O transporte interestadual de �nibus come�ou a viver uma nova fase de abertura de mercado desde dezembro do ano passado, quando o governo publicou um decreto presidencial para facilitar a entrada de novas empresas no setor, ampliando a concorr�ncia, os destinos de viagens e o pre�o das tarifas. Nove meses depois do decreto, a mudan�a come�a a mostrar resultados, mas o setor acabou convertido em campo de batalha judicial.
Dados da Ag�ncia Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), respons�vel por regular e fiscalizar o transporte interestadual, apontam que, em nove meses, as mudan�as j� s�o alvos de 22 a��es judiciais movidas por empresas e associa��es do setor, medidas que incluem uma A��o Direta de Inconstitucionalidade (ADI). O governo j� venceu em 18 a��es e foi derrotado em apenas uma. Outras tr�s seguem em tramita��o.
O governo evita falar sobre o assunto, mas v� com preocupa��o as tentativas do setor em derrubar as mudan�as. O Minist�rio da Infraestrutura, que � o principal defensor das mudan�as que passaram a vigorar em dezembro, enfrenta um lobby pesado das empresas dentro do Congresso. Elas tentam derrubar o decreto presidencial.
Pelo regime que vigorava at� ent�o, as empresas de �nibus atuavam por meio de um "regime de permiss�o" dado pela ANTT, que exigia a atua��o do governo para garantir o equil�brio dos contratos, regulando as tarifas e os servi�os (itiner�rio e frequ�ncia). Com a mudan�a, n�o h� necessidade de interven��o do poder cedente para manter esse equil�brio e a tarifa � praticada livremente, com liberdade de itiner�rio e frequ�ncia. A concorr�ncia, portanto, ocorre nos mercados.
O governo alega ainda que a presta��o de servi�os favorecia a forma��o de monop�lios. O decreto passou a estabelecer que a presta��o de servi�os n�o tem mais limites por empresas, aumentando a concorr�ncia criando oportunidades para novos mercados. A atua��o passa a se dar por meio de manifesta��o de interesse, comprovadas as condi��es m�nimas de prestar os servi�os. Al�m disso, os pr�prios interessados avaliam os riscos e as oportunidades de empreender em determinado trecho. Basicamente, � dessa forma que funciona hoje, por exemplo, a concess�o de terminais portu�rios privados.
Rea��o
As empresas que atuam no setor, por�m, afirmam que as medidas precarizam a presta��o de servi�os e querem derrubar as mudan�as. Como destacou o Broadcast Pol�tico, sistema de not�cias em tempo real do Grupo Estado, senadores tentaram deliberar - em vota��o simb�lica - na �ltima quinta-feira (6) um projeto que pode inviabilizar o modelo atual. De autoria do senador Weverton Rocha (PDT-MA) e relatado pelo senador Marcos Rog�rio (DEM-RO), o projeto de decreto legislativo (PDL) tem a miss�o espec�fica de derrubar o decreto editado pelo Executivo no fim do ano passado. A vota��o, que acendeu um alerta no governo, acabou sendo suspensa, mas pode voltar ao plen�rio nesta semana.
Pelos dados da ANTT, desde que o setor foi aberto, 27 novos destinos j� foram aprovados pela ag�ncia. O potencial de crescimento do setor � exponencial. O Brasil tem hoje cerca de 40 mil destinos interestaduais em viagens de �nibus, com 187 empresas que atuavam no setor. O n�mero de munic�pios atendidos por linhas regulares � de 2.060. Segundo levantamento da ANTT, caso todas as autoriza��es acumuladas na ag�ncia entrassem em vigor, o setor viveria uma revolu��o, com cerca de 90 mil destinos, atua��o de 260 empresas e cobertura de 2.585 cidades.
Essa n�o � a vers�o das empresas do setor. O diretor executivo da Associa��o Nacional das Empresas de Transporte Rodovi�rio de Passageiro (Anatrip), Clayton Vidal, afirma que o governo, ao estabelecer que a outorga de presta��o regular do servi�o seja concedida mediante simples autoriza��o, passa a permitir que as viagens sejam feitas "�s margens, portanto, de qualquer controle ou sele��o pelo Estado".
Segundo o executivo da Anatrip, que representa 21 empresas do segmento, o cen�rio atual permite "a abertura completa desse mercado � iniciativa privada e, consequentemente, a submiss�o dos usu�rios ao risco de precariza��o ou, at� mesmo, a paralisa��o dos referidos servi�os, e sem a ampla participa��o popular na discuss�o desse assunto e, consequentemente, sem a an�lise do impacto regulat�rio, previsto em lei".
Causa e efeito
A Anatrip enumera diversas consequ�ncias que, em seu entendimento, s�o causadas pelo decreto presidencial, como restri��o aos direitos dos usu�rios, por causa do reflexo direto na qualidade dos servi�os prestados; limita��o do direito de locomo��o dos idosos, das pessoas portadoras de defici�ncia, e dos estudantes, devido � extin��o dos direitos relacionados ao passe livre; e fim do car�ter de regularidade do servi�o, pois as empresas passar�o a realizar as viagens s� depois que a lota��o assegurar a sua rentabilidade. A associa��o afirma ainda que a obriga��o das empresas de fazerem a cont�nua renova��o de suas frotas de �nibus seria extinta.
Os empres�rios criticam ainda a afirma��o de que promovem um monop�lio no setor. Argumentam que, em 2.014, o sistema interestadual era operado por 168 empresas, por meio de 54.766 liga��es e transportava 99 milh�es de passageiros por ano. Dados de 2018 mostram que o sistema era operado por 217 empresas, com 89.137 liga��es e transporte 84 milh�es de passageiros. "Embora a demanda de passageiros tenha diminu�do cerca de 16%, a oferta de servi�o aumentou 62% e a quantidade de operadores, tamb�m aumentou cerca de 30%", diz Clayton Vidal.
A Associa��o Brasileira das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros (Abrati), que tamb�m representa as empresas, declarou que "confia na capacidade de di�logo e constru��o dos Poderes Legislativo e Executivo em formatar o regime jur�dico que atenda aos anseios da sociedade, aos direitos e � seguran�a dos passageiros".
Segundo a associa��o, "o Brasil passa por um momento de enormes desafios e a seguran�a jur�dica e previsibilidade regulat�ria s�o valores irrenunci�veis para que haja investimentos e preserva��o de empregos".
ECONOMIA