Os l�rios cultivados pela fam�lia De Wit, em Holambra, polo de produ��o de flores no interior de S�o Paulo, podem ser perfumados ou n�o. "Como tem gente que n�o gosta, produzimos flores com e sem perfume", diz Tobias de Wit, filho do fundador. A fam�lia � precavida tamb�m em rela��o � �gua. Mant�m tr�s tanques, que acumulam �gua da chuva e de um c�rrego pr�ximo. "Se tudo secar no entorno, haver� �gua para irrigar as flores por seis meses", diz Wit. � um trunfo no setor. A maioria dos agricultores tem reserva para tr�s dias. Mas nem assim os De Wit driblaram a seca em S�o Paulo. Seus l�rios sofrem com dois efeitos colaterais da estiagem: as altas temperaturas, fatais para a planta de clima temperado, e as pragas, que se proliferam com o calor. Desde o in�cio deste ano, j� perderam 17% da produ��o.
A florida Holambra � um dos 76 munic�pios que recebem as �guas das Bacias PCJ, sigla para os rios Piracicaba, Capivari e Jundia�, seus formadores e afluentes. Esses rios irrigam as torneiras de 5,5 milh�es de pessoas e a gera��o de uma riqueza que equivale a 6% do Produto Interno Bruto (PIB) do Pa�s. Nesse peda�o de S�o Paulo prosperam o agroneg�cio, o turismo e a ind�stria. L� est�o os morangos de Atibaia, as termas de �guas de S�o Pedro, o polo petroqu�mico de Paul�nia. Suzano, do setor de papel e celulose, Ambev, de bebidas, ArcelorMittal, da siderurgia, e Honda, do automotivo, s�o empresas com f�bricas na regi�o.
Calor
Nesse cintur�o de prosperidade econ�mica, a estiagem tem sido implac�vel, principalmente com o agroneg�cio. O produtor Celeste Dalfito Neto, 59 anos, tem duas pequenas represas em seu s�tio e j� suportou muitas estiagens. Tanto � que seus tomates e alfaces est�o vistosos nas estufas, justamente por causa da irriga��o. "Mas como j� n�o chove direito desde o ver�o passado, est� cada vez mais dif�cil conter os efeitos do calor", diz. Suas ab�boras foram atacadas por pragas t�picas de altas temperaturas. As flores dos 5 mil p�s da caf� morreram. N�o haver� colheita no ano que vem.
Os laranjais sofrem dos mesmos males. Entre 15 mil p�s de laranja, em sua fazenda na cidade de Limeira, o produtor e consultor Paulo Celso Briasioli, 65 anos, at� comemora a resist�ncia das �rvores: "Olhe aqui: tem um boa quantidade de chumbinhos, que � como chamamos as laranjas quando come�am a brotar", diz. "Com a chuva, a colheita at� pode ser bem boa."
Se n�o chover, por�m, ele prev� um baque sobre a citricultura paulista. Por amargar perdas com a queda nas exporta��es de suco, o setor encolhe e a seca pode desmotivar ainda mais os produtores. Briasioli aponta a propriedade vizinha. "Ali a laranja deu lugar � cana e � constru��o de um condom�nio industrial", diz. "Tenho um amigo que vendeu parte da terra e arrendou o resto para empresas de telefonia celular erguerem antenas. A renda � boa."
Nas cidades, os mais preocupados s�o aqueles que dependem da �gua da torneira e agora vivem sob a incerteza. O munic�pio de S�o Pedro, por exemplo, n�o recebe ajuda do santo. Est� em racionamento. L� a lavadeira Aparecida Bomtorin, a Cida, se organizou para encher as m�quinas de lavar � noite - quando a �gua � liberada - e cuidar das toalhas de um restaurante da cidade tur�stica de �guas de S�o Pedro. Em setembro, por�m, uma adutora se rompeu. N�o havia hora certa para a �gua entrar. "Vivemos o racionamento dentro do racionamento", diz. Para garantir o ganho de R$ 800 mensais, vigiava as torneiras dia e noite. Abastecia devagar as m�quinas quando dava. Lavava a roupa na madrugada. "Meu ganha p�o vem da �gua e sem ela n�o saberia o que fazer."
Contamina��o
A vis�o das bacias locais n�o traz bons progn�sticos. Em alguns trechos, os rios que inspiraram prosas e versos perderam tanta �gua que mais parecem canais de esgotos. O Piracicaba, o mais importante, est� 71% abaixo da m�dia para o per�odo. Por causa disso, as empresas p�blicas e privadas est�o preocupadas n�o apenas em garantir mais �gua, mas em assegurar sua qualidade.
Na americana Dow, que tem sistemas de tratamento, a demanda pela ultrafiltragem - m�todo mais sofisticado de limpeza - deu um salto: 45 empresas avaliam projetos. Na Servmar, especializada em po�os artesianos, a procura triplicou.
Escapar da polui��o, por�m, n�o � f�cil. Uma multinacional, que n�o quer o nome revelado, precisa de muita �gua na regi�o. Para garantir o abastecimento, estudou abrir po�os. As an�lises pr�vias, por�m, revelaram que a �gua est� comprometida com subst�ncias que danificariam os equipamentos.
Na semana passada, a regi�o acreditou que o suspense �rido chegava ao fim. No domingo choveu e, na segunda, o c�u permaneceu carregado. No fim da manh� de ter�a, 21, por�m, um vento seco e frio do Sul foi limpando a nuvens sobre Anhembi, a 180 quil�metros da capital, regi�o onde o Piracicaba des�gua. "O vento de outubro est� pior do que o de agosto, esse sim, o m�s do vento", reclama o pescador Sidnei Alves, de 46 anos. Perto do meio-dia, ele desembara�ava os peixes que, por causa da ventania, se enrolaram na rede. Se n�o se apressasse, o carregamento n�o seguiria a tempo para a Ceasa da capital.
A brisa nesse ponto tem um cheiro caracter�stico. O mesmo que se sente sobre todos os rios esverdeados desde a divisa com a capital. � um odor igual ao que sopra sobre pilhas de lixo pl�stico que a reportagem encontrou �s margens arenosas do Tiet�, na regi�o da foz do Piracicaba. Diferentemente do que ocorre com os l�rios, n�o � poss�vel fugir desse cheiro. O cheiro ran�oso e nauseante dos esgotos. As informa��es s�o do jornal
O Estado de S. Paulo.