
Bras�lia – Do lombo dos jegues �s garupas de motocicletas na regi�o mais pobre do pa�s, ou dos engarrafamentos � facilidade dos aplicativos na palma da m�o nos centros urbanos, at� as alternativas sustent�veis dos patinetes e ve�culos el�tricos, � ineg�vel a evolu��o dos transportes nas �ltimas duas d�cadas e meia. Com as tecnologias disruptivas, uma revolu��o est� em curso e os passageiros e motoristas come�am a enxergar a mobilidade como um servi�o capaz de prover o deslocamento da forma mais eficiente e satisfat�ria. Para a gera��o do s�culo 21, o carro perdeu o status de sonho de consumo, deixou de ser patrim�nio para se tornar uma ferramenta. Nesse cen�rio, novos atores ganham espa�o e a ind�stria automobil�stica precisa se adaptar.
A monetiza��o da mobilidade, que, por muitos anos, se concentrou na m�o das grandes corpora��es, como montadoras, empresas de transporte coletivo e governo, tomou outro rumo. Entraram na corrida as gigantes de tecnologia, como Apple, Google, pequenas startups, aplicativos de transporte, como Uber e 99, ou a sensa��o do momento, a Yellow, dos patinetes. Com os carros cada vez mais conectados, as operadoras de telecomunica��o tamb�m entram na disputa por um lugar no grid.
“A receita est� sendo dilu�da. Mais de 40% dos ve�culos vendidos s�o para locadoras. Postos de gasolina discutem criar �reas como local de parada dos carros compartilhados. H� muitas ideias novas na jogada”, diz Andrea Cardoso, diretora-executiva da Accenture para ind�stria automotiva no Brasil. No entender dela, n�o h� espa�o nem receita para todo mundo. “Quem oferecer o melhor servi�o � que vai ter a maior fatia”, afirma.
O comportamento das novas gera��es e o avan�o da tecnologia est�o acelerando as mudan�as, destaca Guto Ferreira, presidente da Ag�ncia Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI). “O carro deixou de ser um amontoado de a�o, para ser uma plataforma de servi�o. Quem traz mais tecnologia na ponta, vende mais. Mas n�o � o amortecedor, � o bluetooth, a conex�o”, diz. “Somado a isso, o comportamento dos milleniuns, voltado � sustentabilidade e ao compartilhamento, bate de frente com os modais de transporte tradicionais”, acrescenta. Outras pequenas reinven��es ou adapta��es, como o carro el�trico e os patinetes, entraram na rota. “Al�m de mudar o perfil do transporte, isso altera radicalmente a modelagem econ�mica do setor”, explica.
Contradi��es Estar preparado para trafegar nesse novo mundo faz toda a diferen�a na hora de viver do transporte. No sert�o nordestino, em S�o Raimundo Nonato, Piau�, onde, h� 25 anos, muitas pessoas ainda se locomoviam no lombo de jegues, ter acesso a aplicativos � fundamental para ganhar clientes e fazer corridas. O motot�xi Nilberto Negreiro, de 35 anos, ganha a vida em cima da motocicleta h� oito anos. Em 2018, come�ou a usar o WhatsApp como ferramenta.
“Aumentou meu movimento em 50%. Ficou mais f�cil com grupos. Ganhei clientes fixos”, conta. “Bom para alguns, ruim para outros”, brinca o colega Catarino Dario Pereira dos Santos Neto, 32, que ainda n�o tem smartphone e perde corridas em raz�o do celular obsoleto. Cidade-polo da regi�o mais pobre do Brasil, S�o Raimundo Nonato tem 34,5 mil habitantes.
A frota sobre duas rodas passou de 2.341 ve�culos, em 2006, para mais de 10 mil em 2018, uma moto para cada 3,5 pessoas, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica (IBGE). Foi um pulo de 328% em 12 anos. Bom para os jegues, que agora circulam livres e, at� 1994, antes do Plano Real, eram o principal meio de transporte no sert�o. Por�m, mais perigoso para os caroneiros e pilotos.
Jo�o Leite, socorrista do Servi�o de Atendimento M�vel de Urg�ncia (Samu), diz que o principal motivo de morte por acidente em S�o Raimundo Nonato � queda de moto. Isso, porque eles n�o usam capacete. Para piorar, se trafega com a fam�lia toda, quatro ou cinco pessoas em cima de uma motocicleta. “A gente atende de tudo, derrame, infarto, at� briga por bebida, mas nada mata mais do que TCE (traumatismo craniano encef�lico). Quem n�o se mata, fica com sequelas”, lamenta.
O mesmo problema � enfrentado nas grandes cidades com os patinetes el�tricos. O n�mero de acidentes se multiplica nas capitais brasileiras, mas, nem isso tira a atratividade do xod� da mobilidade. Sustent�vel e ideal para a chamada “�ltima milha”, aquele percurso final entre o terminal do transporte coletivo ou o estacionamento e a porta do destino, o servi�o ganhou f�s e usu�rios, apesar dos perigos.
F�cil, pr�tico, mas inseguro
A tecnologia acrescentou ovo meio de locomo��o na vida do designer gr�fico Daniel Souza, de 33 anos. Morador de Bras�lia, ele segue de um shopping, no Setor Comercial, para a casa da m�e, na Asa Norte, usando o patinete. Tamb�m aproveita, quando sai do trabalho, para dar uma volta enquanto espera a esposa busc�-lo. Souza garante que encontrou facilidade ao manusear o equipamento, pois tinha costume, quando crian�a, de andar de patinetes de alum�nio.

“A tecnologia auxilia na mobilidade e facilita a vida. Levei um dia para entender como funcionava, mas depois, peguei a manha. A dica � impulsionar o patinete at� acelerar. Faz diferen�a no dia a dia, porque, nele, a gente anda em p�, n�o se esfor�a tanto como na bicicleta. Tem o conforto do acelerador”, diz. “O �nico ponto fraco � que deveriam oferecer equipamentos de seguran�a”, completa.
A camel� Vanusia Alves Rodrigues, 44, moradora da Ceil�ndia Norte, periferia de Bras�lia, trabalha pr�ximo ao Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF). Ela afirma que utiliza o patinete cerca de tr�s vezes na semana quando precisa se deslocar at� a Rodovi�ria do Plano Piloto para resolver problemas do cotidiano. “Para n�o vir de carro, uso patinete. � mais pr�tico. N�o tem que esperar o tr�nsito, n�o precisa de lugar para estacionar. A tecnologia tem ajudado muito na melhoria de vida e na economia de tempo. Com o patinete el�trico tamb�m n�o me esfor�o tanto. S� acho que poderia ser mais barato”, opina.
Pr�ximo ao centro do poder, os patinetes tamb�m s�o utilizados por quem trabalha. � o caso do estudante Willian Lopes, 17, morador do Itapo�. Ele conta que, ao menos tr�s vezes na semana, utiliza o meio de transporte ao chegar na parada de �nibus da Esplanada. “Geralmente isso ocorre quando n�o consigo pegar o �nibus que passa em frente ao Minist�rio da Economia. Da�, vou at� a parada do outro lado da rua e fa�o o restante do trajeto no patinete. Por ser el�trico, � mais r�pido. N�o precisa usar for�a. Facilita a vida de quem � mais ocupado. Se quiser, tamb�m d� para fazer o trajeto pela Esplanada inteira ou ainda subir para a Rodovi�ria”, destaca.
O advogado Rog�rio Lima, 38, morador Jardim Bot�nico, experimentou o equipamento na Esplanada pela primeira vez. “Se eu gostar, vai virar pr�tica. O valor n�o � acess�vel, mas, com certeza, permite maior circula��o, n�o precisa esperar �nibus e nem carro”. Ainda meio t�mido, deu as primeiras deslizadas pela ciclovia. Em poucos minutos, pegou o jeito e sumiu pela pista. Ao que parece, tamb�m vai passar a ser um usu�rio fiel.