mas, na verdade, complementares.
"Eduardo e M�nica' est� entre os filmes de que me orgulho muito de ter feito. Em meio a momentos muito tristes e dif�ceis, o filme � solar"
Gabriel Leone, ator
No filme, voc� solta a voz com um sucesso internacional divertido, “Total eclipse of the heart”, de Bonnie Tyler (risos). Como foi isso? Qual � a sua rela��o com as m�sicas da Legi�o?
Sou muito f� da Legi�o. Como dizem, sou legion�rio. Sou fan�tico: � a minha banda de rock nacional favorita. Meu pai tem a cole��o de discos completa. O Renato, por meio das letras das m�sicas, sempre foi o cara que mais me emocionou. Bonnie Tyler ajuda a reconstruir esses anos 80: h� pontos de refer�ncia, pistas que s�o dadas sobre o Eduardo e a M�nica. Por mais tempo que a m�sica tenha, d� apenas para pincelar algumas caracter�sticas.
O filme mudou muito a can��o?
Com o longa, as coisas tiveram de ser aprofundadas. O “gostar de novelas” (verso da can��o a respeito de Eduardo) aparece quando se colocam trilhas sonoras de novelas da �poca. Obviamente, ele gostava muito de ouvir r�dio tamb�m. Aquele clipe extravagante da Bonnie Tyler � um �cone nesse universo. Amo a Bonnie Tyler e essa m�sica. Foi bom ter me arriscado no “embromation”, com os fonemas cantados do jeito que se ouve (risos).
Um filme solar chega em meio � pandemia... Como � isso?
A pandemia frustrou expectativas de lan�amento criadas. “Eduardo e M�nica” est� entre os filmes de que me orgulho muito de ter feito. Em meio a momentos muito tristes e dif�ceis, o filme � solar e j� existe no imagin�rio das pessoas. Para al�m de compreender a ess�ncia da m�sica, � um bom filme. As pessoas v�o se divertir e se entreter. O filme tem lados muito bonitos, rom�nticos.
Como voc� experimenta a conviv�ncia entre arte e pandemia?
Mais do que nunca, ficou clara a import�ncia da cultura e da arte para a gente. A possibilidade de algu�m ficar inst�vel emocional, psicol�gica e financeiramente, ao longo da pandemia, � gigantesca. O v�rus � um v�rus democr�tico, que pega todo mundo. A arte, ao longo do tempo, sempre esteve presente: fosse com m�sicas, livros ou filmes para acompanhar a gente e fazer a gente refletir e espairecer. � muito triste testemunhar que, no meio disso tudo, exista um governo que bate tanto na cultura, na arte e nos artistas. Um governo que luta contra, que destruiu o Minist�rio da Cultura como uma de suas primeiras medidas.
Quais s�o os seus futuros projetos?
Estou num momento muito bacana. Nos �ltimos tr�s anos, fiz trabalhos que n�o foram lan�ados. Em 2022, terei tr�s filmes que j� foram vistos no �ltimo Festival do Rio. “Meu �lbum de amores”, do (diretor) Rafael Gomes, com m�sicas do Odair Jos� e Arnaldo Antunes – eu canto essas m�sicas! “Alem�o 2”, do Jos� Eduardo Belmonte. “Cidade ilhada”, do S�rgio Machado, baseado em texto do Milton Hatoum. E “Duetto”, do Vicente Amorim, coprodu��o com a It�lia. Filme enquanto n�o estreia, n�o existe. Meus amigos, enquanto n�o viram, achavam que todos esses filmes eram lendas (risos). Al�m de estar no ar com a novela das nove (“Um lugar ao sol”, Globo), h� a segunda temporada do “Dom” (s�rie da Amazon Prime), com previs�o de lan�amento para o ano. Pedro Machado Lomba Neto, da s�rie “Dom”, era um carioca que assaltava locais de luxo. Dependente qu�mico, a hist�ria dele � tr�gica, morreu muito cedo.
GABRIEL, O CAMALE�O



