Novo longa das Tartarugas Ninja, em cartaz nos cinemas, acerta no tom

O maior chamariz de "As Tartarugas Ninja: Caos mutante" � a anima��o, e com raz�o. Na crista da onda de visuais mais arrojados para o formato, o longa de Jeff Rowe surfa em um estilo que enche os olhos a cada cena. Nas imagens, a mistura de desenhos 2D e 3D d� a sensa��o de que se assiste um rascunho refinado, r�stico de prop�sito e hipnotizante.

Mas o trunfo do filme est� nas protagonistas, em especial porque o quarteto formado por Leonardo, Rafael, Donatello e Michelangelo surge dessa vez como um grupo de pr�-adolescentes. Esse registro � uma jogada mais arriscada que todos os riscos em cena, e muitos dos m�ritos da produ��o v�m desse acerto.

As tartarugas, em si, s�o joviais por quest�o de cria��o, a come�ar pelo batismo original de tartarugas jovens mutantes e ninjas. Nos cinemas, por�m, essa parte da caracteriza��o sempre foi mais madura, o que rendeu ao grupo a reputa��o de crian�as adultas na cultura pop.

A abordagem parece uma regra nas outras encarna��es dos her�is nas telonas. Das marionetes em escala humana dos anos 1990 �s cria��es em computa��o gr�fica dos filmes de 2014 e 2016, as tartarugas sempre se relacionaram com o p�blico na posi��o do irm�o mais velho. A experi�ncia da idade vira uma postura descolada para quem est� crescendo e ajuda a vender brinquedos licenciados - o que � �timo para o departamento comercial, por sinal.

A vis�o jovial do quarteto no filme da vez impressiona por isso, mesmo que a hist�ria continue a mesma. Os her�is de novo s�o criados pelo mestre Splinter nos esgotos de Nova York, onde mais uma vez se escondem a contragosto para evitar a persegui��o dos humanos. O cen�rio muda com uma onda de assaltos na cidade, que leva os quel�nios a trabalhar com uma rep�rter, April O'Neil, para resolver o caso.

Essa trama, comum a quase todas as adapta��es nos cinemas, ganha outro tom com as protagonistas crian�as. A come�ar pelo confinamento nos esgotos ser mesmo um desgosto aos adolescentes, que est�o na idade de descobrir o mundo com os pr�prios olhos. Tanto que a dor do grupo est� no fato de n�o conseguir ir � escola, como toda crian�a que veem passar na rua.

Refer�ncias

O drama de "Caos mutante" est� na sensa��o de pertencimento, tema universal aos jovens de todas as d�cadas, mas com um qu� de particular � gera��o Z. A contradi��o dos her�is viverem isolados no subsolo e viverem antenados com tudo o que acontece na superf�cie alimenta a trama, inclusive nas piadas - de "Vingadores: Ultimato" ao anime "Attack on Titan", refer�ncias s�o cuspidas a todo momento.

O filme � movido por esse desejo pela coletividade, que se confunde com o deslocamento de se sentir uma aberra��o - literalmente, para as tartarugas que evolu�ram com uma estranha subst�ncia nos esgotos. Os vil�es mutantes tamb�m sofrem com isso, desejando pelo fim da humanidade apenas porque foram tratados como criaturas horr�veis.

Nem April escapa. Uma estudante no colegial, ela � atormentada por um epis�dio em que vomitou ao vivo no notici�rio escolar.

Da� que a anima��o brilha aos olhos: seu estilo complementa a hist�ria. A mistura dos tra�os bidimensionais com a anima��o 3D ajuda a construir a experi�ncia sensorial que mergulha o p�blico na situa��o dos personagens. O visual � um rascunho porque os her�is se sentem incompletos, e dessa poesia se faz o filme.

Um rascunho muito bem feito, vale acrescentar. Os detalhes da cria��o s�o fascinantes, como nos riscos brancos que pintam o reflexo na lente dos �culos de Donatello ou quando, no cl�max, alguns rabiscos marrons formam uma constru��o civil atingida pela destrui��o. O auge � a cena passada em um fliperama, que mergulha tudo em cores neon vibrantes.

A trilha sonora tamb�m chama a aten��o, no uso extenso de sintetizadores pela dupla Trent Reznor e Atticus Ross. A m� not�cia para os brasileiros � que esse lado da produ��o est� bastante reduzido na vers�o dublada do filme - mal d� para se ouvir a m�sica na mixagem.

Al�m disso, a anima��o n�o deixa de seguir alguns v�cios atuais das grandes produ��es hollywoodianas, que incluem a receita do combate final megaloman�aco. Nesse momento, "Caos mutante" se perde um pouco na escala, apelando a monstro gigante e resolu��es rocambolescas. D� tempo at� de encenar o lado do pai em Splinter, enquanto seus filhos ficam perdidos na a��o.

Nada disso diminui o longa, mas o incapacita do que buscava at� ent�o. Em meio a tanta estiliza��o, faz bem lembrar que a anima��o infantil, �s vezes, ganha mais com hist�rias menores. 

(EUA, Jap�o, Canad�, 2023, 99 min.) Dire��o: Jeff Rowe e Kyler Spears. Classifica��o: 10 anos. Em cartaz no Centro Cultural Unimed-BH Minas e em salas das redes Cineart, Cinemark, Cin�polis e Cinesercla.