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Estado de Minas NOVEMBRO NEGRO

O reposicionamento da experi�ncia hist�rica negra nos curr�culos escolares

Em parceria entre o EM e a Rede de Historiadores Negros, historiador analisa como o processo de implanta��o aponta desafios e a necessidade de continuidade


12/11/2021 06:00

 
Estudante Maria Eduarda Cardoso sentada na carteira e usando máscara
A estudante Maria Eduarda Cardoso dos Santos na Escola Municipal Doutor Julio Soares (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
 
No decorrer do per�odo republicano brasileiro, em diferentes momentos e lugares, militantes, agentes culturais, acad�micxs, dentre outrxs, propuseram que a hist�ria e cultura negra-brasileira, africana e afro-diasp�rica se tornassem conte�dos indispens�veis durante a escolariza��o b�sica.
 
 
A Lei 10.639/03 alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educa��o ao tornar obrigat�rio o ensino da Hist�ria e cultura africana e afro-brasileira nas institui��es de ensino fundamental e m�dio e ao instituir no calend�rio escolar o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacional da Consci�ncia Negra'. Posteriormente, em 2008, a lei foi complementada pela Lei 11.645/2008, ao incluir � obrigatoriedade o ensino da Hist�ria ind�gena. 

Considero a amplia��o da obrigatoriedade do ensino da hist�ria e cultura ind�gena um passo fundamental para a reeduca��o das rela��es �tnico-raciais tendo a escola como espa�o de constru��o de pr�ticas pedag�gicas antirracistas, contudo neste texto, por quest�o de foco e espa�o, trato somente da perspectiva da hist�ria negra relacionada � Lei 10.639/03. 

Al�m das normativas apontadas, as 'Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educa��o das Rela��es �tnico-Raciais e para o Ensino de Hist�ria e Cultura Afro-brasileira e Africana', o  Parecer nº 03/2004 do CP (Conselho Pleno)7 /CNE e a Resolu��o nº 01 de 17 de junho de 2004 do CP/CNE buscaram auxiliar na implementa��o da Lei 10.639/2003 ao proporem par�metros, perspectivas de abordagem e de encaminhamentos did�ticos para a implementa��o da obrigatoriedade citada, al�m de acrescer o ensino superior ao escopo da legisla��o. 
 

'A incorpora��o da hist�ria e cultura africana e afro-brasileira � escolariza��o traz consigo diversas perspectivas importantes para a proposi��o de uma pedagogia antirracismo'

 
Esses dispositivos legais em conjunto configuram-se como um ato de for�a pol�tica e de redefini��o simb�lica na discuss�o das quest�es �tnico-raciais na educa��o brasileira. A partir da Lei 10.639/2003 percebe-se o indicativo de que novas refer�ncias epistemol�gicas e �tnico-raciais passem a compor o curr�culo escolar, tensionando concep��es de curr�culos escolares limitadas a pressupostos referenciados exclusivamente em tradi��es europeias e ocidentais. 
 
A incorpora��o da hist�ria e cultura africana e afro-brasileira � escolariza��o traz consigo diversas perspectivas importantes para a proposi��o de uma pedagogia antirracismo, dentre elas, possibilita criar um deslocamento no lugar historicamente constru�do para as popula��es negras na hist�ria e mem�ria nacional e transnacional. Neste sentido, entendo que a urg�ncia do reposicionamento da experi�ncia hist�rica negra na hist�ria e na narrativa nacional seja uma perspectiva que a referida legisla��o nos traz. 
 
Trata-se de um reposicionamento orientado pelo n�o-esquecimento da ag�ncia e do protagonismo de negros e negras em diferentes contextos, uma esp�cie de ant�doto contra o esquecimento e apagamento hist�rico racialmente orientado contra as popula��es negras, composi��o das narrativas sobre a na��o, uma a��o de combate � produ��o e circula��o de leituras e interpreta��es hist�ricas que circunscrevem negros e negras em posi��es subalternas. 
 
A a��o de incorporar sujeitos hist�ricos, outrora esquecidos, aos curr�culos escolares, tal como prescrito na legisla��o educacional citada, n�o est� limitada a apenas criar um espa�o no curr�culo para tais sujeitos. Ou seja, criar ap�ndices, espa�os complementares, arranjos perif�ricos, tratamentos orientados pelo exotismo em suposto cumprimento legal.
 
Trata-se de recompor o lugar desses sujeitos na narrativa do passado nacional, sem, contudo, apagar suas particularidades �tnico-raciais e culturais. Neste sentido, a hist�ria negra seria um elemento estruturante para a constru��o de uma reeduca��o das rela��es �tnico-raciais. 
 
A hist�ria e cultura afro-brasileira e africana como conte�dos curriculares e a reeduca��o das rela��es �tnico-raciais como finalidade apresentam-se como um conjunto organizado na escolha da educa��o como espa�o de luta antirracista.
 
Compreendendo que o racismo n�o � um fato natural, ao contr�rio, trata-se de um complexo que estrutura a forma��o s�cio-hist�rica brasileira, � socialmente reproduzido, e se expressa nas institui��es e nas diferentes formas de rela��es pol�ticas, econ�micas, culturais e sociais, o investimento na educa��o e na escola como um dos espa�os de potencial constru��o de combate antirracista reafirma-se. 
 
Passados 18 anos da promulga��o da obrigatoriedade da altera��o curricular em foco, esse processo ainda se apresenta inconcluso e incompleto. Neste processo, se por um lado, a intelectualidade comprometida com a reeduca��o das rela��es �tnico-raciais e uma educa��o antirracismo, especialmente a intelectualidade negra, dentro e fora da academia, nos movimentos sociais e culturais, redes, coletivos, na educa��o formal e n�o-formal, vem produzindo reflex�es e materiais relacionados � hist�ria e cultura africana e afro-brasileira.
 
Processo que d� continuidade e amplia uma pr�tica que antecede a Lei 10.639/03, por outro, diagn�sticos e produ��es sobre a implementa��o da lei apontam para um complexo cen�rio no qual destacam-se uma relativa incompreens�o sobre a dimens�o pol�tico-pedag�gica acerca do Ensino de Hist�ria e Cultura Afro-Brasileira e Africana e da Educa��o das Rela��es �tnico-Raciais, bem como, a necessidade de amplia��o do conhecimento sobre a legisla��o educacional sobre a tem�tica racial entre gestores e profissionais da educa��o, e uma fragilidade nos processos de controle, monitoramento e fiscaliza��o voltados para o cumprimento e a obrigatoriedade em foco.
 
A incompletude do processo da implementa��o aponta desafios e a necessidade de continuidade. Neste sentido, acredito que seja importante que n�o se perca de vista as perspectivas que motivaram e motivam as hist�ricas reivindica��es do movimento negro brasileiro no campo da educa��o at� a sua completude, dentre elas, a garantia do acesso aos conhecimentos, especialmente em contexto escolar, sobre a experi�ncia hist�rica negra brasileira, africana e em outros territ�rios da di�spora, em suas profundas dimens�es epistemol�gicas, pol�ticas e civilizacionais.

* professor do Departamento de Hist�ria e do Programa de P�s-gradua��o em hist�ria da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). 


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