'O maior erro dos investidores � o excesso de confian�a'

O economista americano Richard Thaler, de 75 anos, pr�mio Nobel de Economia em 2017, � um dos expoentes da chamada "economia comportamental�, a corrente que estuda os efeitos da psicologia nas decis�es econ�micas. No best-seller Nudge - Um Pequeno Empurr�o, escrito em parceria com o jurista Cass Sunstein e publicado em 2009, Thaler questiona a premissa de que os indiv�duos tomam decis�es econ�micas de forma racional - adotada como verdade absoluta pelos economistas cl�ssicos e neocl�ssicos - e apresenta um roteiro para ajudar a prevenir as escolhas erradas que fazemos em nossas vidas.

Nesta entrevista ao Estad�o, realizada por e-mail, Thaler fala sobre como a pandemia est� mudando o comportamento das pessoas e como isso vai moldar o mundo daqui para a frente. Fala tamb�m sobre os erros cometidos pelos investidores e sobre o que fazer para evit�-los. "O maior erro que os investidores cometem � o excesso de confian�a", afirma Thaler, que dar� uma palestra por v�deoconfer�ncia nesta segunda-feira, no Congresso Brasileiro de Mercado de Capitais, promovido pela B3 e pela Associa��o Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima).

Como a pandemia afetou o nosso comportamento econ�mico e social e de que forma isso pode moldar as nossas vidas no futuro?

A pandemia � um momento determinante para o mundo. Desde o come�o de mar�o, a vida mudou para a maioria de n�s. Tornou-se um teste para todos. Eu mesmo fui atingido em muitos aspectos por ela. Primeiro, a doen�a est� tornando as nossas sociedades j� desiguais ainda mais assim�tricas. Nos Estados Unidos, as classes mais educadas n�o est�o sofrendo muito, a n�o ser quando contraem a doen�a. As pessoas est�o trabalhando em casa e lutando para educar os pr�prios filhos e cozinhar as suas pr�prias refei��es. Mas, para a maioria, os meios de vida n�o foram amea�ados. Os mais abonados est�o at� refor�ando a poupan�a, porque n�o t�m em que gastar seu dinheiro.

No caso dos menos privilegiados, como foi o impacto da pandemia?

Os que trabalham na �rea de servi�os, especialmente em restaurantes, hot�is e companhias a�reas, sofreram um duro golpe financeiro, e os profissionais de sa�de que est�o atuando na linha de frente da pandemia est�o arriscando as suas vidas diariamente para cuidar dos doentes. Com certeza, trata-se de um grande teste para qualquer l�der pol�tico e alguns est�o claramente se dando melhor do que outros. N�o consigo me lembrar de outra �poca em que tenha havido tanta incerteza. Todos n�s estamos vivendo um dia de cada vez - e � prov�vel que continue assim pelo menos por mais um ano, at� surgirem vacinas para combater o v�rus. S�o tempos assustadores.

O que mais chamou a sua aten��o em termos de comportamento econ�mico na pandemia?

Em muitos casos, o comportamento mudou bem antes da ado��o das medidas de isolamento social. A frequ�ncia a restaurantes e a realiza��o de reservas a�reas, por exemplo, ca�ram rapidamente em meados de mar�o, bem antes de as empresas fecharem. As pessoas t�m bom senso. Bom, ao menos algumas pessoas t�m.

Ao contr�rio do que diz a teoria econ�mica cl�ssica e neocl�ssica, o sr. afirma que, muitas vezes, as nossas decis�es econ�micas s�o irracionais. Como isso afeta as pessoas, os mercados e os pa�ses?

Eu n�o gosto muito de usar a palavra "irracional". Ser racional tem um significado especial em economia e o primeiro problema foi com os modelos que se baseiam em suposi��es irrealistas sobre comportamento. � claro que muitas pessoas s�o ing�nuas sobre muitos aspectos de seu bem estar financeiro. Por isso, � importante que a gente as ajude sempre que poss�vel. Mas algumas vezes, as pessoas pensam que eu estou criticando os seres humanos. � uma interpreta��o equivocada. N�o � que as pessoas s�o burras. O mundo � que � duro.

Como a gente pode se proteger contra a nossa pr�pria irracionalidade econ�mica?

H� muitas coisas que podemos fazer para nos proteger de nossas falhas. Todo mundo sabe que, �s vezes, n�s esquecemos das coisas. Por isso, fazemos listas. Colocamos alarmes para nos acordar e escrevemos compromissos importantes nos nossos calend�rios, para n�o perd�-los. Em quest�es financeiras, muitas fam�lias podem se beneficiar se fizerem as coisas de forma autom�tica. Para muita gente, a melhor e talvez a �nica forma de poupar � se o dinheiro for tirado diretamente de seus contracheques antes que tenham a chance de gast�-lo. Os governos podem ajudar ao criar mecanismos que permitam que cada trabalhador possa direcionar diretamente uma parte de seu sal�rio para a poupan�a. Tamb�m � importante oferecer estrat�gias sensatas de investimento, para que as pessoas n�o tenham de se tornar gestoras de seus pr�prios portf�lios. N�s n�o fazemos cirurgias em n�s mesmos. Chamamos m�dicos para faz�-las para n�s. Com o nosso dinheiro, deveria acontecer a mesma coisa.

O professor Robert Schiller, tamb�m Pr�mio Nobel de Economia, certa vez afirmou que �� o esp�rito animal que faz a economia andar� e que tomamos decis�es com base na intui��o, e n�o na raz�o. Como isso se encaixa na sua teoria sobre os erros que cometemos nas nossas decis�es?

Esp�rito animal � um termo confuso. Eu prefiro pular esta pergunta.

Se o sr. pudesse fazer uma �nica recomenda��o relacionada ao comportamento dos investidores no mercado, qual seria ela? Por qu�?

O maior erro que os investidores cometem � o excesso de confian�a. O maior perigo � quando as pessoas acham que podem selecionar uma a��o espec�fica para tentar "bater o mercado". Os fatos mostram que a maioria dos gestores ativos (que selecionam pap�is espec�ficos para investir, em vez de montar uma carteira que espelhe os �ndices de mercado) fracassa ao fazer isso. � dif�cil. Sou diretor de uma empresa de gest�o de recursos que adota uma estrat�gia ativa no mercado, mas n�s contratamos pessoas muito inteligentes, damos a elas acesso a toneladas de informa��o e - mais importante - disciplina, para conseguir bons resultados. Quando falo em disciplina, quero dizer que n�s tentamos apostar nos erros previs�veis dos outros. Isso � mais f�cil do que tentar evitar os pr�prios erros.

Na pr�tica, o que isso significa?

Por exemplo: pode haver uma estrada com uma curva perigosa. Prever que haver� colis�es ali � f�cil. Agora, se voc� receber um empurr�o ou um est�mulo, talvez possa evitar de se envolver em batidas. Nos Estados Unidos, muitas pessoas come�aram a negociar por conta pr�pria na Bolsa durante a pandemia. Pode ser que tenham feito isso porque estavam entediadas e porque, durante um tempo, as apostas na �rea esportiva estavam suspensas. Ao longo desse per�odo, o mercado subiu na maior parte do tempo, especialmente os pap�is das grandes empresas de tecnologia, que s�o populares com pessoas f�sicas. Isso elevou o risco de haver excesso de confian�a. Ser� que elas saber�o quando chegar a hora de vender e sair do mercado? Eu duvido.

Numa escala de irracionalidade nas decis�es econ�micas de pa�ses, em qual posi��o o sr. colocaria o Brasil?

Dada a situa��o pol�tica no meu pa�s, n�o me sinto credenciado a fazer julgamentos sobre governos de outras na��es. Vamos apenas dizer que nenhum dos nossos governos est� indo bem em lidar com a covid-19, especialmente em compara��o com pa�ses como a Nova Zel�ndia.

O sr. investiria seu dinheiro no Brasil agora? Em qual ativo?

Eu n�o fa�o previs�es sobre pa�ses.

O sr. est� escrevendo um novo livro? Sobre o que ser�?

Sim. Quer dizer, mais ou menos um novo livro. O Cass Sunstein e eu estamos terminando agora uma grande revis�o do nosso livro Nudge - Um Pequeno Empurr�o. O t�tulo ser� Nudge - A Edi��o Final. Deve ser publicado no pr�ximo ver�o (inverno no Brasil). Eu diria que ser� um livro, no m�nimo, 50% novo. Ter� muitos t�picos totalmente novos, incluindo um sobre o Sludge, que � o empurr�o do mal. Este tem sido o meu projeto na pandemia.

Que livros o sr. est� lendo agora?

Comecei a ouvir o �udio do novo livro do (ex-presidente) Barack Obama, que � narrado por ele mesmo. � muito agrad�vel.

As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.