
O caso � apontado em um relat�rio lan�ado nesta ter�a-feira (19) na capital paulista pela entidade Conectas Direitos Humanos, pelo Instituto Ma�ra e entidades de representa��o ind�gena. O documento foi elaborado coletivamente com a Associa��o Etnoambiental Kanind�, Jupa� - Associa��o do Povo Ind�gena Uru-eu-wau-wau e Kowit - Associa��o Ind�gena do Povo Arara da Cachoeira Seca.
Outra situa��o mostrada no relat�rio � a de povos que vivem nas Terras Ind�genas (TI) Uru-Eu-Wau-Wau, em Rond�nia, e, ainda, a da TI Sete de Setembro, em Rond�nia e Mato Grosso. S�o povos com sua exist�ncia sob risco, sendo que alguns deles aceitaram entrar em contato com pessoas de fora de sua comunidade apenas recentemente e outros optaram por permanecer em isolamento volunt�rio.
A diretora de Fortalecimento do Movimento de Direitos Humanos da Conectas, Julia Mello Neiva, explica que os autores do relat�rio decidiram se concentrar em detalhar o cen�rio desses territ�rios porque as lideran�as que neles atuam t�m em comum a forma de enfrentar as dificuldades, que se assemelham. Al�m disso, enfatiza ela, os l�deres ind�genas demonstram disposi��o ao di�logo, a fim de encontrar solu��es, inclusive no que diz respeito ao processo de desintrus�o, ou seja, de retirada dos invasores.
A diretora da Conectas, que conversou com as lideran�as diretamente, menciona que elas t�m receio de que os invasores retornem � TI, ap�s sua expuls�o, e que, para ela, o governo federal tem sinalizado estar do lado dos ind�genas. "� proteger os povos ind�genas, mas tamb�m a humanidade", afirma.
Como em diversos outros territ�rios no Brasil e tendo como exemplo os outros citados no relat�rio, na TI Cachoeira Seca desrespeita-se um dos princ�pios mais importantes para os povos origin�rios, o de autodetermina��o, segundo a pesquisa. A autodetermina��o significa que os povos ind�genas t�m direito a conduzir, como bem entenderem, a sua condi��o pol�tica e seu desenvolvimento, nos �mbitos econ�mico, social e cultural. Isto �, deveriam gozar de autonomia e ter condi��es para isso.
Segundo o relat�rio “Vidas em territ�rios sob press�o: povos Uru-Eu-Wau-Wau, Paiter Suru� e Arara”, na TI em quest�o, que fica entre os rios Iriri e Xingu, o modo de viver e, por conseguinte, o de n�o viver t�m sido ditado pelos invasores, que s�o madeireiros, grileiros, garimpeiros e outros tipos, como os fazendeiros que criam gado. Conforme ressalta o relat�rio da rede de organiza��es, com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), entre 2008 e 2020, os arara perderam 367,9 km² de floresta.
"Em termos gerais, o impacto desse desmatamento � a diminui��o da ca�a, mais polui��o do rio e diminui��o dos peixes. As grandes �rvores castanheiras e a maioria dos ip�s foram derrubadas. Como consequ�ncia, os ind�genas n�o se sentem mais � vontade para fazer ca�adas distantes, para se afastarem da aldeia – dentro do territ�rio, mas longe da aldeia. Isso porque, ao fazer acampamento no mato, � poss�vel escutar motosserras se aproximando de madrugada. Dessa forma, o uso do pr�prio territ�rio come�a a ser restringido por medo de se deparar com um madeireiro ou algum invasor na terra deles", descreve o relat�rio.
Amea�as
O relat�rio mostra que os arara tamb�m sofrem, como muitos de seus parentes ind�genas, amea�as, constantemente. Um caso que ilustra a viol�ncia a que ficam expostos � o de Karaya Arara, que, em maio de 2000, foi encontrado morto no rio Iriri, em Altamira, dias ap�s terem reportado seu desaparecimento.
A TI Uru-Eu-Wau-Wau, por sua vez, � um dos territ�rios ind�genas que constam da lista de prioridades do governo federal, em termos de desintrus�o. Os ind�genas do territ�rio assistiram a um agravamento das press�es sobre a regi�o, no intervalo de 2018 a 2021.
De acordo com o relat�rio lan�ado nesta ter�a-feira, a regi�o pr�xima � aldeia Linha 623, onde os ind�genas coletam castanhas, � foco de ataques de grileiros e madeireiros, que provocam desmatamento, roubam castanhas e amea�am a vida dos ind�genas que j� estabeleceram contato e tamb�m dos ind�genas isolados.
Ivaneide Bandeira Cardozo, da Kanind�, relembrou o epis�dio que vivenciou em 14 de maio, quando cerca de 50 homens a acuaram, enquanto estava na companhia de ind�genas paiter suru�, no momento em que faziam o preparo de um desenho no ch�o, como protesto contra o desmatamento na regi�o. Ela conta que os invasores d�o tiros na floresta, mostram que n�o se importam em desautorizar agentes da Funda��o Nacional dos Povos Ind�genas (Funai) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renov�veis (Ibama) e, em diversas ocasi�es, j� afirmaram que ind�genas s�o “folgados”.
Para Ivaneide, uma das preocupa��es � a descaracteriza��o dos casos como viola��es de direitos dos ind�genas e conflitos por terra. O que fazem, comenta, � atribuir as agress�es a outros fatores, "inventando desculpas". Segundo ela, at� hoje, n�o avan�aram na Justi�a os processos que poderiam dar desfecho aos casos de viol�ncia cometida contra as lideran�as.
"Todos os protetores [da floresta] s�o amea�ados de morte, t�m que viver sob prote��o. H� um bocado de tempo, n�o posso ir � TI Uru-Eu-Wau-Wau, por alguns lugares, porque sei que, se eu for, v�o me matar. E n�o sou s� eu, � a equipe. Eles t�m os nomes todos, as pessoas marcadas. E esse pessoal n�o mata por si, manda matar", declara.
A Ag�ncia Brasil entrou em contato com o Minist�rio dos Povos Ind�genas e com a Funai para obter um posicionamento sobre as coloca��es feitas no relat�rio, mas n�o obteve retorno at� a publica��o da mat�ria.