
Dez anos depois da aprova��o da Lei de Cotas no Brasil, a discuss�o sobre a implementa��o e efic�cia ainda permeia o debate p�blico. A legisla��o, que causou pol�mica quando foi proposta, mudou a cara das universidades brasileiras. Relat�rio do Observat�rio da Branquitude, divulgado nesta quarta-feira (24/8), mostra que quase metade de todos os projetos de lei que tramitam no Congresso querem enfraquecer a lei de alguma forma.
Das 30 propostas feitas durante a �ltima legislatura, 11 s�o favor�veis, tr�s neutras e 11 s�o contr�rias �s cotas, de acordo com o relat�rio. Dessas, tr�s foram propostas por partidos de esquerda e centro-esquerda e oito por partidos de direita. De acordo com Thales Vieira, coordenador executivo do Observat�rio, a an�lise mostra como a pol�tica p�blica sofre de amea�as constantes. “A gente tem o Congresso mais conservador dos �ltimos tempos. Com a aproxima��o das elei��es, a gente n�o acha que ser� pautado por agora, mas sempre � uma amea�a”, afirma.
O relat�rio chamado "Quem s�o os anticotas do Brasil" analisou qual a vis�o do Brasil sobre a pol�tica p�blica em tr�s setores: intelectuais, imprensa e no Poder Legislativo. Segundo Thales, o resultado mostra que os dois primeiros setores mudaram a percep��o sobre as cotas ap�s os resultados da pol�tica, por�m, os argumentos contr�rios usados por esses setores h� mais de dez anos s�o utilizados at� hoje pelo Congresso para amea�ar a lei.
“Teve uma mudan�a de humor calcada nos resultados positivos que a pol�tica trouxe, mas a pesquisa percebe que os posicionamentos contr�rios por parte da imprensa e intelectuais formam o posicionamento da pol�tica", explica. "� o que a gente chama de s�ndrome de Curupira. O corpo avan�a para o sucesso, mas os p�s continuam apontando para tr�s”, completa.
Segundo ele, a maioria dos argumentos contr�rios se refere a uma vis�o errada de que as cotas s�o somente raciais. A lei de 2012 estabelece que a reserva de vagas nas universidades p�blicas � destinada a estudantes da rede p�blica, pretos, pardos, ind�genas, pessoas com defici�ncia e popula��o de baixa renda. “Todos os projetos de lei contr�rios falam que as cotas sociais deveriam existir e n�o a raciais, mas a social j� existe”, argumenta.
Al�m disso, ele destaca que muitos projetos tentam criar novas categorias sem especificar de onde seriam retiradas essas vagas, como um que quer reservar vagas para atletas de alto rendimento. “� a banaliza��o da lei, pois prev� a entrada de outros grupos, mas n�o especifica de onde tira essas vagas, da ampla concorr�ncia? Das cotas? Porque a lei � muito espec�fica, � para grupos subrepresentados”, ressalta.
O projeto citado por ele � o PL 2493/2019, de autoria da senadora Leila Barros (PDT-DF), candidata ao governo do DF. O projeto tem como intuito possibilitar que atletas de alto desempenho completem os estudos sem ter que parar de praticar o esporte e j� foi aprovado na Comiss�o de Educa��o.
Em nota, a senadora ressaltou que defende a lei de cotas e que o projeto s� prev� reserva de vagas para o ensino � dist�ncia. "� importante ressaltar que uma consider�vel parcela de atletas brasileiros inicia a jornada esportiva em projetos sociais voltados para a popula��o de baixa renda, majoritariamente negra no Brasil. Cerca de 55% das medalhas brasileiras alcan�adas em T�quio, em modalidades individuais, foram conquistadas por atletas negros", afirmou.
Outro debate que veio � tona este ano � o argumento de que a lei precisa ser revista. Por�m, a revis�o n�o � obrigat�ria, � s� uma recomenda��o, e nem tem como intuito saber se a pol�tica deve continuar ou acabar. Inclusive o pr�prio texto veda a extin��o do programa.
Mudan�a na intelectualidade
Em 2006, 114 intelectuais enviaram um documento ao Congresso Nacional com argumentos contr�rios �s cotas. Parte dessas pessoas mudaram de ideia ao longo dos anos. Pelo menos 11 dos que ainda est�o vivos j� se manifestaram falando que mudaram de opini�o. Somente quatro dizem manter o mesmo posicionamento.
Uma dessas pessoas que mudaram de opini�o � a historiadora Lilia Schwarcz. Em 2019, ela usou uma rede social para explicar o porqu� assinou o documento e o porqu� se arrepende.
"Errei, portanto, ao n�o atentar para a inten��o do documento e assim fortalecer uma causa contra a qual me oponho, com convic��o. Desde ent�o, procurei provar aonde moram minhas certezas, a partir da publica��o de artigos e livros, em entrevistas, participando de pol�ticas p�blicas e debates, sempre a favor de cotas", arrependeu-se.
Ela se tornou favor�vel �s cotas por elas permitirem uma repara��o hist�rica. "Sou a favor de cotas, pois, � preciso reparar desigualdades e hierarquias criadas, durante s�culos pelo sistema escravocrata e pela falta de pol�ticas de inclus�o das popula��es negras durante a Rep�blica", diz em um trecho do texto.
Na sociedade, as cotas tamb�m est�o bem aceitas. Pesquisa do Datafolha, feita este ano, mostrou que 50% da popula��o brasileira � a favor das cotas raciais em universidades p�blicas. Somente, 34% se posicionaram contra a reserva de vagas. Outros 3% se mostraram indiferentes e 12% n�o souberam responder.
Ou�a e acompanhe as edi��es do podcast DiversEM
O podcast DiversEM � uma produ��o quinzenal dedicada ao debate plural, aberto, com diferentes vozes e que convida o ouvinte para pensar al�m do convencional. Cada epis�dio � uma oportunidade para conhecer novos temas ou se aprofundar em assuntos relevantes, sempre com o olhar �nico e apurado de nossos convidados.