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Estado de Minas REFER�NCIA

Entrevista/Monica de Bolle: 'Diante da crise fiscal, ajustes s�o urgentes'

Economista se diz apreensiva com ideia de superminist�rios e superpoderes no governo


postado em 04/11/2018 01:02 / atualizado em 04/11/2018 08:37

(foto: Deisi Rezende/Agência O Dia/AE)
(foto: Deisi Rezende/Ag�ncia O Dia/AE)

Bras�lia -
A economista Monica de Bolle se tornou uma das refer�ncias no debate econ�mico brasileiro, mesmo morando nos Estados Unidos h� quatro anos. De Washington, ela avalia que a maioria dos eleitores votou em Jair Bolsonaro (PSL) com um sentimento de indigna��o e revolta contra a corrup��o e a viol�ncia que estavam muito personalizadas no PT. “Elegemos o que muitos viram como a ant�tese ao PT. O problema dos opostos � que nem sempre eles s�o a solu��o. Ir de um extremo ao outro no espectro das escolhas pol�ticas parece trazer mais danos do que benef�cios”, afirma a diretora do Programa de Estudos Latino-Americanos e Mercados Emergentes da Johns Hopkins University, onde det�m a c�tedra em ci�ncias sociais de Riordan Roett. Na vis�o dela, que declarou voto no petista Fernando Haddad, mas foi uma cr�tica ferrenha ao governo de Dilma Rousseff, a esquerda derrotada est� desarticulada e precisar� se modernizar para recuperar o espa�o pol�tico perdido. “Diante da grave crise fiscal que temos, ajustes s�o urgentes. Contudo, esses ajustes s�o impopulares, pois retiram f�lego da economia em um primeiro momento”, afirma.

Como a senhora avalia os resultados das elei��es no Brasil? O que se pode esperar do governo de Jair Bolsonaro?

As elei��es acabaram sendo, como imaginava h� um ano, uma esp�cie de referendo sobre o petismo e o antipetismo. Digo “esp�cie”, porque h� muito ainda para dissecar nessas elei��es: qual realmente foi o impacto da mensagem lei e ordem de Bolsonaro, se no Nordeste, regi�o onde mais aumentou a viol�ncia, ele perdeu? Qual o papel da bancada evang�lica no apoio � sua candidatura e, mais recentemente, na influ�ncia sobre suas pol�ticas, visto que a Frente Parlamentar Evang�lica apresentou um programa completo para Bolsonaro, incluindo uma agenda econ�mica detalhada (o manifesto intitulado “O Brasil para os brasileiros”, de 24 de outubro)? Pela primeira vez, vi a bancada evang�lica abra�ar temas da agenda econ�mica, indo, portanto, al�m dos costumes e valores da fam�lia. Com base nisso, acho que ainda temos de esperar para dizer algo de concreto sobre o governo Bolsonaro. Mas, os primeiros ind�cios s�o de que veremos um retrocesso nos direitos conquistados por segmentos importantes da popula��o. E, se isso de fato ocorrer, haver� muita turbul�ncia. Afinal, os votos em Haddad somados aos brancos e nulos quase se igualaram aos votos em Bolsonaro.

A senhora acredita que um governo liberal, como vem pregando Bolsonaro, ser� capaz de tirar o pa�s do atoleiro?


A tarefa ser� dur�ssima. Bolsonaro nada disse sobre a agenda econ�mica durante a campanha. Seu eleitorado est� claramente dividido em temas como a reforma da Previd�ncia, o ajuste fiscal, a agenda de privatiza��es, e unido em temas como viol�ncia, seguran�a p�blica e corrup��o. Minha expectativa � de que Bolsonaro iniciar� o governo tomando essas pautas como priorit�rias para ganhar capital pol�tico, deixando a pauta econ�mica para depois. N�o � toa, membros de seu c�rculo �ntimo t�m falado em n�o retomar a reforma da Previd�ncia de Temer, mas elaborar uma nova proposta. Isso levar� tempo, um tempo precioso, que n�o sei se o Brasil tem. Caso n�o tenha, veremos alguma turbul�ncia e abalos na economia. Diante da grave crise fiscal que temos em todos os n�veis, ajustes s�o urgentes. Contudo, esses ajustes s�o impopulares, pois retiram f�lego da economia em um primeiro momento. N�o estou convencida de que Bolsonaro topar� esse risco de imediato.

Do que foi apresentado at� aqui, � poss�vel dar um voto de confian�a ao governo Bolsonaro?

Eu n�o dou voto de confian�a, nem de desconfian�a. � preciso esperar para saber quem ocupar� todos os superminist�rios. Tenho algum desconforto com essa ideia de superminist�rios e superpoderes, pois, uma vez alterados, estar�o l� para ser ocupados pelos inicialmente indicados e quaisquer outros que venham depois.

Na sua avalia��o, em que dire��o deve seguir o governo Bolsonaro para recolocar o Brasil na rota do crescimento?

Minha vis�o � t�o distinta da at� agora apresentada por membros do governo Bolsonaro que nem sei por onde come�ar. Temo que a ultraortodoxia pregada por Paulo Guedes destrua o parco Estado de bem-estar social que temos, deixando os mais vulner�veis a ver navios. N�o acredito em superpoderes dos mercados, nem em intervencionismo estatal. Um pa�s t�o desigual como o Brasil precisa manter suas redes de prote��o e seus programas sociais. Precisa ter pol�ticas que garantam direitos �s minorias. Precisa ter uma vis�o sobre a redu��o das desigualdades que seja compat�vel com a prud�ncia fiscal. Precisa ter um sistema educacional que funcione. N�o precisa, de modo algum, da proposta Escola sem Partido, que se finge n�o ideol�gica quando, na verdade, assegura a morte do pensamento cr�tico e a poss�vel militariza��o das escolas. Qualquer sugest�o que eu pudesse dar � equipe de Bolsonaro � t�o diametralmente oposta a muitas de suas vis�es que pouco importa qual eu acredite ser o caminho para reduzir o emprego e aumentar a renda sem retirar direitos e redes de prote��o. O que posso dizer, estando fora do pa�s, � que os caminhos tra�ados pela equipe de Bolsonaro para a economia — especialmente a ultraortodoxia — s�o considerados ultrapassados no debate internacional.

� poss�vel classificar o governo de Jair Bolsonaro como de extrema- direita? Por qu�?

N�o h� qualquer d�vida quanto a isso. As defini��es de esquerda e direita, hoje, passam por quest�es identit�rias e de costumes, mais do que por agendas econ�micas. A centro-esquerda moderna h� muito fez as pazes com a boa gest�o econ�mica: a necessidade de voltar �s pol�ticas macroecon�micas para a estabilidade dos pre�os e para a sustentabilidade fiscal, sem perder de vista quest�es distributivas. A esquerda brasileira ainda n�o entendeu bem isso. Ainda se molda por um discurso de intervencionismo estatal que faliu v�rias vezes — a �ltima durante o governo Dilma. Agora, ela ter� de se modernizar e de se reinventar para conquistar espa�os pol�ticos. Creio que os brasileiros votaram em Bolsonaro com um sentimento de indigna��o e revolta contra a corrup��o e a viol�ncia. A imagem da corrup��o ficou colada na esquerda devido ao papel de protagonismo do PT.

A senhora vislumbra a possibilidade de supress�o de direitos no Brasil, de retrocessos na �rea social e ambiental?

De retrocessos na �rea social, sem d�vida alguma. Est�o a� propostas de revogar a legisla��o que permite casamento entre pessoas do mesmo sexo, por exemplo. Na �rea ambiental, vejo menos problema. O nosso poderoso agroneg�cio, ao contr�rio da ind�stria de transforma��o, � primordialmente exportador. Esses empres�rios sabem que os mercados externos se fechariam rapidamente caso houvesse afrouxamento das leis de prote��o ambiental e das regula��es. Por esse motivo, os vejo como um contrapeso a qualquer iniciativa que tente atropelar o meio ambiente. Sinal disso foi a desist�ncia de fundir os minist�rios da Agricultura e do Meio Ambiente, al�m da desist�ncia de sair do Acordo de Paris.

Existe algum risco de Bolsonaro seguir numa dire��o totalmente diferente da que ele indicou durante a campanha?


Ele detalhou t�o pouco ou quase nada de suas propostas que risco de estelionato eleitoral n�o h�. O que h� � o risco de decep��o e frustra��o. Afinal, muita gente depositou nele esperan�as quase inalcan��veis, como a redu��o da criminalidade e da viol�ncia da noite para o dia. Essas s�o quest�es muito complexas, que exigem um entendimento repleto de nuances. E Bolsonaro n�o � um homem de nuances.

O Brasil tem futuro? Ou o pa�s est� condenado a surtos de euforia seguidos por mergulhos em decep��es?


Todo pa�s tem futuro. Contudo, temos de entender o que estamos a fazer de n�s mesmos, assim como temos de compreender nosso entorno. Surtos de euforia e decep��o s�o a marca latino-americana em maior ou menor grau. Veja a Argentina. O que me parece � que para nos livrarmos do legado deixado pelo PT — e por seu parceiro de anos, o MDB, assim como pelo PSDB, que se omitiu em momentos importantes, conspirou em outros, e pouco fez para atender �queles que n�o viam em Bolsonaro ou no PT uma esperan�a para o pa�s —, elegemos o que muitos viram como a ant�tese ao PT.


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