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Estado de Minas CLIQUES DO BRASIL

Site Testemunha Ocular faz invent�rio vivo do fotojornalismo brasileiro

Iniciativa do Instituto Moreira Salles tem duas se��es fixas com imagens hist�ricas; demais conte�dos ser�o atualizados periodicamente


04/06/2022 04:00 - atualizado 03/06/2022 22:05

Sentados lado a lado, de costas para a lente, vestindo bermudas, sem camisa e com cabelo quase raspado, dois garotos observam, a partir do morro, a vista de Copacabana
Jos� Medeiros, que atuou na revista O Cruzeiro, � um dos fot�grafos cujo acervo pertence ao IMS e ter� presen�a permanente no site. Acima, imagem de favela em Copacabana, feita em 1949 (foto: Jos� Medeiros / divulga��o )

O Instituto Moreira Salles (IMS) lan�ou nesta semana o site Testemunha Ocular, que apresenta um panorama de um s�culo de fotojornalismo no Brasil. O portal apresenta a produ��o e a carreira de fot�grafos de diferentes gera��es e regi�es do pa�s. 

Tamb�m inclui dossi�s, ensaios cr�ticos, depoimentos em v�deo, al�m de outros materiais que ressaltam a import�ncia da atividade na documenta��o da realidade brasileira e na constru��o da mem�ria nacional.

A concep��o do projeto � do jornalista Fl�vio Pinheiro, que atuou como superintendente-executivo do IMS entre 2008 e 2020. O jornalista Mauro Ventura assina a edi��o do site, e o fot�grafo Leo Aversa, por sua vez, foi respons�vel pela edi��o de imagens durante a cria��o do projeto.

Pinheiro diz que come�ou a trabalhar na constru��o de Testemunha Ocular h� cerca de um ano e meio, mas que sua concep��o remonta a 2016. Ele explica que, naquele ano, o IMS adquiriu os acervos dos jornais do grupo Di�rios Associados no Rio de Janeiro – Di�rio da Noite, O Jornal, que encerraram suas atividades na d�cada de 1970, e Di�rio do Com�rcio, que seguiu at� 2016.

“Era um conjunto de mais de 900 mil imagens. Isso, somado �s cole��es de fotos autorais que o IMS tinha, dava robustez ao acervo de fotojornalismo do Instituto”, aponta, justificando o mote para a cria��o do site.

Sentado num banco no passeio, Cartola posa para a foto, tendo atrás de si Dona Zica à janela verde na casa pintada de rosa, com o violão apoiado à parede
O cantor e compositor Cartola e Dona Zica posam para a lente de Walter Firmo, no Rio de Janeiro, em 1974 (foto: Walter Firmo/Divulga��o )
O portal tem como ponto de partida a forte presen�a do fotojornalismo no acervo do IMS, mas vai muito al�m, segundo Pinheiro, na medida em que tamb�m aborda a obra de outros profissionais, al�m de diferentes assuntos relacionados � �rea. “Achei que n�o deveria se esgotar como site s� do acervo do Instituto. Criou-se, ent�o, uma se��o para fot�grafos convidados, e a� come�ou um processo que levou ao convite de outros 44 profissionais”, aponta.

Acervos do IMS

Dessa forma, Testemunha Ocular est� dividido em seis se��es. A primeira apresenta a produ��o e a trajet�ria dos fotojornalistas cujos acervos est�o sob a guarda do IMS. Inicialmente, est�o presentes seis nomes: Jos� Medeiros, Luciano Carneiro e Henri Ballot, todos profissionais que pertenceram aos quadros da revista O Cruzeiro, e mais Evandro Teixeira, Custodio Coimbra e Walter Firmo. Para cada um, h� uma p�gina no site contendo sua biografia, uma amostra de 50 imagens e dossi�s bibliogr�ficos.

J� a se��o seguinte traz o trabalho dos 44 fotojornalistas convidados de diversas regi�es do Brasil, com idades, trajet�rias e perspectivas distintas, que n�o integram o acervo do IMS. A sele��o inclui dois nomes da imprensa brasileira que faleceram neste ano: Orlando Brito, que atuou por mais de cinco d�cadas registrando o cotidiano do poder em Bras�lia, e Erno Schneider, conhecido especialmente pela popular foto de J�nio Quadros com as pernas enroscadas.

“Minha primeira preocupa��o foi trazer os veteranos, que tiveram carreiras muito longas e muito produtivas, autores de �cones do fotojornalismo no Brasil com os quais nem sempre s�o identificados. Todo mundo reproduz de forma exponencial a imagem do J�nio trocando as pernas e pouca gente sabe que ela � do Erno. Era uma quest�o de fazer justi�a a esses fot�grafos”, ressalta Pinheiro, elencando outros veteranos, como Ricardo Chaves, Reginaldo Manente e Jorge Ara�jo.

Gera��es distintas

Ele explica que, a partir desses veteranos, outros nomes come�aram a vir � baila, por meio de sugest�es e indica��es. Foi, conforme destaca, um processo natural, sem uma sele��o curatorial. 

“Houve um momento em que sa�mos dos veteranos para chegar � gera��o logo abaixo deles, com gente que hoje est� na casa dos 50 ou 60 anos, e acabamos nos mais jovens, como Gabriela Bil� e Isis Medeiros, que � de Minas e fez uma cobertura not�vel do rompimento da barragem em Brumadinho. A coisa foi indo em cascata, com as sugest�es chegando e eu fazendo os contatos e os convites”, aponta.

Ele chama a aten��o para o fato de que, entre esses 44 nomes, h� profissionais de diferentes estados, incluindo o ga�cho Ricardo Chaves, as pernambucanas H�lia Scheppa e Ana Ara�jo e o baiano Renan Benedito, entre outros. Todos os contemplados t�m uma p�gina no site com a biografia e uma sele��o de 20 imagens. Pinheiro pontua que a escolha das fotos destinadas ao site ficou a cargo de cada fot�grafo.

“N�o interferimos nisso. Para fot�grafos com produ��o muito vasta, com milhares de imagens, das quais t�nhamos que selecionar 20, fomos fazendo uma peneira conjunta. Teve fot�grafo que enviou 62 imagens, mas eu somente argumentava; a decis�o soberana foi de cada um dos participantes”, afirma.

Barcos de diversas cores imóveis em trecho assoreado da Praia das Pedrinhas, em São Gonçalo, no Rio de Janeiro, em 2014
Cust�dio Coimbra � um dos fot�grafos que t�m p�gina pr�pria no site, com 50 imagens expostas. Acima, barcos em trecho assoreado da Praia das Pedrinhas, em S�o Gon�alo, no Rio de Janeiro, em 2014 (foto: Cust�dio Coimbra/ divulga��o)

Fotos hist�ricas

Outro destaque de Testemunha Ocular � a se��o dedicada a fotos hist�ricas provenientes do acervo dos Di�rios Associados e de outras cole��es do IMS. Cada postagem desse n�cleo traz um conjunto de imagens junto com um texto de contextualiza��o. O site inaugura com a s�rie de registros do inc�ndio que destruiu a favela da Praia do Pinto, em 1969, no Bairro do Leblon, no Rio de Janeiro.

O site publica, ainda, coment�rios cr�ticos sobre determinadas fotos, assinados por acad�micos e escritores. O jornalista M�rio Magalh�es, por exemplo, comenta uma imagem feita em 1976 por Orlando Brito, que registra um tenente do Ex�rcito envergando uma bra�adeira com a inscri��o “Imprensa”.

A historiadora Yna� Lopes dos Santos, por sua vez, assina um texto sobre uma foto de Luiz Morier realizada em 1982, durante uma batida policial em que homens negros foram amarrados pelo pesco�o.

Com rela��o a essa se��o, Pinheiro diz que, para alguns autores, ofereceu imagens; j� outros chegaram com suas pr�prias sugest�es. “Nesse primeiro momento tem mais coisas provocadas pelo site. A ideia era ter imagens que carregam muitos significados e precisam de uma contextualiza��o cr�tica sobre o que d� a elas perenidade”, explica.

Coment�rios cr�ticos

“Voc� pega a foto dos homens negros amarrados pelo pesco�o, feita em 1982, quase 100 anos ap�s a aboli��o da escravatura, e v� o cen�rio hoje, com o que fizeram com o Genivaldo (morto em Sergipe, asfixiado em uma c�mara de g�s improvisada na traseira de um cambur�o, numa abordagem da Pol�tica Rodovi�ria Federal), a coisa n�o mudou muito. Que aboli��o foi essa que houve? Quisemos fazer coment�rios cr�ticos mais � luz da hist�ria ou pelo vi�s de uma antropologia social brasileira”, observa.

Testemunha Ocular traz, tamb�m, conte�do em v�deo. Na se��o intitulada Relance, profissionais contam a hist�ria de uma imagem que marcou sua carreira. O fot�grafo Jos� Francisco Diorio, por exemplo, comenta a foto de um inc�ndio na favela do Buraco Quente, em S�o Paulo, que realizou para o jornal O Estado de S. Paulo, em 2004, e que lhe rendeu pr�mio do World Press Photo. J� o n�cleo Vida Longa traz depoimentos de fotojornalistas sobre suas carreiras, come�ando com o de Evandro Teixeira.

Pinheiro observa que, das seis se��es que comp�em o site, apenas duas s�o fixas: a dos fot�grafos do IMS, com as 50 imagens de cada um, e a dos 44 convidados, com 20 de cada. “Todas as outras s�o m�veis. Na se��o de fotos hist�ricas, por exemplo, o inc�ndio da favela da Praia do Pinto dar� lugar, em breve, a uma s�rie sobre o bicampeonato da Sele��o Brasileira no Chile, por conta da efem�ride dos 60 anos da conquista do t�tulo”, aponta.

Teor de engajamento

Observando o conjunto imag�tico que Testemunha Ocular re�ne, ele considera que n�o haja uma tem�tica predominante, mas, sim, um grande painel da vida pol�tica, social e econ�mica brasileira.

“Voc� tem chacinas, grandes desastres e – uma coisa que chama a aten��o e que partiu dos pr�prios fot�grafos – muitos registros de comunidades ind�genas feitos, na maioria das vezes, fora de pauta. Existe um teor bastante consider�vel de engajamento no fotojornalismo brasileiro; ele abra�a causas”, aponta.

Segundo Pinheiro, com exce��o de Orlando Brito e Erno Schneider, que morreram durante o processo de constru��o do site, todos os outros profissionais est�o vivos. “Tem gente que lamenta a aus�ncia de fot�grafos j� mortos, mas a� seria abrir o escopo demais, e eu queria falar da vitalidade do fotojornalismo no Brasil. Existem grandes nomes que j� partiram, mas a gente optou por n�o contemplar essa produ��o”, explica.

Botas de cano alto usadas por militar em primeiro plano, com o Congresso Nacional ao fundo
Orlando Brito, falecido neste ano, documentou o fechamento do Congresso Nacional ap�s a edi��o do AI-5, em 1968 (foto: Orlando Brito/ divulga��o )

Sobreviv�ncia da imagem

Cobrindo um per�odo t�o longo, com imagens que v�m desde a d�cada de 1920 at� os dias atuais, o site Testemunha Ocular permite acompanhar as mudan�as t�cnicas e conceituais do fotojornalismo, mas sobretudo fala de sua pertin�ncia e perenidade, observa o curador. “A imagem sobreviveu muito, mas muito melhor do que a palavra. Isso � um ponto a favor do fotojornalismo e dos fotojornalistas”, diz.

Ele d� um exemplo: “Tem um ensaio feito pelo Jos� Medeiros em 1951 sobre os rituais do candombl�, na Bahia, com imagens admir�veis, e a mat�ria correspondente tratava aquilo como um esc�ndalo social, do tipo ‘veja o que � a religi�o desses negros que sacrificam animais em seus rituais’, descrevendo como uma barb�rie. O texto n�o via beleza nesses rituais; o Jos� Medeiros viu”, pontua.

“Pode-se dizer que o jornalismo nos anos 1950 era pr�-profissional, cheio de narizes de cera, cheio de circunl�quios, que tinha um acento moral, deplorava as coisas, mas n�o dava informa��o. O texto sobre os rituais do candombl� na Bahia sumiu; as fotos do Jos� Medeiros ficaram”, analisa.


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