
A gest�o do ministro da Economia, Paulo Guedes, completou um ano apontada como ponto forte do governo de Jair Bolsonaro. O mercado financeiro ficou otimista com a aprova��o da reforma da Previd�ncia e o encaminhamento de outras propostas do governo ao Congresso. Por�m, alguns indicadores econ�micos indicam que o ministro tem grandes desafios a enfrentar em 2020.
O Estado de Minas ouviu tr�s especialistas sobre os cinco calcanhares de aquiles que Guedes ter� de atacar: alto desemprego, baixo n�vel de investimento, modesta produtividade da ind�stria, c�mbio vol�til, e uma balan�a comercial acanhada. Eles falam sobre como esses fatores podem desafiar a pasta do superministro neste ano.
Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domic�lios (PNAD Cont�nua), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica (IBGE), a taxa de desocupa��o do terceiro trimestre de 2019 foi de 11,8%, retrato de 12,5 milh�es de pessoas desempregadas. O �ndice caiu em rela��o ao segundo trimestre do ano, quando havia registrado 12,3%.
Parte da redu��o, no entanto, se explica pela elevada informalidade do emprego, que atingiu 41,4% da popula��o ocupada no per�odo, o maior n�vel da s�rie hist�rica.
Parte da redu��o, no entanto, se explica pela elevada informalidade do emprego, que atingiu 41,4% da popula��o ocupada no per�odo, o maior n�vel da s�rie hist�rica.
A avalia��o dos especialistas � de que a redu��o efetiva do desemprego ainda vai demorar, j� que depende da recupera��o de v�rios setores da economia. Para o professor Jos� Roberto Savoia, da Faculdade de Economia, Administra��o e Contabilidade da Universidade de S�o Paulo (FEA/USP), o estrago da crise econ�mica foi profundo. “Nos �ltimos cinco anos, tivemos 25 mil ind�strias fechando. O n�mero � assustador. O desemprego n�o vai aliviar no ritmo que a gente gostaria”, explica. O professor ainda explica que a informalidade � comum quando se sai de uma recess�o.
De acordo com o analista econ�mico e consultor Miguel Daoud, o emprego s� vai se recuperar quando for beneficiado em um ciclo virtuoso da economia. Para isso, � necess�rio que o pa�s tenha crescimento real, que depende de investimento. Segundo Daoud, para n�o ter expans�o curta, o chamado voo de galinha, � necess�rio que a rela��o entre o volume de investimentos e o PIB (o Produto Interno Bruto, a soma da produ��o de bens e servi�os do pa�s) seja de pelo menos 24%. “Por isso que os especialistas est�o dizendo que o desemprego n�o cai para um d�gito at� 2024”, diz.
INVESTIMENTOS
Apesar de festejado pelo mercado financeiro, Guedes n�o conseguiu impedir que os investimentos recuassem. Segundo o Instituto de Pesquisa Econ�mica Aplicada (Ipea), o dinheiro investido no pa�s – medido pelo indicador Forma��o Bruta de Capital Fixo (FBCF) – mingou 1% em novembro de 2019 frente a outubro. Se comparado com o mesmo per�odo de 2018, a queda foi de 1,8%.
J� a taxa de investimento nominal, que � obtida a partir da rela��o entre o FBCF e o PIB trimestral, ficou em 16,26% no terceiro trimestre de 2019. Enquanto isso, o recorde da s�rie hist�rica, apurado em 2010, foi de 21,53%. De acordo com estudo da Funda��o Getulio Vargas (FGV), a taxa de investimento do terceiro trimestre do ano passado foi a menor dos �ltimos 50 anos.
Para Jos� Roberto Savoia, o rumo que a gest�o do ministro Paulo Guedes tem tomado at� aqui levou o Brasil a ser bem-visto no mercado internacional novamente. “Existe uma aten��o muito grande de empresas e grupos estrangeiros para investir no pa�s. Muitos recursos devem vir neste ano”, afirma. Na avalia��o do professor, isso se explica pela gest�o respons�vel que o governo tem feito das contas p�blicas. “Este ano, o governo tem que fazer mais do mesmo”, diz.
'Tarefa herc�lea'
Como explica o professor Antonio Carlos Porto Gon�alves, da Escola de Economia e Finan�as da Funda��o Getulio Vargas (EPGE/FGV), os fatores econ�micos est�o interligados. “O governo n�o atua nesses fatores, mas em outros que o afetam”, destaca.
Ele analisa que o governo foi bem-sucedido at� agora em retomar a confian�a do investidor ao equilibrar as contas p�blicas. “Para o investidor, n�o pode ser um pa�s onde o governo pode quebrar.” Por�m, para Gon�alves, manter as contas em ordem e atrair o investidor n�o ser� f�cil. “� uma tarefa herc�lea”, conclui.
Miguel Daoud aponta a aprova��o de pelo menos tr�s das reformas propostas pelo governo – a administrativa, a tribut�ria e a chamada PEC do Pacto Federativo – como fundamentais para a recupera��o do investimento no Brasil.
O analista considera a reforma tribut�ria important�ssima, at� para aliviar os custos de contrata��o no pa�s e possibilitar a retomada do emprego.
No entanto, defende que, antes disso, o governo precisa focar na reforma federativa. “Voc� n�o come�a a construir a casa pelo telhado. O ministro vai ter que se virar para conciliar”, diz. Na avalia��o de Daoud, o governo est� tentando buscar a via do investimento, mas ainda n�o conseguiu.

Elevador ou escada
As vulnerabilidades da ind�stria, traduzidas na baixa produtividade, tamb�m v�o exigir mais do ministro Paulo Guedes neste ano. Pesquisa do IBGE mostra que a produtividade industrial est� caindo. A Pesquisa Industrial Mensal – Produ��o F�sica (PIM-PF), divulgada pelo instituto, registrou �ndice de 87 pontos em novembro, abaixo do recorde de maio de 2011, de 105 pontos. Os especialistas apontam que as ind�strias precisam ocupar toda a capacidade produtiva antes de poder investir e contratar e assim impulsionar o crescimento econ�mico.
Jos� Roberto Savoia, da FEA/USP, afirma que a t�nica da produtividade desta d�cada que se inicia � o dom�nio de tecnologias como automa��o e intelig�ncia artificial, que ser�o as chaves para o setor. Na opini�o de Savoia, o mais importante papel que o governo pode fazer � financiar a atualiza��o tecnol�gica das empresas por meio dos bancos p�blicos, como o Banco Nacional do Desenvolvimento Econ�mico e Social (BNDES). “Se n�s desenvolvermos mais a capacidade produtiva vamos produzir efeitos ben�ficos em cadeia. Para que nossa ind�stria possa permanecer competitiva, a tecnologia � um elemento cr�tico”, afirma.
A avalia��o de Miguel Daoud � parecida. “O crescimento da ind�stria hoje depende muito de qualifica��o e tecnologia”, diz. Para o analista, o governo pode ajudar nesse processo investindo em educa��o. “Precisamos de um plano emergencial de qualifica��o. A tecnologia sobe pelo elevador, e a qualifica��o pela escada”, afirma. Ele destaca que a ind�stria faz parte de uma engrenagem econ�mica, e n�o � poss�vel aumentar a produ��o sem atuar no todo.
D�lar incerto
As quest�es de economia internacional tamb�m devem desafiar Guedes em 2020. No ano passado, o real foi uma das moedas que mais se desvalorizaram diante do d�lar. Segundo o Banco Central, a moeda norte- americana se valorizou em 11,29% frente a brasileira, de janeiro a novembro de 2019. Por um lado, esse contexto no c�mbio pode levar � infla��o no mercado interno, j� que os produtores gastam mais para importar insumos e precisam repassar os custos para o consumidor.
Por outro, o d�lar mais caro beneficia as exporta��es, j� que quanto mais alto o d�lar, mais a empresa exportadora receber� pelo produto que vende.
Por outro, o d�lar mais caro beneficia as exporta��es, j� que quanto mais alto o d�lar, mais a empresa exportadora receber� pelo produto que vende.
O professor Jos� Roberto Savoia defende que deixar o c�mbio mais solto � uma decis�o do ministro Paulo Guedes. “O governo at� certo ponto consentiu com o d�lar valorizado. O nosso n�vel normal � por volta de R$ 4”, explica. Por isso, ele acredita que segurar o d�lar n�o deve ser uma preocupa��o t�o grande da �rea econ�mica do governo em 2020.
De fato, Guedes j� afirmou que as flutua��es no c�mbio n�o devem ser motivo de preocupa��o e que a moeda do Brasil � forte. Em novembro, numa entrevista coletiva na embaixada brasileira em Washington, o ministro argumentou que quando o juro da economia est� baixo, o ponto de equil�brio do c�mbio � mais alto. “Temos um c�mbio flutuante, ent�o ele flutua. �s vezes ele est� um pouco acima, por exemplo, quando o juro desce, a� ele sobe um pouco”, disse na ocasi�o.
Por�m, as interven��es do Banco Central para tentar conter uma alta acentuada do d�lar n�o deixaram de ocorrer em 2019. “Foram pautadas por vender reservas, o que ajuda a reduzir a d�vida interna”, afirma Jos� Roberto Savoia. Apesar de avaliar que o c�mbio ficou um pouco acima do desejado, o professor diz que as mudan�as de pre�o do d�lar foram r�pidas, mas n�o persistentes. “Ao manter esse quadro, nossa economia passa a ter mais investimentos”, diz.
Miguel Daoud avalia que tentar segurar o c�mbio ser� dif�cil este ano, devido ao cen�rio adverso da economia mundial e da incerteza sobre a tramita��o das reformas propostas pelo governo. O analista afirma que a valoriza��o da moeda americana se explica pelo fluxo de d�lares para fora do pa�s. “Havia expectativa muito grande do ministro de que a queda da taxa de juros fosse levar os investidores para a atividade. Isso n�o se confirmou. Os investidores est�o deixando o Brasil”, afirma. Daoud pensa que, apesar de improv�vel, a alta cont�nua do d�lar pode “abortar” a queda dos juros implementada pelo governo at� agora. (FQ)

Saber vender o Brasil
Outro desafio que 2020 pode trazer para Guedes � refor�ar o desempenho da balan�a comercial. Segundo pesquisa do Banco Central com mais de 100 institui��es financeiras, a expectativa dos analistas de bancos e corretoras � de nova queda do saldo comercial em 2020, com a previs�o de super�vit de US$ 39,4 bilh�es.
Em 2019, a balan�a comercial brasileira registrou super�vit de US$ 46,674 bilh�es, 19,6% abaixo do valor de 2018, de US$ 58,033 bilh�es. Esse desempenho foi o pior desde 2015. A crise econ�mica na Argentina, um dos principais parceiros do Brasil, bem como a guerra comercial entre Estados Unidos e China s�o fatores que ajudam a entender essa queda.
Em 2019, a balan�a comercial brasileira registrou super�vit de US$ 46,674 bilh�es, 19,6% abaixo do valor de 2018, de US$ 58,033 bilh�es. Esse desempenho foi o pior desde 2015. A crise econ�mica na Argentina, um dos principais parceiros do Brasil, bem como a guerra comercial entre Estados Unidos e China s�o fatores que ajudam a entender essa queda.
Quando o resultado do ano passado foi divulgado, o Minist�rio da Economia afirmou que a retra��o se explicava pela queda nas importa��es e nas exporta��es e que o objetivo da agenda comercial � aumentar a corrente de com�rcio. “N�o h� grande exportador que n�o seja grande importador. Saldo comercial n�o � m�trica relevante do desempenho comercial de um pa�s.”
Miguel Daoud avalia que o primeiro passo para um acordo comercial entre os EUA e a China, anunciado na �ltima semana, pode prejudicar o saldo comercial brasileiro. Isso porque o acordo entre as duas pot�ncias prev� que a China privilegie os produtos agr�colas dos EUA, e a for�a do Brasil no com�rcio exterior sempre foi a agropecu�ria.
Al�m disso, o analista explica que a tend�ncia de os produtos brasileiros ficarem mais atrativos no exterior com a alta do d�lar n�o est� se confirmando, j� que isso est� impactando nos custos de produ��o. J� o professor Jos� Roberto Savoia entende que 2020 tem o potencial para ser um ano melhor para o Brasil no com�rcio internacional. "A China fechou o ano com crescimento em torno de 6%. Tem vigor para continuar crescendo em 2020 e vai demandar produtos brasileiros, como gr�os, min�rio e carne”, afirma.
Por�m, ele aponta que ainda h� muito a ser feito para refor�ar o desempenho da balan�a comercial. O professor acredita que o pa�s tem muito o que melhorar na log�stica e no escoamento da produ��o, e deve buscar baratear o custo na exporta��o. “Quantidade para exportar n�s teremos”, diz.
Por�m, ele aponta que ainda h� muito a ser feito para refor�ar o desempenho da balan�a comercial. O professor acredita que o pa�s tem muito o que melhorar na log�stica e no escoamento da produ��o, e deve buscar baratear o custo na exporta��o. “Quantidade para exportar n�s teremos”, diz.
A recomenda��o de Savoia para Paulo Guedes � se tornar um vendedor da “marca Brasil” no exterior. “Nossa diplomacia vai ter um papel importante. Reduzir o ru�do com os parceiros internacionais e buscar acordos comerciais”, diz. De qualquer forma, o professor avalia que n�o ser� uma tarefa f�cil, sendo que o resultado n�o depende apenas do Brasil. “Vai precisar de empenho, mas tamb�m de sorte”, conclui.
* Estagi�rio sob supervis�o da subeditora Marta Vieira
