H� cerca de um ano, o motorista de �nibus Bernardo Barbosa, de 61 anos, espera para ter seu pedido de aposentadoria analisado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Enquanto aguarda na fila virtual, que s� tem crescido nos �ltimos meses, ele continua trabalhando. "A paci�ncia acabou. Se minha aposentadoria n�o sair logo, vou ser obrigado a entrar na Justi�a."
"Desde que come�ou essa conversa de reforma da Previd�ncia, h� mais de dois anos, todo mundo que estava perto de se aposentar correu para garantir o benef�cio. � claro que a fila iria aumentar. S� o governo n�o percebeu. Estou tentando desde fevereiro do ano passado, j� tem quase um ano. Dependo desse dinheiro. Enquanto a minha aposentadoria n�o sair, n�o posso parar de trabalhar", diz.
Afastado do emprego desde outubro, Andr� de Oliveira, de 40 anos, aguarda ser chamado para a per�cia m�dica. J� Aline Azevedo, de 29, deu viagem perdida: o sistema marcou a per�cia em duplicidade e ela vai precisar voltar no fim do m�s para ser atendida. Em busca de informa��es para a m�e, de 70 anos, a empregada dom�stica Elaine Duarte espera na fila. "Eles falam que nem precisa ir na ag�ncia e que basta tirarmos as d�vidas pelo aplicativo, mas a gente n�o tem acesso � internet."
Casos como os deles t�m sido cada vez mais frequentes. H� uma fila estimada de 1,3 milh�o de pedidos de benef�cios, esperando para serem processados.
De acordo com a presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenci�rio (IBDP), Adriane Bramante, os sistemas da Previd�ncia receberam um volume muito superior � m�dia nos �ltimos meses e ainda n�o foram atualizados para receber os pedidos de aposentadoria feitos ap�s a reforma. A fila de processos que se formou at� agora � apenas dos contribuintes que j� tinham direito � aposentadoria ainda pelas regras antigas.
"Os sistemas est�o inoper�veis: tudo o que foi pedido at� 13 novembro, antes da reforma, est� sendo analisado com lentid�o, pelo volume alto de pedidos e pela falta de pessoal. O que veio ap�s a reforma nem pode ser analisado, porque n�o se pensou em um per�odo de adapta��o dos sistemas ap�s a mudan�a", diz Bramante.
A avalia��o entre especialistas de direito previdenci�rio � que o INSS n�o estava preparado para o aumento de demanda que ocorreria naturalmente quando a reforma da Previd�ncia come�ou a ser discutida, ainda no governo Temer, em 2017, e mesmo durante a aprova��o do texto, no fim do ano passado, j� no governo Bolsonaro.
For�a-tarefa
Para tentar zerar a pilha de processos, o governo anunciou na �ltima semana a contrata��o tempor�ria de at� 7 mil militares que est�o na reserva. Eles devem receber um adicional de 30% sobre a remunera��o, a ser paga pelo INSS. A meta � zerar a fila at� setembro.
Com a for�a-tarefa composta pelos militares, a Secretaria de Previd�ncia estima um custo extra de R$ 14,5 milh�es por m�s, durante nove meses - o que daria um total de R$ 130,5 milh�es. Segundo o governo, eles devem exercer atividades como organiza��o, triagem, emiss�o de senhas e extratos, recep��o e digitaliza��o de documentos.
Bramante, do IBDP, lembra que a an�lise de processos de aposentadoria e de concess�o de benef�cios � complexa e n�o se pode esperar que os militares tempor�rios assumam essa responsabilidade. "Mesmo para atividades mais simples, de atendimento no balc�o, � complicado ter pessoas sem treinamento. Com a reforma da Previd�ncia, muitos contribuintes t�m ido �s ag�ncias para entender as novas regras e precisam de orienta��o especializada."
At� a primeira metade do ano passado, pouco mais de 10% dos servidores analisavam os pedidos. O governo quer liberar 2,1 mil para refor�ar as an�lises.
Funcion�rio do INSS h� 26 anos, Moacir Lopes, que tamb�m � diretor da Fenasps (federa��o que representa os servidores), lembra que o d�ficit estimado no passado era de 16 mil servidores e que o �ltimo concurso foi feito h� quatro anos.
"O INSS entrou numa espiral de inoper�ncia e agora o governo quer colocar militares para executarem um trabalho para o qual n�o foram treinados para fazer. Por que n�o contratar servidores aposentados do pr�prio INSS, de forma emergencial?", questiona Lopes.
Na �ltima sexta-feira, 17, o Minist�rio P�blico junto ao Tribunal de Contas da Uni�o (TCU) ingressou com pedido de medida para suspender o recrutamento dos militares, argumentando que a medida viola a Constitui��o, ao prever contrata��o de uma carreira espec�fica e sem realiza��o de concurso p�blico.
Segundo a Secretaria de Previd�ncia, a sele��o dos militares demanda um decreto presidencial e uma portaria ministerial e n�o h� previs�o legal para convocar servidores aposentados do pr�prio INSS. A autarquia tamb�m afirma que os seus sistemas come�aram a ser atualizados em agosto do ano passado e que mais da metade deles j� est� atualizada.
195 dias de espera
Na fila do INSS � espera de benef�cio, os brasileiros chegam a aguardar seis meses e meio at� uma resposta do �rg�o. Enquanto isso, o dinheiro n�o pinga na conta - � s� depois do sinal verde do governo que os valores atrasados s�o pagos, com corre��o monet�ria. A maior espera � de quem solicita o benef�cio assistencial voltado para idosos e pessoas com defici�ncia de baixa renda (o chamado BPC): s�o 195 dias, em m�dia.
A fila de pedidos no INSS transbordou ap�s a transforma��o digital do �rg�o, em 2018, que eliminou uma porteira anterior que represava os requerimentos: a necessidade de agendamento para ingressar com a solicita��o do benef�cio.
Ao retirar essa trava, o governo recebeu uma enxurrada de solicita��es e n�o teve bra�o suficiente para atender � demanda: at� o primeiro semestre do ano passado, s� 2,7 mil dos 23 mil servidores atuavam na an�lise dos pedidos, que no per�odo oscilaram entre 700 mil a um milh�o por m�s. No segundo semestre, a atual gest�o triplicou a m�o de obra que faz a an�lise, mas a heran�a acumulada ficou.
A situa��o mais dram�tica foi observada em julho do ano passado, quando os pedidos acumulados beiravam os 2,4 milh�es. No in�cio deste ano, ca�ram a 1,9 milh�o - mais de dois ter�os deles, por�m, sem uma resposta h� mais de 45 dias, prazo legal para o INSS dizer se concede ou n�o o benef�cio.
Por tr�s da fila, no entanto, a radiografia da espera � diversa. Enquanto quem pede, por exemplo, o aux�lio-doen�a, espera em m�dia 23 dias por uma resposta, h� quem fique mais de seis meses sem uma posi��o do �rg�o oficial.
No caso das aposentadorias, o tempo m�dio de concess�o � de 125 dias. No caso das pens�es, a espera fica em torno de 86 dias. No sal�rio-maternidade, a m�dia � de 63 dias.
O governo promete resolver o problema em seis meses, considerando o per�odo de abril a setembro de 2020, quando espera colocar em opera��o os 7 mil militares que pretende contratar para fun��es administrativas no INSS. O objetivo � liberar 2,1 mil servidores do pr�prio �rg�o para refor�ar as an�lises. As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.
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