Grupo de mulheres negras exibe bebê negro em fotografia assinada por Patrick Arley

Fotos de Patrick Arley registram a for�a da ancestralidade que a di�spora n�o conseguiu anular

Patrick Arley/divulga��o

'Fui entendendo nosso trabalho como artefato m�gico, que carrega saberes e poderes. Isso mudou muito a minha maneira de fotografar'

Patrick Arley, fot�grafo, ao comentar o aprendizado que trouxe de Mo�ambique


A cultura tradicional mo�ambicana se encontra com os terreiros de reinado, umbanda e quimbanda de Minas Gerais na exposi��o “Mo�ambique-Brasil: Uma ponte contracolonial”, que re�ne trabalhos do fot�grafo Patrick Arley. Expostas na galeria do Viaduto das Artes, no Barreiro, as imagens n�o apenas apontam semelhan�as entre os dois pa�ses, mas estabelecem conex�es entre continentes.
 
 
A hist�ria do antrop�logo e pesquisador com Mo�ambique come�ou em 2015, quando morou quatro meses no pa�s para desenvolver trabalho de campo para sua pesquisa de doutorado.
 
Em Nampula, cidade do Norte, trabalhou com curandeiros, praticantes da medicina tradicional mo�ambicana.

Olhar antiexotismo

Arley diz que suas imagens buscam estabelecer di�logos que fujam da representa��o ocidental. “Assumi deliberadamente a l�gica contr�ria � da viol�ncia, do exotismo. Isso � resultado de outro tipo de rela��o, feita em nome do outro e junto com o outro. As imagens foram produzidas com eles e para eles”, afirma o fot�grafo, referindo-se a seus parceiros africanos.
 
De volta ao Brasil, Patrick continuou os estudos e o exerc�cio de sua f�. Umbandista e reinadeiro, ele faz parte da irmandade Os Carolinos, guarda de congo e mo�ambique de Nossa Senhora do Ros�rio e Sagrado Cora��o de Jesus fundada em 1917, na Regi�o Noroeste de Belo Horizonte.
 
Meninos negros fotografados por Patrick Arley

Patrick Arley prop�e a conex�o entre a fotografia e pessoas das comunidades que retratou. 'As imagens foram produzidas com eles e para eles', diz

Patrick Arley/divulga��o
 
As fotos brasileiras s�o uma colet�nea de registros feitos na irmandade e em outros centros religiosos da capital e do interior de Minas, retratando terreiros, quilombos e guardas de congado.
 
Na exposi��o, n�o h� especifica��o de origem ou legendas explicando o contexto de cada uma das 30 imagens. Apenas se v� ali o encontro de culturas.
 
“A ancestralidade compartilha a ideia de persistir. Ent�o, temos congado, reinado, quilombo, comunidades e m�dicos tradicionais de Mo�ambique que continuam resistindo por aqui e por l�”, afirma o fot�grafo. “S�o empreendimentos, terreiros de quimbanda e de umbanda lutando contra o racismo religioso.”
 

Novas pontes com a �frica

Em 2017, Patrick voltou a Mo�ambique por mais quatro meses para dar continuidade �s pesquisas de seu doutorado. Em contato com outros grupos tradicionais do pa�s, percebeu a necessidade de criar pontes sobre o Oceano Atl�ntico, conectando Brasil e Mo�ambique de outra maneira, sem o enfoque da coloniza��o portuguesa.
 
“� interessante colocar essas imagens para conversar. N�o � sobre ficar procurando semelhan�as entre l� e aqui, apesar de elas serem muitas, mas de pensar a partir das particularidades dos contextos p�s-coloniais”, explica.
 
“Mo�ambique-Brasil” prop�e uma viagem entre culturas e a reflex�o sobre ancestralidade. “A ponte � constru�da pelas rela��es poss�veis a partir das diferen�as, � sobre fortalecer o di�logo como forma de provocar pensamentos, reflex�es e sentimentos”, diz o fot�grafo.
 
Mulher coloca a coroa em senhora em grupo de congado retratado pelo fotógrafo Patrick Arley

'A ancestralidade compartilha a ideia de persistir', afirma o fot�grafo Patrick Arley

Patrick Arley/divulga��o


A exposi��o surgiu das ideias do produtor Elias Gibran e do pesquisador Pedro Kalil, amigos de longa data do antrop�logo e fot�grafo, que conheciam seu trabalho e o incentivaram a expor os registros. Afinal de contas, a experi�ncia africana havia sido marcante para a vida dele.
 
“Depois que voltei para o Brasil, mudou a minha rela��o com a ancestralidade. Foi muito intenso”, revela Patrick Arley.
 
Al�m das transforma��es pessoais, ele adotou nova percep��o sobre a fotografia etnogr�fica, aquela dedicada aos povos tradicionais.
 
“Os norte-mo�ambicanos enxergam as fotos como artefatos m�gicos. Ent�o, produzimos v�deos e registros junto dos curandeiros sobre suas trajet�rias e segredos. Com esse contato, fui entendendo nosso trabalho como artefato m�gico, que carrega saberes e poderes. Isso mudou muito a minha maneira de fotografar”, diz.
 
Grupo de congado retratado pelo fotógrafo Patrick Arley

Patrick Arley leva terreiros, quilombos e guardas de congado para a galeria do Viaduto das Artes

Patrick Arley/divulga��o

Colonialismo t�xico

Consciente da heran�a colonialista que perpetua a maneira violenta e desrespeitosa de registrar o continente africano, Patrick chama a aten��o para outras formas de fotografia.
 
“De uns anos para c�, tem acontecido o movimento de reapropria��o do instrumento da fotografia, no sentido de utilizar essa ferramenta como o oposto das narrativas ocidentais, criando narrativas e falas a partir do olhar de dentro da pr�pria comunidade. Sigo essa l�gica”, explica.

A escolha do Viaduto das Artes, na regi�o do Barreiro, faz parte desse contexto, pois o fot�grafo tem o prop�sito de facilitar o acesso das popula��es perif�ricas �s artes.
 
“Nem todas as pessoas t�m acesso aos espa�os de arte tradicionais de Belo Horizonte. Meu trabalho � possibilitar que as pessoas que nunca entraram no museu possam ir � exposi��o e ver sua pr�pria hist�ria sendo valorizada”, conclui o fot�grafo.

“MO�AMBIQUE-BRASIL: UMA PONTE CONTRACOLONIAL”

Fotografias de Patrick Arley. Galeria do Viaduto das Artes (Avenida Olinto Meireles, 45, Barreiro). Funciona de segunda a sexta-feira, das 9h �s 17h. Em cartaz at� 18 de junho. Entrada franca.
 
* Estagi�ria sob supervis�o da editora-assistente �ngela Faria