
Tinha tudo para dar certo: sem aluguel, comida de qualidade e a possibilidade de ir at� o p�blico, aonde ele estiver. Mas, no momento em que a economia n�o vai bem, muitos empreendedores d�o marcha � r� no sonho de ter um food truck em Belo Horizonte. A febre, que come�ou h� cerca de dois anos, acompanhou a moda de S�o Paulo e a tend�ncia dos Estados Unidos e, agora, est� saturada em BH, segundo reclama quem se aventurou no ramo. Tanto � que, atualmente, s�o, em m�dia, 160 ve�culos com o servi�o nas ruas da capital, sendo que, destes, 50 est�o � venda. Quem d� adeus � �rea se queixa da concorr�ncia, do trabalho �rduo (das 6h � meia noite, todos os dias) e reconhece que � ilus�o o retorno financeiro r�pido. Com a crise, houve queda de cerca de 40% da clientela e at� a venda dos ve�culos de quem quer recuperar os gastos est� estacionada.
Com o desemprego – mal que atinge 11 milh�es de pessoas no pa�s e 1 milh�o em Minas, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica (IBGE) –, muitas pessoas apostaram na novidade do restaurante sobre rodas e na oportunidade de “surfar na onda” do que, na teoria, era o potencial do momento. “Mas essa ‘onda’ passou e agora est� em decl�nio”, comenta o analista do Sebrae-MG, Haroldo Santos Ara�jo.
Esse “desencanto” � constatado pelo presidente da Associa��o Mineira de Food Trucks, Felipe Corr�a. Segundo ele, h� uma procura grande de pessoas desempregadas, interessadas pelo ramo. Por�m, o que se esperava com o servi�o mudou. “Aumentou a procura para abrir o neg�cio, ao mesmo tempo em que caiu a demanda por esse tipo de alimenta��o. S�o 160 food trucks em BH, sendo que, destes, 50 est�o � venda”, revela. Apontando que a ilus�o com o trabalho � um dos impulsos que atrai quem busca novas formas de renda.
“Pensam que o trabalho � f�cil e que se ganha muito, mas n�o � a realidade. Quem trabalha com isso tem que se dedicar, pelo menos, 17 horas do dia. N�o � colocar o carro na pra�a e vender. Os empreendedores mal dormem para conseguir ter lucro”, comenta Corr�a. Ele diz que, no auge do servi�o, houve quem dissesse ganhar R$ 40 mil por m�s e que, na verdade, o lucro l�quido, atualmente, tem sido de R$ 4 mil. “� se dedicar de segunda a segunda. Acordar cedo, ir �s compras, fazer toda a produ��o e, depois, ir para a rua vender. O food truck n�o � a salva��o de ningu�m”, avisa, comparando a situa��o brasileira com a dos EUA. “L�, desempregados foram para as ruas e montaram esse tipo atividade. Por�m, eles s�o organizados e deu certo. Aqui, a hist�ria � outra.”.
Nos Estados Unidos, com a crise de 2008, muitos chefs fecharam seus restaurantes e foram para as ruas oferecer comida sofisticada. “Mas l� deu certo por uma quest�o cultural. O norte-americano n�o almo�a, lancha. Aqui, temos o h�bito do arroz com feij�o”, comenta Haroldo Santos. Quem est� ou esteve nas ruas sabe disso. H� dois anos, quando estourou a febre do servi�o em BH, Lucas Lincoln criou o Pasteleiro Maluco, um food truck especializado em pastel. “Na �poca, consegui beber a �gua limpa. Eram, no m�ximo, 20 carros em BH e era poss�vel vender R$ 2 mil por noite. Hoje, na pra�a do Bairro Castelo, por exemplo, s�o 65 carros e se voc� consegue vender R$ 1 mil na noite tem que dar gra�as a Deus”, diz.
Lincoln diz que o servi�o deu certo no come�o, mas, agora, ele est� vendendo o seu food truck e pensa em ter uma loja para comercializar os past�is. “As pessoas est�o perdendo o emprego e pegando o acerto para investir no ramo. Mas a realidade � mais dura do que parece”, garante. Ele acorda todos os dias �s 8h e s� volta a dormir � meia noite, quando j� desmontou todo o ve�culo. “Fico ref�m desse trabalho e n�o estou vendo a minha filha crescer. Al�m do mais, o lucro j� n�o � mais o mesmo. Tudo aumentou no supermercado: a mu�arela que comprava a R$ 12, hoje est� a R$ 19. E n�o podemos repassar para a clientela, porque a demanda j� est� caindo”, diz.
DECEP��O NOS EVENTOS o pequeno empres�rio critica ainda que, em eventos que re�nem uma grande quantidade desse carros, s�o cobrados percentuais sobre o lucro. “Pagamos, em m�dia, 30% do que lucramos no dia durante um evento no Mineir�o, por exemplo, sem contar que h� uma taxa de R$ 150 para estar l� dentro. Se voc� contar com a m�o de obra e os custos, lucra R$ 400 apenas”, diz Lincoln. Leonardo Tonidandel Schettini, dono do food truck Te dei um bolo, por exemplo, n�o vai mais em eventos. Ele conta que esses encontros s�o como loteria: nunca se sabe o n�mero certo de participantes e, muitas vezes, h� desperd�cio de comida. Ele � formado em telecomunica��es e, depois de desempregado, montou o neg�cio, h� um ano e meio. “No come�o �ramos oito restaurantes sobre rodas em BH. Nos eventos, com 2 mil pessoas, havia cliente para todo mundo. Hoje, n�o h� esse p�blico todo e s�o 70 food trucks no mesmo espa�o”, critica.
Ele conta que acorda todos os dias �s 5h e s� vai dormir meia-noite, por conta do trabalho. “As pessoas acharam que era ‘oba-oba’, mas n�o �. H� muita dedica��o, e, atualmente, com a crise, a queda nas vendas foi de 70%”, diz. Ele come�ou vendendo s� bolos, mas viu que seria necess�rio diversificar e passou a oferecer salgados, como p�o com lingui�a a R$ 10, p�o de queijo a R$ 2,50, entre outros. Para ele, s� vai sobreviver no ramo aquele que tiver diferencial. “Eu vou persistir”, garante.

Faltam compradores para os ve�culos
Com o mercado saturado, abandonar o food truck est� mais dif�cil. Aqueles que compraram ve�culos customizados e com cozinhas inteiramente adaptadas investiram entre R$ 70 mil e R$ 200 mil. Agora, os que querem vender os carros, recuperando o que foi gasto neles, est�o h� meses � espera de comprador. Tanto � que o valor da revenda, em alguns casos, est� saindo pela metade do que valeu tempos atr�s. Por isso que, sem conseguir uma boa negocia��o, os empreendedores se mant�m na rua para equilibrar as contas at� abandonar de vez o ramo.
O neg�cio de Welerson Cossenzo, mais conhecido como L�o, entra na estat�stica de 50 ve�culos � venda em BH. Ele trabalhou por mais de 20 anos na empresa de usinagem do pai, mas a crise econ�mica impactou o neg�cio da fam�lia e ele resolveu empreender. “Estudei muito sobre esse mercado e os n�meros eram mesmo muito bons”, recorda. Assim, h� um ano ele criou o Le Polentine Food Truck, que vendia sandu�che italiano, nhoque, polenta e pastel. Customizou o ve�culo em S�o Paulo e gastou mais de R$ 100 mil nele. “Mas nesse ramo tem que ter perfil e os n�meros n�o s�o t�o bons assim”, diz.
Sem conseguir se dedicar 100% � atividade, L�o conta que quando entrou no neg�cio contava com a parceria da esposa. “Mas ela quis se separar de mim, e eu n�o consegui ficar com o food truck sozinho. � necess�ria uma dedica��o exclusiva, de segunda a segunda”, diz. H� tr�s meses, ele resolveu sair do ramo e p�s o carro � venda. Pediu, a princ�pio, R$ 120 mil, com todo o maquin�rio, sendo dois fog�es industriais, duas fritadeiras uma a g�s e outra el�trica, exaustor paralelo, gerador silenciado e jogos de mesa. “Era comprar e sair para trabalhar. Mas o pessoal est� sem dinheiro e eu tive que reduzir o valor”, diz.
H� um m�s, o restaurante sobre duas rodas do L�o est� sendo vendido a R$ 65 mil. “N�o quero mais mexer com esse tipo de neg�cio. Sou consultor de vendas de lingerie. Vou investir nisso”, diz. Ele conta que muitas pessoas que se interessam pelo carro oferecem a troca por outro e, enquanto n�o o vende – para equilibrar as contas –, ele continua rodando pelas ruas, pelo menos tr�s vezes na semana.
Quando conseguir vender seu Cine food truck, Larissa Malta e o marido v�o embora do pa�s para morar na Irlanda. H� cinco meses, ela entrou no segmento de alimenta��o e, como estava no furac�o da crise econ�mica, n�o sentiu tanto a queda da clientela. “Tinha uma empresa de salgados fitness. Por�m, vimos que no mercado n�o tinha tanta sa�da e o p�blico do food truck gosta de alimentos mais cal�ricos”, diz. Ela conta que teve um bom retorno, mas acha o trabalho cansativo e os empreendedores do ramo, desunidos.