O Estatuto da Igualdade Racial completa dez anos nesta segunda-feira. O dispositivo, implementado 122 anos depois da aboli��o da escravatura, trouxe uma s�rie de diretrizes para se efetivar a inclus�o da popula��o negra na sociedade. Mas, apesar de o documento refor�ar o compromisso do Brasil com a elimina��o das desigualdades raciais, pouca coisa mudou na pr�tica.
Dados do IBGE levantados a pedido do jornal O Estado de S. Paulo por Jefferson Mariano, doutor em Desenvolvimento Econ�mico e professor da faculdade C�sper L�bero, mostram que o abismo econ�mico entre brancos e negros persiste.
Em 2012, in�cio da s�rie hist�rica do IBGE, o rendimento m�dio mensal dos brancos foi 57,3% maior que o dos negros. Em 2019, quase nada havia mudado: a popula��o branca recebeu, em m�dia, 56,6% a mais que a popula��o negra.
Os n�meros tamb�m mostram que as pessoas negras ainda ocupam postos de trabalho mais prec�rios. Os dados mais recentes, de 2015, revelam que os negros eram maioria em atividades bra�ais como cultivo de mandioca (85,9%), servi�os dom�sticos (64,7%) e constru��o civil (63,9%).
Por outro lado, eles s�o minoria em �reas que exigem maior qualifica��o como inform�tica (31%), arquitetura e engenharia (26,9%) e em cargos de gest�o empresarial (23,6%). "Se a gente olhar os dados de grandes corpora��es, o porcentual de negros em cargos de lideran�a � ainda menor", pontua Mariano.
Em algumas carreiras, a presen�a de pessoas negras � t�o pequena que nem � poss�vel mensurar. Segundo o economista, isso acontece quando o porcentual de pessoas ocupando essas posi��es � menor que um. � o caso, por exemplo, da �rea de produ��o cinematogr�fica.
Dificuldades
Apesar de ser considerado um dispositivo legal importante por especialistas, o Estatuto da Igualdade Racial trouxe poucas melhorias reais para a popula��o negra. M�rio Theodoro, que foi secret�rio executivo da Secretaria Nacional de Pol�ticas de Promo��o da Igualdade Racial (Seppir) entre 2011 e 2013 e consultor legislativo no Senado, culpa o racismo. "A quest�o do racismo ainda � muito mal resolvida no Brasil", diz.
Para ele, a sociedade brasileira ainda n�o est� disposta a admitir o preconceito existente e combat�-lo.
Ele, que � doutor em Economia e autor de diversas publica��es que tratam da desigualdade racial no Brasil, afirma que o documento � um marco legal fundamental. "O Estatuto � uma boa refer�ncia. � uma pe�a a ser utilizada numa pol�tica de igualdade racial", avalia.
Uma barreira encontrada por Theodoro ao tentar criar pol�ticas p�blicas para efetivar o cumprimento do Estatuto foi a desinforma��o. Poucos gestores conheciam o documento e suas diretrizes. "Tentamos mudar isso, mas n�o � f�cil."
Ele fala que tentou propor algumas a��es para tentar diminuir a desigualdade racial, mas n�o obteve sucesso. Uma das propostas era liberar empr�stimos do BNDES apenas a empresas privadas que contassem com programas de a��es afirmativas. As institui��es que desejassem participar de licita��es p�blicas deveriam cumprir o mesmo crit�rio. "N�o conseguimos nem convencer nossos pais de que isso era fundamental."
Pequenos avan�os
Um dos artigos do Estatuto ressaltado pelos especialistas � o que trata da ado��o de a��es afirmativas para acesso ao ensino superior e ao trabalho. "A cota � a �nica pol�tica em vigor no Brasil para reverter esse c�rculo vicioso que mant�m a popula��o negra em uma posi��o inferior", afirma M�rio Theodoro.
Os resultados da pol�tica de cotas j� podem ser observados. Dados do IBGE mostram que a presen�a de negros nas universidades dobrou entre 2011 e 2019, passando de 9% para 18%. Os n�meros s�o referentes a estudantes que frequentam o ensino superior na idade adequada, entre 18 e 24 anos. "Ainda vemos uma grande desigualdade, mas j� h� um avan�o t�mido", fala Jefferson Mariano.
Mas, diferentemente das cotas sociais, as cotas raciais enfrentaram - e ainda enfrentam - uma grande resist�ncia entre os brasileiros. Theodoro diz que, mais uma vez, � o racismo se manifestando. "O problema � que a cota veio para mudar a cor da elite. Para que a elite tenha a cor mais parecida com seu povo."
Para Mariano, dificilmente as a��es de combate � desigualdade racial ter�o espa�o no Pa�s durante o governo Bolsonaro. "Esse tema n�o faz parte da agenda do grupo � frente do governo", afirma.
A principal preocupa��o do economista � que as poucas conquistas sejam perdidas. "J� vemos um retrocesso devido ao esvaziamento de setores de discuss�o sobre o tema." As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.
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