
O caso ocorreu com a nutricionista e cabeleireira Julie Correia de Araujo, que afirma ter sido v�tima de transfobia ao perguntar sobre o banheiro feminino da lanchonete. Ela estava voltando da praia com a fam�lia e amigos e resolveram parar no estabelecimento para almo�ar. Quando seus primos foram ao caixa pagar a conta, ela seguiu � procura de um banheiro, solicitando ajuda a um dos funcion�rios.
“Eu dei boa tarde e perguntei onde ficava o banheiro feminino. A�, ele falou assim para mim: ‘Voc� n�o pode usar o banheiro feminino, porque voc� � homem’. Sabe quando voc� n�o est� esperando? Porque eu simplesmente perguntei onde era o banheiro. Poderia ser para mim, ou para qualquer outra pessoa. Eu n�o falei que era eu quem ia usar o banheiro”, contou ela � �poca do caso, contando tamb�m que ele teria indicado a ela o toalete masculino.
Ela tamb�m afirma que chegou a cham�-lo de “babaca” e se dirigiu ao caixa para perguntar sobre o gerente, mas ouviu mais uma vez que n�o poderia usar o banheiro feminino. “Me disseram que era proibido. ‘Voc� � homem’. Ou seja, ele reiterou aquilo que o funcion�rio tinha falado”, disse. “Uma mulher que viu a situa��o at� falou para eu ir, que era meu direito, me apoiando. Ele [gerente] estava me deslegitimando como mulher porque, na concep��o dele, eu n�o sou. Quer dizer que � ele quem decide se eu sou mulher ou n�o? Me senti constrangida”, completou.
Ap�s muita insist�ncia, ela conseguiu usar o banheiro feminino, mas ainda fez uma postagem denunciando o caso de transfobia em uma p�gina de milit�ncia trans nas redes sociais. Na publica��o, Julie afirmou que � muito cansativo ter que pedir todo dia para ser respeitada como mulher e que pretendia entrar na Justi�a contra o estabelecimento. O caso foi registrado no 7º Distrito Policial de Santos e levado � Justi�a.
Andamento do caso
Em setembro de 2022, a 2ª Vara do Juizado Especial C�vel de Santos julgou que a a��o n�o tinha fundamento, alegando que Julie "jamais foi impedida de usar o banheiro feminino" e que “tudo n�o passou de um grande mal-entendido”.
“� preciso verificar que estamos tratando com pessoas humildes, e que muitas vezes h� enorme dificuldade de saber com quem se est� interagindo. Em pesquisa em qualquer site da internet, verifica-se que existem de 30 a 50 tipos de g�neros, o que causa ainda maior embara�o e dificuldade”, escreveu o juiz Guilherme de Macedo Soares, da 2ª Vara do Juizado Especial C�vel de Santos.
A defesa da cabeleireira enviou um pedido de recurso, analisado e julgado pela 3ª Turma C�vel do Col�gio Recursal de Santos, que condenou a lanchonete a pagar R$ 30 mil por danos morais por transfobia em fevereiro de 2023.
O juiz Castro Neto, relator do caso, afirmou que “as pessoas trans est�o amparadas pelo princ�pio de dignidade da pessoa humana e s�o titulares dos direitos da personalidade. A identidade de g�nero � uma escolha pessoal. � sociedade, resta a fun��o de romper com o paradigma da patologia estruturada sob a doutrina bin�ria [feminino ou masculino] e transmutar-se para o plano de constru��es de identidade de g�nero por meio da cultura e do meio social [...] e permitir ao sujeito expor seu ser, externar suas escolhas e desejos, sem o receio de ser exclu�do, discriminado ou violentado”.
Julie tamb�m relatou que o caso foi bastante noticiado na m�dia local e que, em uma das not�cias, conforme consta na peti��o inicial, o dono da lanchonete havia comparado a v�tima a um “ladr�o”. No depoimento que deu � Pol�cia Civil, ela tamb�m afirma que o dono do estabelecimento a havia caracterizado como “pessoa com trejeitos homossexuais”, referindo-se a ela sempre no pronome masculino.
O advogado Reginaldo Mascarenhas, que defende o estabelecimento, negou as acusa��es e afirmou que “inexistiu o impedimento dela usar o banheiro” e que vai recorrer da decis�o. Ele tamb�m afirmou que os ju�zes Orlando Gon�alves de Castro Neto, Renata Sanchez Guidugli Gusm�o e Frederico dos Santos Messias, respons�veis pelo caso, teriam julgado a afirma��o que saiu na m�dia que comparava a mulher a um “ladr�o”.
"A decis�o de segunda inst�ncia foi fundamentada em mat�ria de jornal que atesta a fala do dono [da lanchonete] que nunca aconteceu e n�o em produ��o de prova. A suposta fala em jornal nunca existiu, n�o sabemos de onde tiraram isso", disse Mascarenhas. "O juiz de segunda inst�ncia se apega a essa suposta fala dizendo que, no jornal, o dono equipara ela a um ladr�o, e isso, al�m de n�o ter acontecido, n�o faz parte do reclamo. Inclusive, inexistiu o impedimento dela usar o banheiro, por isso o juiz de primeira inst�ncia foi t�o certo na decis�o", completou.
Procurado pela reportagem do EM, o dono do estabelecimento ainda n�o deu um pronunciamento sobre o caso.
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