� o fim de uma trajet�ria de mais de 30 anos de um dos grupo mais bem-sucedidos da m�sica nacional, o Skank
A decis�o de parar, diz Rosa, serve para libertar os integrantes de uma agenda at� hoje bastante cheia, mas tamb�m — e paradoxalmente — para proteger o legado do Skank. "Vamos acabar, parar a banda, dar um tempo e encontrar mais tarde ou seguir passando pelo ‘constrangimento’ de —acho que � um pouco exagerado, mas — virar mero cover de si mesmo?"
Para o vocalista, o auge criativo do Skank ficou no passado —ainda que ele tenha durado bastante. � dif�cil imaginar um artista, solo ou em conjunto, que tenha emplacado sucessos ao longo de tanto tempo — de "Te Ver", de 1994, a "Esquecimento", de 2014, passando por "Vou Deixar", de 2004, a banda nunca deixou de ter um single em alta rota��o no r�dio e nos shows.
Mas na �ltima d�cada, lan�ou apenas um �lbum de in�ditas, "Velocia", de nove anos atr�s. "A gente conseguiu fazer discos criativos durante duas d�cadas, e temos tr�s de exist�ncia. Acho que foi at� demais!", diz Rosa.
"O fracasso �s vezes est� em continuar. Muitas vezes a longevidade n�o � sin�nimo de �xito — � o contr�rio. At� em casamento, ela pode ser sin�nimo de acomoda��o, de conformismo. E eu acho que o Skank parando, ou acabando, ele se preserva de n�o virar uma banda velha requentada, que est� ali pela comodidade."
Para o tecladista Henrique Portugal, a maior prova do alcance e da perenidade do sucesso do Skank � a turn� de despedida, que rodou o Brasil para al�m das capitais e fora do eixo. Antes de S�o Paulo, eles tocaram em Feira de Santana e Salvador, na Bahia, e depois seguem para um est�dio do Mineir�o lotado, em Belo Horizonte. "O que eu estou sentindo? � um misto de alegria e tristeza —mas � intenso."
Mas se hoje o Skank � conhecido do Oiapoque ao Chu�, no come�o dos anos 1990, as gravadoras n�o faziam ideia que o quarteto mineiro chegaria t�o longe. O rock tinha vivido seu auge comercial nos anos 1980, com a gera��o de Legi�o Urbana, RPM e Tit�s, entre outros, mas vinha perdendo for�a para outros g�neros em ascens�o, do ax� baiano ao pagode e ao sertanejo.
"Logo de cara, a gente j� vendeu um disco de ouro", diz Rosa. "Ent�o, havia aquele ceticismo todo, alegando que o rock havia sido a bola da vez nos anos 1980, que agora era a vez do sertanejo de Leandro e Leonardo. O Skank, goste ou n�o, sendo ou n�o criativo, bate o p� e diz que o rock vai continuar sendo vi�vel comercialmente, arrastando multid�es para gin�sios e festivais."
De fato, nos primeiros anos da d�cada de 1990, v�rias movimenta��es aconteciam ao redor do Brasil. Bandas de rock que viriam a fazer enorme sucesso estavam prestes a surgir ou em est�gios embrion�rios, do Planet Hemp no Rio de Janeiro � Na��o Zumbi em Recife, passando pelos Raimundos em Bras�lia, entre outros.
Formado em 1991, o Skank lan�ou seu disco de estreia em 1993, sendo uma das bandas que puxaram o bonde dessa gera��o, tanto em termos de popularidade quanto em est�tica. Os mineiros seguiram o caminho aberto pelos Paralamas do Sucesso que, das bandas de rock da gera��o anterior, era quem mais havia se aproximado de uma sonoridade brasileira — o �lbum "Selvagem?", de 1986, � um marco nesse sentido.
Se o que imperava nos anos 1980 era a frieza do p�s-punk e da new wave, o Skank chegava tendo Jorge Ben Jor como sua maior influ�ncia, e mirando nos desdobramentos do reggae que pipocavam na Jamaica. Na vis�o de Rosa, a gera��o anterior do rock chegou para quebrar com a sisudez riponga da MPB dos anos 1970, num movimento art�stico natural de negar a est�tica vigente em determinado per�odo.
"A gente ria um pouco das ombreiras do Paulo Ricardo, querendo ser o Duran Duran brasileiro", ele diz. "A gente pensou, ‘pode ser mais brasileiro, � mais legal’. Quer�amos quebrar aquela coisa pomposa, meio Joy Division, da Legi�o Urbana. Era, ‘vamos cantar um calango aqui, o m�ximo que a gente vai imitar s�o os blacks da Jamaica’."
O calango, que d� nome ao segundo e um dos mais importantes �lbuns do Skank, de 1994, � o que Rosa chama de "repente de Minas", estilo incorporado pela banda nos primeiros anos. � uma abordagem que foi se refletindo em todo o rock brasileira daquela �poca — os Raimundos misturaram hardcore com forr�, a Na��o Zumbi uniu guitarras distorcidas e maracatu, o Planet Hemp juntava punk e rap com samba, e por a� vai.
Sempre alinhado ao pop rock, nessa primeira fase, o Skank era calango, mas tamb�m dancehall e ska, exalava latinidade e at� fazia, mas n�o se limitava, �s letras sobre romances juvenis. Em "Calango", "Esmola", sobre desigualdade social, convivia com a apaixonada "Te Ver", enquanto "Jackie Tequila" traz vocais no estilo do toasting jamaicano para pintar um cen�rio tropical cubista ecoando Gilberto Gil.
Era uma �poca p�s-movimento das Caras Pintadas e o governo Collor, em que o Brasil queria olhar para si mesmo. "Aquela m�sica [‘Esmola’] foi o hino dos Caras Pintadas em Belo Horizonte. Os garotos de l� estavam cansados daquela moda dos anos 1980 de ficar pagando pau para carioca e paulista", diz Rosa. "Come�ou a dizer, ‘n�o, vamos gostar das bandas daqui’."
No �lbum "Samba Pocon�", de 1996, a banda fez o hino do esporte mais popular do pa�s, "Uma Partida de Futebol", e alcan�ou sucesso internacional exaltando a mulher brasileira em "Garota Nacional". Tamb�m canta com Manu Chao sobre reforma agr�ria em "Sem Terra" e sobre racismo em "Los Pretos", tudo isso sem deixar a veia pop moderna com a cara das FMs, como em "T�o Seu".
Rosa se lembra de ter ouvido de um executivo de gravadora que, apesar de ter um show redondo e gostar de trabalhar, n�o tinha um hit no r�dio porque suas letras eram muito adultas, e n�o conversavam como os jovens. "Ele falou isso sobre o ‘Calango’, que depois veio a ter cinco hits", diz. "Eu falei, ‘voc� quer que eu trate o jovem brasileiro como imbecil? Que eu encha minhas m�sicas de g�rias e me fa�a parecer um adolescente? A gente se negou e se recusou a fazer isso."
Nessa �poca, o Skank chegou a ter dois �lbuns, "Calango" e "Samba Pocon�", com mais de um milh�o de c�pias vendidas num per�odo inferior a um ano. Para Portugal, o fim dos anos 1990 marca tamb�m o come�o de uma nova fase, a do pop rock mais mel�dico, com mais viol�es e menos metais.
O �lbum "Siderado", de 1998, foi exemplar nessa transi��o —enquanto "Saideira", depois regravada pelo guitarrista Carlos Santana, lembrava o passado, "Resposta" apontava o futuro. Essa segunda, ali�s, foi a faixa que mostrou o caminho do Skank que reinaria nos anos 2000.
"Teve uma certa resist�ncia, tipo, isso � o Skank mesmo?", diz Portugal. "Mudou bastante a caracter�stica sonora, e isso a gente escutou. ‘Resposta’ � uma m�sica que tem uma cara de banda inglesa, n�? Com melodias, estruturas, cordas, esse tipo de coisa. Mas o que acho legal � que nosso p�blico acabou se acostumando com isso, que � a hist�ria das mudan�as, do tipo ‘ gente n�o vai se repetir o tempo inteiro’."
Dali em diante, o Skank foi transformando seu pop rock, lembrando o Clube da Esquina em "Dois Rios", resvalando na bossa nova em "Balada do Amor Inabal�vel", abra�ando um rock mais direto em "Vou Deixar" ou o folk em "Sutilmente". � dif�cil achar um �lbum da banda que n�o tenha emplacado ao menos um sucesso.
De certa forma, a inquieta��o criativa que faz o quarteto pendurar as palhetas e baquetas � a mesma que os fez querer olhar para Jorge Ben Jor em vez de Joy Division — ou soar mel�dica no auge da euforia do balan�o latino-jamaicano. Tanto quanto um esgotamento, mais da pr�pria banda do que do p�blico, � um ato de coragem coerente com a postura do Skank ao longo de tr�s d�cadas.
"Acima de tudo, n�o acho que estou exagerando em dizer que o Skank recoloca o pop rock nos trilhos ali no in�cio dos anos 1990", diz o vocalista. "Antes da gente, nos anos 1990, n�o teve ningu�m com o tamanho que a gente j� conseguiu ali de cara. Desculpa se estou sendo pretensioso, mas a� eu vou ser."
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