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Estado de Minas ECONOMIA

'Estavam abaladas as premissas de independ�ncia', diz diretor da Petrobras


21/02/2021 16:01

Marcelo Zenkner j� havia decidido deixar em mar�o o cargo de diretor executivo de governan�a e conformidade da Petrobras antes de o presidente Jair Bolsonaro anunciar, na sexta-feira passada, a substitui��o do presidente da estatal, Roberto Castello Branco. Zenkner, que fez carreira no Minist�rio P�blico do Esp�rito Santo, alega raz�es pessoais para a decis�o, mas disse, em entrevista ao Estad�o, que constatou que seu "ciclo havia chegado ao final" porque percebeu no fim do ano passado riscos para o sistema de integridade e para "as premissas fundamentais de independ�ncia e autonomia da empresa". "Percebi que o ambiente pol�tico estava se alterando profundamente. H� muitos sinais negativos, uma mudan�a na agenda pol�tica."

A entrevista foi concedida antes de Bolsonaro comunicar a mudan�a no comando da estatal. A Diretoria Executiva de Governan�a e Conformidade � uma das oito da Petrobras e foi criada em 2014 ap�s as revela��es da Lava Jato. Zenkner defende a opera��o e diz que est� em curso no Pa�s "um flagrante processo de desmoraliza��o" das pessoas que se dedicaram ao combate � corrup��o. "Trabalhei na Petrobras e pude presenciar com meus pr�prios olhos os estragos causados pela corrup��o, que a duras penas est�o sendo reparados. N�o podemos admitir retrocessos."

Por que o sr. decidiu n�o renovar seu mandato como diretor?

Tinha uma contribui��o a oferecer e acho que deixei um legado importante. No in�cio de janeiro deste ano, manifestei ao CEO (Roberto Castello Branco) meu desejo de n�o renovar meu mandato por quest�es pessoais, as quais nada t�m a ver com a gest�o atual da Petrobras, pois o meu relacionamento com a diretoria executiva e com os integrantes do Conselho de Administra��o sempre foi excepcional, todos sempre apoiando profundamente os projetos da Diretoria de Governan�a e Conformidade.

A empresa est� menos suscet�vel a casos de corrup��o?

O atual sistema de integridade da empresa, tanto nos aspectos de governan�a como de conformidade, � robusto e est� consolidado. Jamais chegou ao meu conhecimento qualquer caso de fraude ou corrup��o, seja brando, m�dio ou grave. A alta administra��o da empresa � t�cnica e independente e, al�m disso, eu tenho uma equipe entrosada, leal e competente.

A Petrobras tem sido alvo de interfer�ncia pol�tica? Pesou em sua decis�o o atual ambiente pol�tico? A empresa est� sendo afetada?

J� no final do ano passado considerei que minha miss�o estava cumprida, pois percebi que o ambiente pol�tico estava se alterando profundamente. H� muitos sinais negativos, uma mudan�a na agenda pol�tica. Se o que estava sendo reconstru�do com muito zelo e t�cnica estava adentrando em um campo de interroga��es, minha perman�ncia na empresa, com projetos e ideais bem diferentes, poderia colocar em risco todo o sistema de integridade da Petrobras. Se meu sentimento era no sentido de que estavam abaladas as premissas fundamentais de independ�ncia e autonomia da empresa, cheguei � conclus�o de que meu ciclo havia chegado ao seu final.

Mas de onde v�m os riscos? O sr. pode detalhar?

Governan�a tem a ver a observ�ncia de padr�es e procedimentos pr�vios para que as melhores decis�es t�cnicas sejam tomadas. Isso � vital para qualquer sistema de integridade efetivo, principalmente, em se tratando de uma empresa estatal, que deve ficar imune a interfer�ncias pol�ticas. A Petrobras possui a��es em bolsas de valores no Brasil e no exterior e seu comando m�ximo deve estar nas m�os da assembleia geral que representa os acionistas. Se � uma sociedade an�nima de capital aberto controlada pelo Estado, o principal elemento de um sistema de integridade, o tone at the top (o tom vem do topo), sempre estar� associado � vontade pol�tica.

A Petrobras programou concluir neste ano a venda de oito refinarias. Que alerta o sr. faz sobre esse grande plano de desinvestimentos?

Sou absoluto defensor da teoria do Estado m�nimo. O Brasil, segundo o ranking da OCDE (Organiza��o para a Coopera��o e Desenvolvimento Econ�mico), � um dos pa�ses com maior n�mero de estatais do mundo: 418 no total. EUA tem 16. Reino Unido tem 16, Jap�o tem oito estatais e a Su��a s� quatro. Aqui, a Uni�o tem o controle direto de 46 estatais e conforme dados do Minist�rio da Economia 19 dessas 46 estatais operam sucessivamente no vermelho. Imagina esse dinheiro sendo aplicado na sa�de, na educa��o... As empresas estatais, se n�o forem bem geridas e n�o tiverem uma governan�a consistente, podem funcionar como cabide de emprego para pol�ticos, para apadrinhados e para atender a interesses partid�rios e pessoais. Hoje o sistema de governan�a da Petrobras � s�lido o suficiente para ficar imune a esse tipo de inger�ncia pol�tica.

Mas � poss�vel haver retrocesso daqui para frente...

Os profissionais de carreira da Petrobras est�o muito bem preparados e capacitados para enfrentar os enormes desafios que ter�o pela frente, principalmente na defesa do sistema de integridade que foi implementado. No plano pessoal, meu desejo agora � iniciar uma nova etapa na minha carreira profissional. A integridade hoje � um ativo, um diferencial competitivo e gera valor para qualquer neg�cio! Como eu acredito na preven��o, e n�o na repress�o, como modelo eficaz de enfrentamento � corrup��o, penso em atuar como consultor estrat�gico, auxiliando as empresas a construir modelos efetivos de integridade, os quais devem funcionar em sintonia com os neg�cios.

H� resist�ncias nas empresas?

Antigamente uma empresa quebrava por falta de gest�o operacional, outras por falta de gest�o financeira, hoje o maior risco de default � a falta de boa gest�o da integridade, a aus�ncia de uma cultura corporativa �tica. E o problema central n�o reside no fato de uma empresa ter pecado e ter se desviado do caminho correto em algum momento. O diferencial � exatamente a postura que deve ser adotada diante do erro. Sobre essas quest�es que pretendo trabalhar agora: no tratamento dos erros corporativos do passado e na constru��o de sistemas preventivos e efetivos para o futuro.

Qual o saldo da Lava Jato para a Petrobras, uma opera��o que levou para a cadeia ex-diretores da estatal?

Quando eu cheguei na Petrobras em 2019 nenhuma das pessoas envolvidas com os crimes estava mais na empresa. J� haviam sido demitidos ou eles pr�prios haviam pedido desligamento. A Lava Jato, inegavelmente, contribuiu para que a gente pudesse evoluir e se restabelecer como uma companhia forte, saud�vel, com controles internos eficientes e com bons padr�es de governan�a e conformidade. V�rias outras empresas brasileiras seguiram esse mesmo caminho. Muita gente diz que as empresas tiveram dificuldades financeiras em raz�o da Lava Jato, mas eu n�o concordo com essa afirma��o. As empresas tiveram dificuldades financeiras porque optaram pelo caminho da ilicitude, da pr�tica de crimes. A Petrobras ultrapassou esse momento e hoje � uma outra empresa, virando completamente a p�gina da Lava Jato.

H� setores do Minist�rio P�blico e do Judici�rio que apontam um esvaziamento ou mesmo um fim da Lava Jato como um processo orquestrado, envolvendo v�rios atores, nesses �ltimos meses. Qual a sua opini�o, isso de fato est� ocorrendo?

Quando o trabalho de enfrentamento � corrup��o � s�rio, comprometido e eficaz, existem tr�s maneiras de se estancar a atua��o dos agentes p�blicos que est�o na linha de frente: por viol�ncia e amea�a, pelo oferecimento de vantagens il�citas, ou pelo fogo amigo e desqualifica��o pessoal. As duas primeiras vias geram um risco alto e s�o pouco inteligentes. � por essa raz�o que est� em curso um flagrante processo de desmoraliza��o daqueles que arriscaram suas vidas em nome do interesse p�blico, e o objetivo � fazer parecer que tudo aquilo que foi noticiado, que todas as confiss�es realizadas, que todos os valores apreendidos ou devolvidos s�o fruto de mera fic��o. Trabalhei na Petrobras e pude presenciar com meus pr�prios olhos os estragos causados pela corrup��o, os quais, a duras penas, est�o sendo reparados. N�o podemos admitir retrocessos.

Mas a Lava Jato tamb�m recebe cr�ticas contundentes. A mais comum � que a opera��o caminhou por uma linha de ilegalidade...

Sinceramente me impressiona todo esse movimento em torno de supostas conversas que foram hackeadas, as quais configuram provas absolutamente il�citas e s�o produto de um crime do qual os seus autores est�o presos. Estamos falando de supostos di�logos vinculados a uma fonte que nem sequer pode ser periciada e que, por isso, jamais poder�o ser comprovados. Ainda assim as supostas conversas t�m circulado normalmente como se fossem verdadeiras e t�m sido, inclusive, utilizadas em algumas decis�es do Poder Judici�rio. Usar o produto de um crime como fonte de informa��o �, para mim, algo muito mais execr�vel que o pr�prio conte�do dos di�logos, ainda que fossem eles verdadeiros. Integridade n�o se confunde com perfei��o e, numa opera��o dessa magnitude, certamente falhas devem ter ocorrido, o que � mais do que natural. Se houve algum excesso, ele deve ser coibido pela via disciplinar, mas sempre usando provas l�citas e de acordo com as regras do estado democr�tico de direito. Entre acertos e erros, o saldo � largamente positivo.

As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.


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