
Aid�tica, monstro e drogada teriam sido algumas das palavras ouvidas por uma mulher transexual, de 41 anos, em Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira, durante uma desaven�a familiar. As agress�es verbais e transf�bicas foram feitas – conforme o registro da Pol�cia Militar – pela sobrinha da v�tima, de 17 anos, aponta a denunciante.
Para al�m da den�ncia de preconceito, o advogado volunt�rio do Centro de Refer�ncia LGBTQIA+ da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), J�lio Mota de Oliveira, ressalta, durante entrevista ao Estado de Minas, a falta de preparo das autoridades policiais para atendimento da popula��o trans.
Segundo ele, as dilig�ncias do caso na delegacia foram acompanhadas de v�rios “erros grotescos” e de uma “clara transfobia” na lavratura do Registro de Eventos de Defesa Social (Reds).
Conforme registrado pela PM, a v�tima compareceu � delegacia no in�cio da tarde de segunda-feira (27/12) e relatou que, ap�s uma discuss�o, por causa de uma embalagem de leite em p�, a sobrinha entrou no quarto dela e iniciou as inj�rias. De acordo com a denunciante, as palavras “transexual” e “travesti” tamb�m foram usadas contra ela em tom pejorativo.
Posteriormente, a adolescente teria quebrado diversos pertences, incluindo uma ma�aneta, dentro do quarto da tia, momento no qual a m�e e um primo da jovem intervieram na situa��o para evitar que a autora fizesse algo ainda pior, aponta o registro da pol�cia.
Esta n�o seria a primeira vez que a v�tima teria sido alvo de algum tipo de hostilidade no ambiente dom�stico. Segundo ela, a adolescente e seus pais a tratam de forma preconceituosa, tendo, inclusive, sido amea�ada de agress�es f�sicas por eles.
Em nota � reportagem, a Pol�cia Civil de Minas Gerais (PCMG) diz que o caso foi encaminhado � 3ª delegacia da institui��o policial. “Conforme o titular da unidade, delegado Rodolfo Rolli, nesse caso, a apura��o prossegue mediante a representa��o da parte ofendida. Por isso, a Pol�cia Civil aguarda o comparecimento da v�tima na delegacia”, explica a PCMG.
Advogado aponta despreparo da PM no atendimento � popula��o trans
O Estado de Minas teve acesso ao registro oficial completo da Pol�cia Militar realizado na �ltima segunda-feira. O documento foi encaminhado ao advogado J�lio Mota de Oliveira, que, al�m de atuar no Centro de Refer�ncia LGBTQIA+ da UFJF, � um homem trans e p�s-graduado em g�nero e sexualidades pela Faculdade de Educa��o da mesma universidade.
No texto de descri��o da ocorr�ncia, a PM se refere � v�tima a partir do nome que consta no registro civil, que � masculino e n�o reflete a identidade de g�nero da mesma. “Isso � completamente desnecess�rio, tendo em vista que h� no boletim de ocorr�ncia campos espec�ficos para constar nome de registro, nome social, orienta��o sexual e identidade de g�nero”, observa J�lio.
Na reda��o da sinopse policial tamb�m consta que a v�tima “prefere” ser chamada pelo nome feminino em decorr�ncia de sua “op��o sexual”. “Na verdade, n�s estamos tratando aqui da identidade de g�nero e n�o de orienta��o sexual, que seria o termo correto”, avalia.
“H� uma clara transfobia na lavratura do Reds”, diz advogado
“A orienta��o sexual diz respeito � orienta��o do desejo afetivo-sexual manifestado por uma pessoa em rela��o � outra. J� a identidade de g�nero trata da percep��o que o indiv�duo tem de si mesmo, podendo se identificar com o g�nero feminino, masculino, ambos ou nenhum deles, independente do sexo biol�gico. Os sujeitos que n�o se identificam com o g�nero imposto a partir do sexo biol�gico s�o tidos como transexuais”, explica o advogado, que tamb�m � mestrando em Servi�o Social pela UFJF.
“No caso narrado, h� uma clara transfobia na lavratura do Reds. Embora o policial respons�vel pelo registro da ocorr�ncia ressalte que a v�tima prefere ser chamada por seu nome feminino, que, no caso, se trata do nome social, este se refere a ela como se fosse um homem e utiliza o pronome de tratamento masculino “senhor”, ignorando completamente a identidade de g�nero autodeclarada”, critica.
Erros recorrentes
Para J�lio Mota, assim como esse boletim de ocorr�ncia, h� diversos outros que s�o “lavrados de maneira completamente desqualificada e com erros grotescos”.
“Esses erros recorrentes impactam diretamente nos dados relativos �s viol�ncias contras as pessoas trans, pois elas acabam sendo interpretadas como viol�ncias contra homossexuais. Isso dificulta, inclusive, a formula��o de pol�ticas p�blicas de combate � transfobia”, finaliza.
PM foi procurada, mas n�o se manifestou
O Estado de Minas apresentou � PM, por meio de sua assessoria, todas as alega��es do advogado, assegurando o direito de resposta. No entanto, at� o fechamento desta reportagem, n�o houve retorno.