S�o Paulo, 24 - O crescimento dos calotes est� levando os bancos a executarem garantias de empr�stimos que est�o deixando de ser honrados, e que n�o s�o prioridade na fila das renegocia��es, por conta da paralisia da economia que afeta o caixa de pessoas f�sicas e jur�dicas. Com isso, as institui��es come�am a colecionar uma lista de bens que v�o dos tradicionais im�veis e ve�culos a aeronaves e maquin�rio da constru��o civil, setor impactado pela Lava Jato e pelo cancelamento de obras, fato que tem impulsionado o mercado bilion�rio de leil�es.
A preocupa��o dos bancos em se livrar desses bens � porque mant�-los significa acumular ativos deteriorados, que pesam nos balan�os na conta de despesas, provenientes dos custos jur�dicos, de manuten��o e avalia��o dos mesmos, fora uma maior press�o na rentabilidade que, consequentemente, reflete no �ndice de basileia - que mede quanto a institui��o pode emprestar sem comprometer o seu capital. Nas palavras de um executivo que prefere n�o ser citado, essas institui��es trocam recebimentos de cr�ditos atrasados por "tijolos", o que pode n�o ser um bom neg�cio.
"N�o necessariamente o fato de o cr�dito ter uma garantia acoplada significa que est� todo coberto. H� um aumento de garantias oferecidas, mas que nem sempre s�o fundamentais � medida que, para o banco, n�o � vantajoso ter de execut�-las", explica outro executivo, do alto escal�o de uma grande institui��o financeira.
Com o aumento dos bens desovados nas empresas de leil�es, cresceu a quantidade de trabalho, mas o interesse dos participantes est� mais voltado � compra de ve�culos diante do baixo apetite por autom�veis novos. "Cresce a quantidade, mas o resultado n�o. Os bens j� chegam valendo menos. H� uma crise de confian�a. Estamos recebendo mais caminh�es que antes n�o receb�amos, tratores da linha amarela, p� carregadeira, motoniveladora, mas que n�o t�m demanda", pontua Ronaldo Milan, da Milan Leil�es. Na empresa, o volume de bens subiu 18% no primeiro trimestre, na compara��o anual.
As aliena��es fiduci�rias s�o comuns nos empr�stimos banc�rios, mas quando os leil�es n�o t�m sucesso ou s�o cancelados, conforme o s�cio do escrit�rio Madrona Advogados, Marcelo Cosac, o bem pode se tornar um problema para o banco j� que passa a ser de propriedade da institui��o. Pior que isso, o devedor pode conseguir reconhecimento judicial da extin��o de sua d�vida com base na lei da aliena��o fiduci�ria. Ou seja, o credor acaba com uma garantia encalhada, depreciada e com baixa expectativa de recuperar o empr�stimo mal sucedido.
"Os bens ficam nos ativos circulantes, mas v�o consumindo basileia do banco. Al�m disso, h� ativos de toda sorte. Vender um apartamento no Itaim ou em Copacabana � diferente de se desfazer de um pr�dio inacabado, um terreno no Nordeste ou no interior do Amap�", admite o executivo de um banco.
Antes de ir a leil�o, negocia��es s�o feitas na tentativa de o devedor colocar em dia sua d�vida. Se tais tentativas n�o d�o certo e o banco opta por executar a garantia, o bem vai direto para leil�o. Na primeira tentativa, se o maior lance oferecido for inferior ao valor do im�vel h� a obriga��o ser realizado um segundo leil�o, conforme a lei que trata sobre o tema. Nesse segundo certame, o maior lance ser� aceito, desde que ele seja igual ao superior ao valor da d�vida e de todos os custos e despesas. S� depois, caso o bem em quest�o n�o seja vendido, � que passa a ser de propriedade definitiva do banco.
"Por um lado, o credor poder� vender o im�vel de forma privada, para quem quiser e ao pre�o que achar melhor, ou mesmo n�o vend�-lo se assim preferir, mas por outro esse im�vel a esta altura j� provou n�o ser um ativo capaz de fazer frente ao valor do saldo devedor da d�vida, virando um 'abacaxi' para o credor", explica Cosac, acrescentando que a hipoteca n�o tem essa fraqueza legal, contudo, n�o blinda o cr�dito contra eventual procedimento de recupera��o judicial ou fal�ncia.
� exatamente isso que n�o querem os bancos, afirma uma fonte de uma grande auditoria. Segundo ela, h� bancos m�dios, por exemplo, que est�o abarrotados de carros usados e sem ver no horizonte um mercado em que seja poss�vel a revenda. Depois da "bolha imobili�ria" nos Estados Unidos, diz esse executivo, muitos im�veis foram retomados pelos bancos devido � falta de pagamento. Por l�, a grande quantidade de im�veis nas carteiras dos bancos movimentaram o mercado e acabaram, como consequ�ncia, jogando ainda mais para baixo o pre�o desses ativos.
Andr� Zukerman, da Zukerman Leil�es, lembra que os gastos do banco com im�veis que n�o foram vendidos v�o al�m dos gerados pelo processo de leil�o e incluem o pagamento de impostos, limpeza, condom�nio. "O ideal � vender o quanto antes", destaca ele, lembrando que essas institui��es fazem de tudo para evitar at� o cancelamento do leil�o, por exemplo, quando o m�vel vendido ainda est� ocupado. No ano passado, a Zukerman registrou 29 cancelamentos equivalentes a R$ 8 milh�es dos R$ 400 milh�es que movimentou.
O cen�rio, de maior calote e dificuldade dos bancos de se desfazerem de bens retomados, abriu espa�o, inclusive, para plataformas como a resale.com.br, lan�ada no ano passado, com a proposta de facilitar a aquisi��o de im�veis por pessoas comuns. Segundo o s�cio-fundador da iniciativa, Marcelo Prata, somente o mercado dos chamados "m�veis estressados" movimenta R$ 50 bilh�es em todo o Brasil. Hoje a plataforma atua na venda dos im�veis retomados pelos bancos, mas, a partir de maio, tamb�m dar� publicidade aos bens de leil�es. "At� o final do ano, nossa base deve quintuplicar com o lan�amento da nova vers�o da plataforma", estima ele.
Pelas regras, os bancos t�m prazo legal de um ano, que pode ser prorrogado por duas vezes, para se desfazer dos chamados bens que n�o de uso pr�prio (BNDU). Esgotado esse per�odo sem que o bem tenha sido alienado, as institui��es contam com at� 60 dias para providenciar um leil�o, sob aviso pr�vio do Banco Central, conforme circular p�s lei 4.595. Por�m, na vis�o de um executivo de um banco, a crise atual pode fazer com que seja necess�rio flexibilizar os prazos m�ximos para que d� tempo �s institui��es se desfazerem do crescente volume de garantias executadas. O BC, procurado pelo Broadcast, informou que n�o comenta estudos em andamento e que avalia caso a caso. Como se trata de uma lei, a mudan�a teria de ser aprovada no Congresso Nacional.
Mais complexo
A garantia fiduci�ria pode perder valor tamb�m na recupera��o judicial, em que teoricamente esses credores est�o fora do processo. Mas o entendimento da lei e dos ju�zes em rela��o ao tema por vezes tem sido um problema para os bancos. Alguns tribunais podem julgar desfavoravelmente � esse credor se a garantia dada comprometer a viabilidade de recupera��o da empresa ou prejudicar a massa dos credores. Em casos recentes no setor de �leo e g�s, por exemplo, como OSX e Schahin, grandes discuss�es ocorreram sobre a quem pertenciam garantias embora estivessem designadas a cr�ditos espec�ficos.
"Existe preocupa��o em rela��o ao modelo da aliena��o fiduci�ria pela complexidade que tem havido para realizar essa garantia", diz a s�cia do escrit�rio Sergio Bermudes, Maria Azevedo Salgado, acrescentando que, alguns tribunais, excluindo o Superior Tribunal de Justi�a, cedem em favor da recuperada, tornando dif�cil a execu��o do bem.