Tr�s meses ap�s o fim da greve dos caminhoneiros, os brasileiros ainda pagam a conta do movimento que parou o Pa�s por dez dias e interrompeu a recupera��o da economia. Os fretes aumentaram at� 160% para alguns produtos; a infla��o subiu 1,62 ponto porcentual de maio para c�; e at� os motoristas, que fizeram in�meras exig�ncias para liberar as estradas, continuam insatisfeitos. O resultado � uma redu��o de at� R$ 48 bilh�es no Produto Interno Bruto (PIB) deste ano e uma ruptura na confian�a - que vinha se recuperando lentamente.
A alta de apenas 0,2% na economia no segundo trimestre do ano, divulgada na sexta-feira, � um retrato desse cen�rio de deteriora��o p�s-greve. Na avalia��o de economistas, os reflexos dever�o aparecer tamb�m no terceiro trimestre, que continuar� em ritmo mais lento. "O principal preju�zo foi a quebra de confian�a do empresariado, que resultou na paralisa��o de investimentos", afirmaram os economistas da consultoria 4E Bruno Lavieri e Giulia Coelho.
Depois da greve, eles revisaram o PIB deste ano em 0,45 ponto, para 1,4%. O Santander foi ainda mais severo nas proje��es e cortou em 0,7 ponto porcentual a previs�o de PIB deste ano. O economista do banco Rodolfo Margato explicou que o aumento das incertezas provocadas pela greve levou as empresas a um comportamento de maior precau��o, o que resulta numa menor gera��o de empregos. "H� uns cinco meses, os dados do mercado de trabalho ficaram frustrantes. As incertezas do segundo trimestre intensificaram esse processo."
Em maio, para colocar fim � greve, o governo firmou um acordo com os caminhoneiros que incluiu uma mudan�a na cobran�a do ped�gio, a cria��o de uma tabela de frete e um subs�dio de R$ 9,5 bilh�es para reduzir em R$ 0,46 o pre�o do diesel. Nessa �ltima medida, parte dos ganhos ser�o corro�dos pelo aumento promovido pela Petrobr�s na semana passada. "Apesar do subs�dio do governo (para dar o desconto no pre�o do �leo), o pre�o vai aumentar", afirmou o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires.
A maior pol�mica, no entanto, ainda � a tabela de frete. Segundo o presidente da Associa��o Nacional dos Usu�rios dos Transportes de Carga (Anut), Luis Henrique Teixeira Baldez, as mudan�as promovidas pelo governo desorganizaram e trouxeram inseguran�a para as empresas. A tabela � limitada em termos de mercadorias e tipo de caminh�es, diz ele. "Ningu�m sabe como aplicar a tabela porque s�o tantas vari�veis que precisaria de umas 50 tabelas."
Ele afirma que algumas empresas aguardam a decis�o do STF (Superior Tribunal Federal) para decidir que rumo tomar. Outras est�o tentando comprar ou alugar caminh�es para fazer o pr�prio frete. A Cargill, por exemplo, estuda comprar mil caminh�es para evitar a alta do frete e a depend�ncia de empresas de transporte terceirizado. Em nota, a companhia disse que "o ambiente de contrata��o de frete continua marcado por incertezas".
Aumento
Representantes do setor produtivo t�m reclamado que o pre�o do frete explodiu em alguns segmentos. Baldez afirma que o transporte de sal do Rio Grande do Norte - respons�vel por 95% da produ��o nacional - subiu 160% para Bras�lia e 110% para S�o Paulo. Segundo ele, os produtores de arroz do Rio Grande do Sul tamb�m sentiram o efeito da tabela com aumentos de at� 40%.
Entre os produtores do agroneg�cio, as incertezas em torno do pre�o do frete t�m dificultado a realiza��o de vendas em contratos futuros. "As empresas n�o est�o conseguindo fechar contratos porque as tradings n�o sabem quanto ser� o frete no futuro", diz o superintendente t�cnico da Confedera��o da Agricultura e Pecu�ria no Brasil (CNA), Bruno Lucchi. Por causa dessa situa��o, o setor conseguiu fazer apenas 20% do volume de contratos do mesmo per�odo do ano passado.
Apesar de parte do setor produtivo garantir que o pre�o do frete subiu, caminhoneiros dizem que muitas empresas n�o cumprem a tabela. O motorista Marco Ant�nio Ferreira conta que, entre seus colegas, � comum a reclama��o de que o pre�o continua inalterado. Ele trabalha com batatas, cujo pre�o do transporte � fixado por sacos, e recebe entre R$ 5,50 e R$ 6 por unidade. "� o pre�o normal, de todos os anos."
O gerente executivo da Confedera��o Nacional da Ind�stria (CNI), Pablo Ces�rio, afirma que os efeitos da tabelamento do frete ainda n�o foram todos sentidos. "Haver� mais e chegar� � popula��o nos pr�ximos meses."
C�lculo da LCA Consultores aponta que, se o aumento do frete fosse adotado por toda economia e repassado integralmente ao consumidor, a infla��o daqui a seis messes alcan�aria 5,49%.
'Melhorou um lado, piorou outro'
O p�tio da Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armaz�ns Gerais de S�o Paulo) - onde diariamente centenas de ve�culos estacionam para descarregar alimentos que abastecem a capital paulista, mas que ficou completamente vazio durante a greve - � hoje cen�rio de reclama��es e insatisfa��es de caminhoneiros. Todos que circulam por ali dizem que "nada mudou" desde a paralisa��o. Apesar de admitirem que o diesel est� mais barato, afirmam serem poucas as empresas que pagam o frete de acordo com a tabela definida ap�s o movimento. � un�nime a opini�o de que a greve deveria ter durado mais uns dias, pois teriam conseguido mais avan�os. Nem todos acreditam, por�m, que a paralisa��o tenha valido a pena.
"Fiquei nove dias parado em Marab� (PA). N�o tinha banheiro. Dorm�amos num est�dio abandonado e os fazendeiros traziam comida pra gente. (A greve) n�o valeu a pena. Melhorou de um lado, mas piorou do outro", diz o caminhoneiro Nilson Ferreira Gomes, de 38 anos - 15 deles dirigindo.
O paulistano costuma sair de Jundia� para levar pe�as para a Hidrel�trica Belo Monte, no Par�. Na volta, para em Lagoa da Confus�o (TO) para carregar o caminh�o de melancias e entreg�-las no Ceagesp, em S�o Paulo. S�o nove dias de viagem que lhe rendem R$ 12,5 mil brutos. Antes da greve, eram R$ 12,1 mil. "� muito pequena a diferen�a. Queria menos imposto ou um plano de sa�de", diz.
Apenas as viagens de ida de Gomes at� o Par� est�o sendo pagas de acordo com a tabela do frete. As de retorno continuam como antes, j� que o transporte de frutas � pago por quilo. Sobre a redu��o do diesel, ele diz que s� em S�o Paulo o combust�vel est� acess�vel. Antes, costumava pagar R$ 3,45 o litro; agora, R$ 3,30. "Acho que n�o mudou nada. Em outros Estados, � muito mais caro." O caminhoneiro admite, por�m, que o diesel sa�a por cerca de R$ 4 no Par� at� maio e, depois de junho, caiu para R$ 3,85. A redu��o n�o o satisfez, ele gostaria que o pre�o fosse o mesmo em todo o Pa�s.
O caminhoneiro Reginaldo de Fran�a Barros, de 61 anos, transporta cer�mica e coco. Diz que continua recebendo R$ 4 mil para uma viagem de ida e volta, mas gasta R$ 1,9 mil de combust�vel e ped�gio - antes da greve, eram R$ 2,2 mil. Tamb�m precisa pagar as parcelas mensais do caminh�o, de R$ 4,2 mil. "Tenho feito quatro dessas viagens por m�s, precisaria de seis, mas n�o tem carga."
O representante do Comando Nacional do Transporte (CNT), Ivar Luiz Schmidt, entende que a redu��o do diesel e do ped�gio s�o grandes conquistas dos caminhoneiros e fazem diferen�a no bolso, mas afirma n�o haver efetividade da tabela do frete m�nimo. "� um sonho que n�o se realizou. A ANTT (Ag�ncia Nacional de Transporte Terrestre) n�o tem efetivo para fiscalizar o setor."
Na semana passada, o l�der dos caminhoneiros Wallace Landim, conhecido como Chor�o, amea�ou entrar na Justi�a para obrigar a ag�ncia a fiscalizar o cumprimento da tabela de frete. "O caminhoneiro n�o tem condi��o de enfrentar as empresas sozinho; se ele denunciar, elas n�o d�o mais frete para ele."
O presidente executivo da Associa��o Brasileira das Ind�strias de �leos Vegetais, Andr� Nasser, diz que seu setor est� pagando o "pre�o de mercado" aos caminhoneiro, o que significa R$ 15 a menos por tonelada de gr�o na compara��o com o valor tabelado. "A tabela � ilegal."
Como ainda restam 29 milh�es de toneladas de soja e milho para serem exportados neste ano, o setor dever� economizar R$ 435 milh�es ao n�o pagar o valor tabelado. A constitucionalidade da tabela do frete est� em discuss�o no Supremo Tribunal Federal. Procurada, a ANTT disse estar realizando consulta p�blica para regulamentar a tabela. As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.
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ECONOMIA
Tr�s meses depois, caminhoneiros seguem insatisfeitos
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