Ap�s oito meses de impasse entre a Petrobras e a Enel, o governo decidiu repassar aos consumidores o aumento do custo do g�s para abastecer a usina Termofortaleza. Uma portaria publicada na edi��o desta segunda-feira, 1�, do Di�rio Oficial da Uni�o autoriza o acionamento da termel�trica por 90 dias em condi��es excepcionais, descritas no documento. A portaria ficar� em consulta p�blica por apenas cinco dias.
A Petrobras quer reajustar o pre�o do g�s fornecido para a usina da Enel, estabelecido em um contrato firmado na �poca do racionamento de energia. A Enel, no entanto, possui contratos de fornecimento para distribuidoras de energia, que atendem ao consumidor final, e n�o aceita rever os valores, pois n�o teria como repassar esse custo.
Uma disputa judicial entre as duas empresas resultou numa liminar favor�vel � Petrobras, que deixou de fornecer g�s para a usina no dia 27 de fevereiro. Desde ent�o, a termel�trica est� parada, sem produzir. Para cumprir os contratos de energia com as distribuidoras, a Enel teria que repor os volumes por meio de compras no mercado � vista.
Apesar de o problema estar circunscrito �s duas empresas, o Minist�rio de Minas e Energia (MME) decidiu intervir. Para a pasta, manter a usina de Fortaleza parada � mais dispendioso para o sistema como um todo, pois obriga o governo a acionar outras termel�tricas a �leo, mais caras, pelo crit�rio fora da ordem de m�rito.
A t�rmica da Enel funciona a g�s, fica no munic�pio de Caucaia, no Cear�, e integra o complexo industrial e portu�rio do Pec�m, a 50 quil�metros de Fortaleza. Ela tem capacidade instalada de 326,6 MW e custo de R$ 173,69 por megawatt-hora (MWh). Com o reajuste do g�s pedido pela Petrobras , o valor da energia vendida pela usina vai triplicar e atingir R$ R$ 524,69 por MWh. A diferen�a, de R$ 351,00 por MWh, ser� cobrada dos consumidores residenciais e livres de todo o Pa�s, por meio de uma taxa, o Encargos de Servi�o do Sistema (ESS).
Para os clientes residenciais, o custo ser� repassado na data do reajuste tarif�rio anual de cada distribuidora. J� os consumidores livres, como ind�strias, ter�o que pagar o aumento de custo mensalmente.
O presidente da Associa��o Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia (Abrace), Edvaldo Alves de Santana, disse n�o haver justificativa para a medida. Ele questionou o uso de uma portaria para resolver um problema entre duas empresas e acusou o governo de dar aval ao descumprimento de contratos.
"Do jeito que a medida foi colocada, parece que a situa��o de suprimento de energia � muito grave, mas n�o � isso que mostram os n�meros do setor, em especial se comparados aos �ltimos anos", afirmou Santana. "J� n�o h� mais qualquer cerim�nia para o repasse de custos para as tarifas. Com mais esta 'portaria criativa', a conta para o consumidor, em 2019, vai subir mais de 10%." A estimativa da Abrace leva em conta outros penduricalhos na conta de luz.
A Ag�ncia Nacional de Energia El�trica (Aneel) � favor�vel � proposta e afirma que a medida visa preservar o estoque de �gua nos reservat�rios das hidrel�tricas. O �rg�o informou que o acionamento da termel�trica de Fortaleza ter� custo mensal de R$ 78 milh�es, R$ 16 milh�es a menos que a t�rmica mais cara acionada atualmente, de R$ 94 milh�es. Segundo a ag�ncia, se a usina funcionar pelos pr�ximos tr�s meses, o aumento na conta de luz ser� de 0,15%.
Uma das medidas mais pol�micas da portaria � o fato de que a Enel ter� garantia de recebimento do valor integral pela venda da energia, um privil�gio que nenhum agente tem hoje no setor. Devido a uma guerra de liminares no mercado que j� dura anos e que gera uma inadimpl�ncia de 80% no m�s passado, centenas de agentes est�o recebendo muito menos do que teriam direito. Para fontes do setor, o governo criou um est�mulo ao "fura-fila": todas as empresas poder�o cobrar o mesmo tratamento preferencial.
O MME, no entanto, avalia que isso n�o vai ocorrer. A pasta disse ainda que a mesma vantagem ser� oferecida a outras usinas termel�tricas atualmente paradas, como Arauc�ria, Uruguaiana e Cuiab�. Essas t�rmicas n�o possuem contratos de fornecimento de g�s atualmente e tamb�m est�o paradas. Se tiverem interesse, caber� a elas viabilizarem contratos de fornecimento de g�s. O MME disse ainda que a mesma medida j� foi adotada para termel�tricas em 2014, 2015 e 2017.
A portaria do MME prev�, no entanto, que a Enel ter� de abrir m�o de receitas adicionais caso produza energia excedente, acima dos valores contratados com distribuidoras. Esses recursos seriam revertidos para reduzir as tarifas. No entanto, na nota t�cnica dispon�vel no site do minist�rio, a empresa afirma que a portaria n�o representa "ren�ncia a nenhum direito".
Em nota, a Enel informou que a usina Termofortaleza � uma das mais t�rmicas mais eficientes e com menor custo de gera��o do Pa�s. O desligamento da usina gerou custo adicional aos consumidores de R$ 200 milh�es entre mar�o e agosto deste ano, segundo a empresa. A Enel defendeu a portaria como uma solu��o tempor�ria, mas cobrou uma resposta definitiva para o problema da usina por meio de um projeto de lei. Procurada, a Petrobras n�o respondeu at� a publica��o da reportagem.
Jabutis
Nos �ltimos meses, deputados e senadores defenderam uma solu��o para o problema por meio de emenda em medidas provis�rias e projetos de lei. No caso desses "jabutis", o valor tamb�m seria repassado �s contas de luz dos consumidores. O excesso de emendas, no entanto, levou a MP 814 a perder validade antes de ser votada. J� o projeto de lei que resolve pend�ncias das distribuidoras da Eletrobras foi aprovado na C�mara, mas ainda n�o foi apreciado pelo Senado devido a resist�ncia dos senadores em votar um projeto pol�mico antes das elei��es.
A principal diferen�a da proposta apresentada na portaria e a que estava no Congresso � o prazo de dura��o. Enquanto a portaria estar� vigente por 90 dias, at� o fim do governo do presidente Michel Temer, qualquer mudan�a aprovada no Legislativo teria validade indeterminada.
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