
Por tr�s da maquiagem oleosa e colorida do palha�o Patatu, o vendedor ambulante Isvaldo Oliveira n�o consegue esconder a tens�o. Acima do nariz vermelho, os olhos inquietos durante a entrevista deixam claro que algo n�o vai bem. Vendedor de algod�o-doce na Pra�a da Liberdade, atra�do pelo movimento estimulado pelas luzes de Natal que enfeitam o cart�o-postal na Regi�o Centro-Sul de Belo Horizonte, ele precisa ficar atento. Ao grito de um fiscal da prefeitura, d� no p�. S� teve tempo de contar que � casado, tem dois filhos, e, desempregado, aproveita o esp�rito natalino para fazer at� R$ 30 por dia na pra�a, entre os doces espetados no palito (R$ 3 a unidade) e as fotos que tira com as crian�as (R$ 1 a pose).
Isvaldo � um dos incont�veis vendedores que transformam a pra�a neste per�odo do ano em p�tio para com�rcio de todo tipo de alimentos e bugigangas: de pipoca a algod�o-doce, de baleias que soltam bolhas de sab�o a espadinhas de pl�stico luminosas. Tudo corre nas barbas dos fiscais � paisana, que, vez ou outra, recolhem as mercadorias dos vendedores.
Por sobre o corredor monumental de palmeiras-imperiais, pequenos objetos luminosos sobem e voltam ao ch�o – s�o os piroc�pteros, que, no in�cio da noite, custam R$ 5, mas, na “xepa”, terminam o dia valendo R$ 3. “D� para tirar at� R$ 800. Como a gente compra em quantidade, cada unidade nos custa R$ 1. O lucro � bacana”, explica o ambulante Sebasti�o Luz. Ele tamb�m comercializa baleinhas de espuma a R$ 20 cada, e ventiladores de brinqued (R$ 10), mesmo pre�o dos arquinhos luminosos.
Os produtos escolhidos por Sebasti�o s�o os mais populares. Em noites movimentadas (como costumam ficar desde que S�o Pedro colabore), � dif�cil caminhar pela pra�a sem trombar nos vendedores. Quem vai com crian�a, � bom saber que a escapat�ria � complicada: “Tinha certeza de que ia ser isso, ent�o viemos preparados”, conta Cynthia Silva de Oliveira, que foi com o marido, Marcos Aur�lio Dias Alves, e as filhas, Ra�ssa e Hana, para o “imperd�vel” programa tradicional. As duas garotinhas, de 9 e 4 anos, ganharam cata-ventos eletr�nicos e luminosos (R$ 10 cada), mas queriam muito mais. “Tinha a baleinha que faz bolinhas de sab�o e aquele neg�cio que vai l� em cima e volta. Mas s� ganhamos esses mesmo”, reclama Ra�ssa.
AL�VIO NAS CONTAS
O est�mulo ao consumismo dessa �poca do ano, que transforma o 13º sal�rio em salva��o para o varejo, tamb�m serve para aliviar as contas dos informais. Um grupo de bailarinas vendedoras ambulantes chama a aten��o. As meninas fazem parte do Arte Ballet, das comunidades do Taquaril e Alto Vera Cruz. “Fizemos uma apresenta��o no Minascentro e ficamos endividadas em R$ 9 mil. O jeito � fazer de tudo para tentar recuperar esse dinheiro”, diz Ana Paula de Jesus Santos, uma das bailarinas da companhia, que atende mais de 120 crian�as dos dois bairros.
Entre o cl�ssico e o hip-hop, come�aram a vender cart�ezinhos de Natal na pra�a, mas, no interc�mbio de experi�ncias com os pr�prios ambulantes, decidiram investir nos piroc�pteros a R$ 5. Ana Paula d� o caminho do fornecimento: “Compramos dos chineses do ‘Centr�o, da Santos Dumont’”, mas ela esconde a margem de lucro e desconversa. “S�o muitos porcentos, mas � por uma causa justa”.
Economia informal sobrevive
Tamb�m atra�dos pelo movimento t�pico da temporada, � comum que artistas, poetas e escritores independentes fa�am da Pra�a da Liberdade palco para comercializar livros a R$ 10 e recitar poemas que conven�am o pessoal. Com os cora��es amaciados com a expectativa da data religiosa, os consumidores ficam mais f�ceis, segundo o estudante de psicologia Gabriel L’abbate, que comemorava o sucesso de vendas – em cinco minutos, vendeu dois exemplares de seu �ltimo lan�amento, a colet�nea po�tica Long�nqua constela��o.
Entrentanto, o espa�o democr�tico pra�a, marcado fortemente nessa �poca do ano pela economia informal, sobrevive, criando esp�cie de suspens�o da Lei 8.616, que no artigo 18 pro�be as vendas em via p�blica na capital mineira. A legisla��o est� na ponta da l�ngua de Joel Claudino Soares, supervisor de fiscaliza��o da pra�a, que comanda equipe com um fiscal e 11 auxiliares, ligada � Regional Centro-Sul.
De acordo com ele, a equipe atua diariamente entre 18h45 e 0h, mas o pr�prio ambiente familiar da pra�a impede a��o mais direta dos fiscais, que se limitam a uma ou outra apreens�o. “N�o podemos chegar de uma forma que assuste as pessoas”, justifica. Uma das ambulantes, � espreita, encostada em uma das palmeiras, contesta: “Fico esperando at� as 22h, quando eles v�o embora. Ent�o come�o a trabalhar”, diz ela, que vende cerca de 40 latas de cerveja por noite.