
� o que denuncia a segunda parte do dossi� "Os invasores", elaborado pelo observat�rio "De Olho Nos Ruralistas". O documento foi lan�ado ontem (14) � noite, no Cine Petra Belas Artes, em S�o Paulo, acompanhado de debate sobre a tem�tica e de exibi��o do premiado document�rio "Vento na fronteira", que retrata um conflito entre fazendeiros e ind�genas guarani kaiow� na fronteira entre Brasil e Paraguai.
A primeira parte do relat�rio foi divulgada durante o Abril Ind�gena, m�s em que se procura dar maior proje��o para as in�meras lutas da causa ind�gena em todo o pa�s. No documento j� se havia informado a identifica��o de 1.692 sobreposi��es, das quais se destaca agora a por��o pelas quais respondem cl�s pol�ticos.
O observat�rio detectou terras com sobreposi��o a partir da an�lise de dados fundi�rios do Instituto Nacional de Coloniza��o e Reforma Agr�ria (Incra), mais especificamente, das bases do Sistema de Gest�o Fundi�ria (Sigef), do Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR) e do Sistema Nacional de Certifica��o de Im�veis (SNCI). Os pol�ticos e sua rede t�m em suas m�os 96 mil hectares, o equivalente � soma das �reas urbanas de Rio de Janeiro e Belo Horizonte.
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Com 17 casos, Mato Grosso do Sul lidera a lista. Em seguida, aparecem Mato Grosso e Maranh�o, com sete, cada.
Poder aquisitivo
De acordo com o coordenador de projetos do observat�rio, pesquisador Bruno Bassi, os atores que protagonizam a pr�tica ilegal e que amea�am os povos ind�genas s�o tanto pol�ticos como pessoas com poder aquisitivo, que financiam tais a��es e se mant�m em determinada teia de rela��es.
"Apesar de a gente ter um n�mero relativamente reduzido de pol�ticos identificados com sobreposi��o direta, � interessante observar que, na verdade, n�o � um n�mero t�o pequeno quando a gente pensa que �, um [total] que corresponde a uma porcentagem relativamente alta desse n�mero, pensando que se esperaria que a imagem que se tem, normalmente, dos fazendeiros que disputam �reas em terras ind�genas, e isso � um discurso bastante refor�ado pela m�dia corporativa, � que s�o pessoas desconhecidas, que o promotor desses conflitos � o pequeno grileiro, um cara que ningu�m conhece, que est� l� no interior do Brasil, promovendo esse tipo de a��o", diz Bruno.
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"O avan�o do territ�rio, sobretudo do agroneg�cio, sobre territ�rios ind�genas ou reivindicados pelos povos ind�genas � promovido, de um lado, pelo capital, pelas grandes empresas e corpora��es, por multinacionais, grandes empres�rios, e tem uma interface pol�tica, que abarca desde a posse direta por pessoas que se envolvem nesse universo pol�tico. A gente tem governador, deputados federais, um senador, cinco prefeitos e vice-prefeitos com mandato atual e 23 ex-prefeitos, o que demonstra o tamanho dessa esfera municipal, do poder local, na posse de terras. A gente tem deputados estaduais", acrescenta.
O coordenador faz outra observa��o sobre as sobreposi��es: "A gente tem desde casos declarados de invas�o, ou seja, s�o em �reas [ind�genas] homologadas, que s�o tentativas de grilagem, como o caso do senador Jaime Bagattoli, feita pelo antigo propriet�rio da �rea e que foi mantida nos registros fundi�rios do SNCI, e h� casos em que essa sobreposi��o impede, muitas vezes, a pr�pria demarca��o do territ�rio", acentua Bruno.
Subvertendo a l�gica
Ele diz que "v�rios dos processos de Mato Grosso do Sul se desenrolam por mais de uma d�cada at� que se chegue a uma decis�o. E esses prazos t�m sido ainda maiores em fun��o do avan�o pol�tico, na C�mara [dos Deputados], especialmente, em se aprovar o marco temporal para a demarca��o de terras ind�genas, que � a base de contesta��o de v�rios desses processos, uma tese que ignora que esses ind�genas foram expulsos continuamente dessas �reas, principalmente durante os anos 40, 50 e 60, atr�s das frentes de coloniza��o, em que o pr�prio Estado brasileiro, atrav�s do Servi�o de Prote��o aos �ndios (SPI), expulsava essas comunidades e realocava em �reas extremamente diminutas, em rela��o ao territ�rio anteriormente ocupado pelos ind�genas".
"Quem s�o os reais invasores de terras no Brasil? Os movimentos populares que lutam pela reforma agr�ria e pela demarca��o de terras ind�genas, direitos consagrados na Constitui��o de 1988? Ou os grileiros que invadem milh�es de hectares na Amaz�nia, no cerrado e nos demais biomas?" Essas s�o algumas das pontua��es que constam do relat�rio.
Nessa linha, que critica a criminaliza��o dos movimentos sociais, Bruno Biassi finaliza dizendo que o que o observat�rio prop�e, com o documento, � a invers�o da l�gica sempre disseminada. "Vamos tamb�m pautar a invas�o de terras pelo agroneg�cio", argumenta.
Guarani kaiow� e ind�genas isolados
Entre os nomes que aparecem em destaque com a divulga��o do relat�rio est�o o senador Jaime Bagattoli (PL-RO) e o deputado federal Dilceu Sperafico (PP-PR). Bagattoli integra, atualmente, a Comiss�o de Meio Ambiente, a Comiss�o de Agricultura e Reforma Agr�ria e a Comiss�o Parlamentar de Inqu�rito das Organiza��es N�o Governamentais - ONGs.
Sperafico � membro da Comiss�o de Agricultura, Pecu�ria, Abastecimento e Desenvolvimento Rural, na C�mara dos Deputados, e publicou um v�deo, em sua conta no Instagram, comemorando a aprova��o do Projeto de Lei 490/2007 na C�mara, que contou com seu voto favor�vel.
No v�deo, ele justificou o voto, dizendo que propriet�rios rurais t�m tido suas fazendas amea�adas por processos de demarca��o "indevida" de terras ind�genas, em Mato Grosso do Sul e no Paran�.
E � justamente em Mato Grosso do Sul - estado com fama de viol�ncia no campo e assassinatos de ind�genas, documentados por entidades como a Comiss�o Pastoral da Terra (CPT) e o Conselho Indigenista Mission�rio (Cimi) - onde Sperafico tem uma fazenda, a Maracay, no munic�pio de Amambai. A propriedade de que � dono tem mais de quatro mil hectares, de acordo com o observat�rio "De Olho Nos Ruralistas", e fica sobre a Terra Ind�gena Iguatemipegu�, dos guarani kaiow�.
No caso de Bagattoli, a fazenda em situa��o irregular � a S�o Jos�, que fica no munic�pio de Corumbiara, em Rond�nia. A por��o que est� sobreposta � de 2,5 mil hectares em rela��o � Terra Ind�gena Rio Omer�, local habitado pelos povos akuntsu e kano�, que vivem em isolamento volunt�rio.
O patrim�nio declarado por Jaime Bagattoli ao Tribunal Superior Eleitoral, que inclui diversos lotes rurais, ultrapassa R$ 55 milh�es. O de Sperafico supera R$ 46 milh�es.
Invasores de territ�rios de povos origin�rios tamb�m foram os respons�veis por bancar 29 campanhas de candidatos � elei��o ou reelei��o � Presid�ncia da Rep�blica, ao Congresso Nacional, a governos estaduais e assembleias legislativas. O montante de doa��es ultrapassou R$ 5,3 milh�es.
Considerando somente pessoas ligadas � Frente Parlamentar da Agropecu�ria, o que se observa � que 18 integrantes receberam R$ 3,6 milh�es em doa��es de campanha, desembolsados por fazendeiros ligados a sobreposi��es.
A Ag�ncia Brasil tentou contato com o deputado federal Dilceu Sperafico e o senador Jaime Bagattoli, mas nenhum deles respondeu os questionamentos da reportagem.
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