
“Era um sonho trabalhar em uma empresa grande, mas, com o passar do tempo, vi que tudo n�o passava de ilus�o”, desabafa Fernando J�nior Antunes, de 42 anos. Depois de nove anos como metal�rgico na f�brica da Fiat, em Betim, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte, em 2014, Fernando foi atingido pela mar� que abala as ind�strias automotivas. “Fui demitido e sa� sem um of�cio. Trabalhei na funilaria, unia partes dos carros na linha de solda. Onde vou fazer isso agora?”, questiona. Desempregado, ele n�o pensa em procurar emprego em outras f�bricas no pa�s justamente por causa da crise que abala o setor. Ele quer ingressar no curso de engenharia e diz temer pelo futuro dos colegas que ainda trabalham na montadora italiana. “O medo de todos � grande. O caos est� come�ando. E a situa��o de quem est� l� vai piorar: o trabalhador ser� mais explorado do que sempre foi”, prev�.
Com o tombo de 15,3% na produ��o em 2014, a crise na ind�stria automotiva mudou o cen�rio do segmento no pa�s. Se antes as grandes f�bricas eram vistas como um emprego de realiza��o, hoje, para muitos funcion�rios, o sonho virou pesadelo. “J� foi bom trabalhar aqui, mas, atualmente, vivemos na incerteza, dormimos com medo de n�o estar empregados no outro dia”, comenta um funcion�rio da Fiat em Betim, que prefere n�o se identificar.
A tempestade que ronda quem trabalha l� se fortalece com os novos sinais do que pode vir por a�. Al�m da crise que afeta as montadoras pa�s afora, conforme mostrou ontem o Estado de Minas, segundo o sindicato dos metal�rgicos de Betim, a empresa em Minas j� revelou para a entidade ter tido queda de 11% em sua produ��o e apresentou relat�rio mostrando que est� com 25 dias �teis de perda de produ��o, entre parada t�cnica e f�rias coletivas. “Por enquanto, ningu�m fala de demiss�o, mas o clima � de inseguran�a”, afirma o presidente do sindicato, Jo�o Alves de Almeida. Segundo ele, a empresa j� sinalizou que h� excesso de funcion�rios no quadro pr�prio da companhia. “Ela diz ter 3 mil a mais do que comporta”, comenta.
Ainda de acordo com ele, o alerta vermelho vem com a poss�vel redu��o da remunera��o dos empregados a t�tulo de Participa��o nos Lucros e Resultados (PLR), que pode ser impactada pela queda na produ��o. “Depois das f�rias coletivas, a turma voltou agora a trabalhar e come�a o ano com d�vidas e contas a pagar, como IPVA e IPTU. E isso � uma preocupa��o de todos. A Fiat pagou a primeira parcela do PLR no ano passado, por�m, 45% ainda devem ser pagos. Geralmente, em 98% dos casos, a segunda parcela era paga at� 31 de janeiro, contudo, este ano, pode ser que o prazo mude e os valores tamb�m”, afirma Jo�o, que h� 35 anos trabalha na empresa e diz que � a primeira vez que v� uma crise t�o amea�adora para o setor.

Foi em 1976 que a Fiat criou a sua primeira f�brica no Brasil, em Betim. Na �poca, a empresa era vista como o emprego dos sonhos. “Tinha vizinhos e familiares que trabalhavam l� e, em 2005, por indica��o, consegui entrar. O sal�rio era muito melhor do que se pagava no mercado e, com isso, estava realizado”, conta Fernando Antunes. Por�m, segundo o ex-funcion�rio, com o passar dos anos, houve mudan�as. “O ritmo de trabalho � alucinante e os funcion�rios t�m sempre a sensa��o de que v�o ser demitidos a qualquer momento”, diz Fernando, acrescentando que trabalhava de segunda a s�bado e desenvolveu uma les�o no cotovelo em decorr�ncia da jornada estafante. “Toda empresa gosta do funcion�rio 100% apto. Quando tive o problema, sabia que seria demitido. E assim foi”, lamenta.
Com a expans�o das montadoras no pa�s, seria natural se Fernando se interessasse em migrar para outra cidade em busca de emprego. Mas, com filhos e assistindo � crise que vivem as f�bricas no Brasil, ele quer mudar de �rea. “Quando voc� entra para uma f�brica como essa, acaba aprendendo aquele of�cio e passa a n�o ter experi�ncia em outra coisa. Tinha colegas que fizeram cursos superiores na esperan�a de, um dia, subir de cargo dentro da Fiat, mas isso n�o ocorre l�. As portas nem sempre s�o abertas”, afirma. Mas, para o engenheiro mec�nico Daniel Ribeiro Filho, que entrou na empresa no ano da sua funda��o, a hist�ria foi outra. “Entrei em 1976 como estagi�rio e fui contratado dois anos depois. Trabalhar na Fiat era como ir � praia, havia um prazer imenso. Sinto muito por quem est� hoje nessas f�bricas, os tempos s�o outros”, comenta.
Investimento
A Fiat informou, por meio de nota, que conduz o maior ciclo de investimento de sua hist�ria no Brasil para modernizar a planta de Betim e desenvolver novos produtos. Est�o confirmados os recursos destinados ao projeto no valor de R$ 7 bilh�es no per�odo 2011-2016. “Ao mesmo tempo, a empresa analisa a evolu��o do mercado e, caso necess�rio, pode adotar as mesmas medidas de flexibiliza��o da produ��o implementadas no ano passado, como suspens�o de horas extras, ajustes do mix de produtos e paradas t�cnicas de curta dura��o. Conforme j� vem ocorrendo nos anos anteriores, a empresa iniciou neste m�s reuni�es com o sindicato para verificar metas e valores do Programa de Participa��o nos Lucros e Resultados. O processo est� em curso. A Fiat Autom�veis tamb�m esclarece que manteve em 2014 o quadro de empregados est�vel”, diz o texto.

Em Juiz de Fora, na Zona da Mata, as incertezas na f�brica da Mercedes-Benz j� fizeram com que muitos metal�rgicos buscassem outros segmentos. “As pessoas n�o acreditam nas promessas mais”, afirma o presidente do Sindicato dos Metal�rgicos de Juiz de Fora, Jo�o C�sar da Silva. De acordo com ele, por enquanto, n�o h� sinais de demiss�o na empresa, por�m, no ano passado, o sindicato fez um acordo com a Mercedes e 167 funcion�rios tiveram os contratos de trabalho suspensos temporariamente (no sistema de layoff). “Destes, 65 j� voltaram e 94 est�o na expectativa de regressar at� abril. Desde junho n�o temos demiss�es na f�brica, mas a apreens�o � grande”, afirma Jo�o C�sar.
Por�m, a assessoria de imprensa da Mercedes informou que 70 trabalhadores ainda ir�o retornar e os outros 100 continuar�o em layoff. A assessoria informou ainda que a situa��o � referente � mudan�a de t�cnica de processo produtivo e n�o disse se haver� demiss�es. Jo�o C�sar conta que o an�ncio de instala��o da montadora alem�, em 1996, causou alvoro�o em Juiz de Fora. Em 1999, com a instala��o da empresa, as expectativas eram altas para o mercado de trabalho. “Mas sempre vivemos na instabilidade”, comenta.
Produ��o
Cinco anos depois da inaugura��o, a unidade de Juiz de Fora produzia menos de 10% do que havia sido previsto no plano original. “At� que, em 2010, a f�brica passou a fabricar caminh�es em vez de carros. Pens�vamos que seria a cereja do bolo, mas n�o deu certo e a empresa j� informou que, em 2016, vai passar essa produ��o para S�o Bernardo e ficaremos com servi�os de tinturas de carros, entre outros”, reclama. Jo�o conta que, no in�cio, ia para Juiz de Fora muita gente de outros estados, mas, hoje, os tempos s�o outros. “Em 2012, a empresa havia demitido 140 pessoas, depois, recontratou e, um ano depois, demitiu de novo. As pessoas n�o acreditam mais nas falsas promessas, por isso, est�o mudando de �rea”, critica. Segundo o presidente do sindicado dos metal�rgicos de Sete Lagoas, Ernane Geraldo Dias, por enquanto, n�o h� demiss�es feitas pela Iveco, marca de comerciais leves e caminh�es da Fiat, mas h� o medo entre os funcion�rios da f�brica.