As expectativas em rela��o ao desempenho da economia brasileira em 2020 at� melhoraram, ap�s a divulga��o de dados mais recentes, de junho e julho, mas a pandemia de covid-19 levou a um tombo hist�rico no Produto Interno Bruto (PIB, o valor de tudo o que � produzido na economia) do segundo trimestre, assim como ocorreu em praticamente todos os pa�ses, confirmou nesta ter�a-feira, 1.� de setembro, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica (IBGE). A retra��o de 9,7% em rela��o aos tr�s primeiros meses do ano � a maior da atual s�rie hist�rica do IBGE, iniciada em 1996, mas, segundo c�lculos de pesquisadores da Funda��o Getulio Vargas (FGV), n�o h� registro de um trimestre com desempenho pior desde 1980.
Foi tamb�m o segundo trimestre de retra��o - a queda do primeiro trimestre em rela��o ao quarto trimestre de 2019 foi revisada para 2,5%, ante o 1,5% inicialmente informado -, primeira vez que isso ocorre desde 2016. As duas retra��es seguidas caracterizam uma "recess�o t�cnica", classifica��o comumente usada no mercado financeiro, embora o comit� independente da FGV dedicado a analisar os ciclos econ�micos j� tivesse marcado o in�cio da recess�o no primeiro trimestre.
A queda do PIB no segundo trimestre foi t�o pior do que em outras crises porque "nunca antes se prop�s uma pol�tica que fosse desligar a economia", diz Eduardo Zilbermann, professor do Departamento de Economia da PUC-Rio, numa refer�ncia �s regras de restri��o ao contato entre as pessoas, como forma de estancar o avan�o da covid-19. Em outras crises econ�micas - causadas por infla��o, desequil�brios nas contas externas ou bolhas financeiras, etc. -, as empresas entram em dificuldade, suspendem investimentos e demitem funcion�rios, ou a renda das fam�lias � corro�da, e elas consomem menos.
Assim, nas outras crises, as lojas vendem menos do que o normal, amargam receitas menores, mas seguem vendendo. Ind�strias veem a demanda caindo, o estoque come�a a encalhar nas f�bricas e reduzem a produ��o, mas seguem produzindo. S� que o "desligamento" provocado pela pandemia fechou lojas, que n�o podiam receber clientes, e f�bricas, que n�o podiam aglomerar trabalhadores. Vendas e produ��o foram para perto de zero.
Como explica Zilbermann, o PIB � uma medida de fluxo, de quanto se produz continuamente ao longo do tempo. Assim, mesmo que a parada para valer tenha ocorrido em abril, o fundo do po�o da economia, a reabertura gradual a partir de maio e junho foi insuficiente para salvar o PIB do segundo trimestre, formado por essa produ��o cont�nua em cada um dos meses.
O quadro catastr�fico s� n�o foi pior por causa das medidas adotadas pelo governo para mitigar a crise, com destaque para o aux�lio emergencial de R$ 600 ao m�s pago aos mais pobres e aos trabalhadores informais. Desde junho, estudos t�m apontado que os pagamentos de emerg�ncia chegaram a elevar a renda dos mais pobres, reduzindo, temporariamente, a pobreza. Ainda assim, esse impulso n�o impediu o tombo de 12,5% no consumo das fam�lias ante o primeiro trimestre.
O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, que, em maio, chegou a estimar uma retra��o de 17,3% no PIB do segundo trimestre, j� havia revisado sua proje��o, na semana passada, para uma queda de 9,7%. Al�m do impulso do aux�lio emergencial no consumo, contribu�ram para a melhora do quadro, na vis�o de Vale, a baixa ades�o dos brasileiros � quarentena, que manteve alguns com�rcios funcionando, e o crescimento do agroneg�cio. O PIB da agropecu�ria teve o melhor desempenho entre os componentes da oferta, com alta de 0,4% ante o primeiro trimestre.
"H� commodities que n�o s�o agr�colas, mas tamb�m se beneficiaram do aumento da demanda chinesa e do c�mbio, como min�rio de ferro e tamb�m petr�leo, num grau menor. Se voc� junta esses segmentos todos, estamos falando de 35% a 40% do PIB com retorno positivo no primeiro semestre", afirma Vale.
Ainda pelo lado da oferta, os servi�os, que respondem por cerca de 70% do PIB, encolheram 9,7% em rela��o ao primeiro trimestre, e a ind�stria tombou 12,3%. Com as empresas adiando compra de maquin�rio e obras suspensas, a forma��o bruta de capital fixo (FBCF, medida dos investimentos no PIB) despencou 15,4% em rela��o aos tr�s primeiros meses do ano.
Os rumos a crise
No cen�rio de Br�ulio Borges, economista s�nior da LCA Consultores, a din�mica global da recess�o poder� ditar os rumos da crise. O fato de todas as economias do mundo terem sido atingidas, de forma semelhante e mais ou menos ao mesmo tempo - apenas a China, onde a covid-19 surgiu, foi atingida um pouco antes -, � uma das caracter�sticas in�ditas da crise. Para ele, a recupera��o poder� acabar sendo ditada pela din�mica internacional, que, por sua vez, � marcada pelas medidas de mitiga��o adotadas pelos principais pa�ses.
Por isso, na vis�o de Borges, o desempenho da economia no Brasil poder� ser melhor do que o dos vizinhos da Am�rica Latina, porque os brasileiros n�o respeitaram a quarentena e pela falta de coordena��o na a��o dos governos federal e locais - ao custo de mais mortes pela covid-19 - e por causa do tamanho das medidas emergenciais.
Nas contas do Observat�rio de Pol�tica Fiscal do Ibre/FGV, as pol�ticas do governo federal somam 11,5% do PIB - 8,27% do PIB em a��es com gastos fiscais e 3,21% do PIB em medidas de "cr�dito fiscal", voltadas para empr�stimos. O pacote est� praticamente no mesmo n�vel do dos Estados Unidos, que soma 11,6% do PIB.
"O pacote de suporte fiscal no Brasil foi muito elevado. At� mais elevado do que se poderia imaginar, dada a situa��o fiscal", afirma Borges.
Para Zilbermann, da PUC-Rio, a economia brasileira est� numa "encruzilhada". Por um lado, no momento mais imediato, as medidas emergenciais impulsionam a economia e podem ajudar na recupera��o nos pr�ximos meses. Por outro lado, os gastos p�blicos associados �s medidas amea�am o equil�brio fiscal nos pr�ximos anos. Desequil�brios poder�o elevar o risco pa�s e a cota��o do d�lar e afastar investidores, o que tiraria �mpeto da recupera��o da economia.
A sa�da, segundo o professor, seria o governo sinalizar claramente que a eleva��o de gastos � tempor�ria, tem data para terminar, e que o equil�brio das contas voltar� no m�dio prazo.
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